
O assunto é levantado na primeira consulta de obstetrícia pós-parto. Entre fraldas, noites mal dormidas e leite, a escolha do anticoncepcional ideal parece só mais um item da interminável lista de tarefas. Mas há uma pergunta que quase nunca se faz: será que a contracepção hormonal, iniciada tão cedo, pode mexer com a nossa cabeça? A verdade? Não sabemos. Ainda não sabemos.
A pílula (ou o anel ou o implante) não são “gatilhos universais” de depressão pós-parto – isso é certo. A questão que se impõe é se quando somamos estrogénios e progestagénios sintéticos ao cocktail de alterações hormonais gigantes no pós-parto isto pode fazer diferença. Começam a surgir algumas evidências de que os contraceptivos hormonais após o parto podem aumentar o risco de depressão pós-parto. E aqui, sim, já temos algumas pistas.
O risco é maior quando são iniciados muito cedo, quando incluem estrogénios ou em mulheres com um humor particularmente sensível às oscilações hormonais – mulheres que já tiveram depressão pós-parto, que sofrem de flutuações de humor maiores que o normal durante o ciclo menstrual ou que já experimentaram sintomas depressivos após tomarem anticoncepcionais hormonais. Mas esta a decisão não nos deve tirar o sono – para já pelo menos.
A depressão pós-parto é comum. Numa sala de espera do centro de saúde ou do serviço de obstetrícia, 1 a 2 em cada 10 mulheres grávidas vão ter depressão pós-parto. O risco é enorme e temos de estar alerta para isso.
A diferença de risco trazida pela pílula é pequena - menos de 2 em cada 1000 mulheres. A nossa preocupação? Quando olhamos para um grupo grande isto passa a ser estatisticamente significativo.
É aqui que está o ponto: na hora de medicar, mais do que seguir o protocolo, olhar para quem está à nossa frente é o mais importante. Qual é a história desta mulher?
Um artigo da médica Maria Moreno, psiquiatra na Cognilab e na Fisiogaspar.
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