São profissionais, mães, donas de casa, filhas, irmãs, amigas, confidentes... No que toca às compras, a última palavra também é delas. Talvez por isso se tenha vindo a assistir, nas últimas décadas, a uma avalanche de novos produtos e serviços exclusivamente dedicados ao sexo feminino. Puro marketing ou sucesso de vendas garantido? Não o podemos afirmar com certeza! Mas numa coisa todos parecem concordar.

Hoje, as mulheres são as reais decisoras de consumo dentro da estrutura familiar. Segundo o estudo norte-americano "2011 Social Shopping Study", elaborado pela Performics, as mulheres controlavam, no início da década, cerca de 80% dos gastos da família. Nos dias que correm, quase 10 anos depois, o panorama mantém-se. Em várias áreas, foram muitas as mudanças mas, no essencial, muita coisa permanece igual.

"Em janeiro [de 2012] houve um debate organizado pela Câmara de Comércio Americana em Portugal e pela European Professional Women's Network que reuniu gestores de diversas marcas e que afirmava, de facto, esse número [80%], como sendo a percentagem das decisões de consumo tomadas por mulheres", disse então à Saber Viver Isabel Romão, diretora da licenciatura em Ciências do Consumo do IPAM.

O que é que as mulheres afinal querem?
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A docente do Instituto Português de Administração de Marketing explicou, nessa altura, que quando as mulheres vivem em famílias nucleares tradicionais [pai, mãe e filhos a viverem na mesma habitação] tendem a ter a última palavra em tudo, porque são elas que estabelecem as prioridades. Susana Albuquerque, especialista em educação financeira e gestão financeira pessoal e autora do livro "Independência financeira para nulheres", publicado pela editora Estrela Polar, considera que estes dados vão ao encontro do que outros estudos internacionais.

Muitas investigações que afirmam que, apesar de já não ser tão evidente o tipo de produtos que fica na mira dos homens e/ou das mulheres, continuam a existir distinções, ainda que não se possa dizer que sejam substanciais. Ainda há uns anos, elas compravam, mais vezes, coisas de valor mais baixo e os homens ficavam responsáveis pela compra de produtos de valor mais elevado. Hoje, a realidade é outra.

"As diferenças têm vindo a esbater-se. Mesmo na área do automóvel, tradicionalmente masculina, sente-se uma crescente influência das mulheres na decisão de compra. Na escolha da habitação, regra geral, a escolha é partilhada, mas já para o recheio da casa, na maioria das vezes, a decisão é da responsabilidade delas", comenta a secretária-geral da Associação de Instituições de Crédito Especializado (ASFAC).

As grandes viragens no consumo deram-se com o movimento feminista e com a progressiva autonomia económica das mulheres. "Podemos destacar dois outros movimentos sociais que o alteraram profundamente. O movimento ecologista, com a sua noção de consumo sustentável e diminuição de desperdícios e a crise económica, que provocou a segunda diminuição nas quantidades", refere Isabel Romão.

Onde as mulheres mais gastam o dinheiro

O consumo tornou-se mais racional, utilitário, equilibrado e valorizado. E o que é que as mulheres querem? Isabel Romão não tem dúvidas. É tempo! "Estou a falar de homens e mulheres de classe média, uma vez que o mundo laboral exige cada vez mais horas de trabalho e ter tempo para o lazer tornou-se um luxo", sublinha. A docente explica que quer a globalização quer a sociedade de consumo geraram mudança.

Levaram mulheres e homens a investir em tecnologia, sobretudo em telemóveis e computadores, mas também em cultura, em viagens e em lazer. "As novas tendências no consumo dito supérfluo são a aposta em tecnologia e comunicação mas, mesmo no de primeira necessidade há tendências. A mais falada recentemente tem sido a compra de bens alimentares de marca de distribuição em vez das tradicionais", conta.

Hoje, muitas mulheres procuram compensar a falta de tempo com momentos de qualidade. Investem em roupa, massagens, cremes, ginásios, acessórios, tecnologia ou viagens. "Num contexto em que o poder de compra no feminino aumentou, as mulheres estão mais vaidosas e consumistas, mas também mais informadas e participativas", disse à Saber Viver a empreendedora Margarida Calado.

A sua presença nas redes sociais é cada vez mais ativa e destaca-se aqui o fenómeno das bloggers, das instagrammers e das influenciadoras, onde mulheres anónimas se tornaram líderes de opinião, influenciando e envolvendo no processo muitas outras. "Mais do que nunca, participam na decisão de compra do carro, da mobília de casa, do telemóvel, do frigorífico ou do sofá", sublinha a especialista.

"Têm uma palavra a dizer sobre o melhor banco, os melhores serviços financeiros ou a seguradora que lhes oferece melhores condições", acrescenta Margarida Calado. E estão a ter impacto na forma como as empresas concebem, posicionam, divulgam e vendem os seus produtos. E não se ficam por aí... As mulheres estão cada vez mais a mostrar o que valem no mundo dos negócios e os resultados estão aí à vista!

Mulheres no topo

Em 2018, na União Europeia, só 17% dos cargos executivos eram ocupados por mulheres. Numa década, não se pode dizer que a subida tenha sido grande. De acordo com o estudo "European PWN Boardwomen Monitor 2010", as mulheres ocupavam, no fim da década de 2000, perto de 12% dos cargos de topo das 300 maiores empresas da Europa. Em Portugal, em 2017, a percentagem rondava, ainda assim, os 36%.

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"Trata-se de uma taxa de crescimento de 21% relativamente aos quatro anos anteriores, o que revela, efetivamente, uma tendência positiva no que respeita à evolução da liderança empresarial feminina", comentou, em 2012, Francisco Balsemão, gestor, filho de Francisco Pinto Balsemão, na condição de presidente da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE). Na altura, Portugal era o último país do ranking no que toca ao número de mulheres na gestão e (ainda) não havia mulheres a desempenharem o papel de diretoras-executivas nas empresas portuguesas do Euronext.

Apesar de o número de mulheres com papéis de liderança estar a aumentar, o número de empreendedores do sexo masculino equivale a cerca do dobro do das mulheres empreendedores. "Enquanto 61,3% dos homens adultos consideram possuir as competências necessárias para criar um negócio, apenas 43,1% da população adulta feminina considera possui-las", acrescentou, na altura, Francisco Balsemão.

"Não podemos esquecer que a integração da mulher no meio empresarial, em particular, e no mercado de trabalho, em geral, envolve algumas especificidades", referiu ainda. Os estereótipos associados às funções de liderança e o equilíbrio entre a vida profissional e a esfera pessoal, social e familiar constituem ainda obstáculos à afirmação das mulheres no mundo dos negócios, como alertou Francisco Balsemão.

O caminho que tem vindo a ser percorrido

O Parlamento Europeu tem vindo a alertar para a desigualdade de oportunidades de carreira e a criar planos para a igualdade entre homens e mulheres. "Contudo, a introdução de planos de igualdade de género no seio das empresas, apesar de essencial, não é suficiente. Caberá às empreendedoras operar a sua própria afirmação profissional e, nesse campo, as portuguesas estão no bom caminho", diz.

"A aposta na qualificação é, sem dúvida, uma estratégia de sucesso na atual economia do conhecimento", acrescenta. Muitas dessas empreendedoras desenvolveram, nos últimos anos, conceitos só para elas. A criação de produtos e serviços exclusivos para mulheres está a crescer e há muito que deixou o território tipicamente feminino. Hoje, é fácil encontrar conceitos direcionados apenas para o universo feminino.

Texto: Ana Pimentel e Luis Batista Gonçalves (edição digital)