Muitos casais portugueses debatem-se com problemas de fertilidade mas, por desconhecimento, receio ou constrangimentos económicos, apenas uma minoria opta por procurar apoio especializado. Em entrevista à Prevenir, Cândido Tomás, professor e diretor clínico Ava Clinic, comenta o panorama nacional, explica o que tem vindo a mudar em termos de tratamentos de procriação medicamente assistida e indica o tipo de alimentação que pode melhorar a fertilidade de homens e mulheres.

O que tem vindo a mudar em termos de tratamentos de procriação medicamente assistida nos últimos anos? Quais são as principais novidades?

É interessante fazer essa pergunta, uma vez que este ano [2015] celebramos 15 anos de atividade da AVA Clinic em Lisboa e isso leva-nos sempre a este tipo de reflexão. Eu penso que é essencial realçar a lei que regula os tratamentos de fertilidade. É bastante atual e moderna, apesar de ainda não permitir o tratamento de fertilidade a mulheres solteiras ou lésbicas, nem o uso das barrigas de aluguer, por exemplo.

O nível de regulamentação nesta área permite que os casais possam ter confiança e segurança nos tratamentos efetuados em Portugal e não há necessidade de os efetuar em clinicas estrangeiras, pois os resultados são idênticos aos obtidos nas clinicas portuguesas. Por outro lado, a existência da Associação Portuguesa de Fertilidade é um fator social importantíssimo para alertar para os problemas da infertilidade, das políticas e dos seus vários componentes de apoio e dinamização.

Mas, fundamentalmente, os tratamentos têm cada vez mais sucesso e com menores riscos, devido a tratamentos mais individualizados e com medicamentos e protocolos mais seguros. No laboratório de fertilidade, são melhores os meios de cultura e a identificação de embriões com maior viabilidade, o que permite transferir no máximo dois embriões e evitar as gravidezes múltiplas de risco.

Como vê, é o trabalho em equipa de vários grupos profissionais associados a um maior conhecimento e participação dos casais que já levou na nossa clinica, como noutras, ao nascimento de centenas de crianças saudáveis. Daí o nosso slogan «15 anos – Mil sorrisos», celebrando os sorrisos das crianças, dos seus pais e dos profissionais que se orgulham de participar num trabalho tão gratificante.

Resumindo, temos hoje tratamentos mais individualizado e simples, melhores meios de cultura e melhor reconhecimento da qualidade dos embriões pela cultura prolongada ou por equipamentos de time-lapse. Conseguimos desenvolver melhor o trabalho em equipa e temos melhores conhecimentos do publico sobre a importância de iniciar os tratamentos o mais precocemente possível.

Em termos de investigação, qual seria a maior descoberta ou revolução a este nível que os cientistas poderiam anunciar?

Muito recentemente foi anunciado por um grupo francês o fabrico artificial de espermatozoides, mas isso não foi ainda comprovado cientificamente. Isso seria uma descoberta importante. Também será um grande avanço se conseguirmos preservar ovócitos de boa qualidade para um futuro uso na vida da mulher, evitando a degradação da qualidade e quantidade de ovócitos que acontece com o aumento da idade.

Se se conseguisse identificar ainda melhor quais os embriões que têm maior possibilidade de sucesso, poder-se-iam evitar muitos tratamentos inúteis para os casais. Outra área de grande investigação é o melhor conhecimento dos fatores que ajudam à implantação dos embriões.

Veja na página seguinte: O perfil de quem procura tratamentos de procriação medicamente assistida

Em Portugal, quem mais procura tratamentos de procriação medicamente assistida? Existe um perfil?

Não existe um perfil único. A infertilidade acontece em cerca de 10 a 15% da população e torna-se mais evidente com a idade da mulher. Daí que, nas clinicas certificadas, como a AVA Clinic, a média de idades é acima dos 36 anos, sendo que um terço das mulheres têm mais de 40 anos. Mesmo assim, conseguimos uma taxa de sucesso nesses casos na ordem dos 20%. No entanto, muitas mulheres têm nesta fase da vida de optar pela doação de ovócitos, com uma taxa de sucesso cumulativa acima dos 80%, tratamentos em que a AVA Clinic foi pioneira desde 2000.

Já nos hospitais públicos a média etária é mais baixa até porque se limita o acesso casais com mais idade. São, no entanto, casais saudáveis e que muitos deles se surpreendem pela dificuldade em engravidar, pois a infertilidade muitas vezes não é acompanhada de nenhuns sintomas, pelo que os exames são essenciais para identificar e resolver alguns problemas.

Os homens e as mulheres portuguesas estão menos férteis?

Tal como nos outros países ocidentais, há uma tendência para os casais tentarem ter o seu primeiro filho cada vez mais tarde. Só isso leva que a taxa de fertilidade numa mulher acima dos 36 e 37 anos seja muito inferior à das mulheres que tentam aos 25 a 30 anos. A infertilidade distribui-se quer pelo homem quer pela mulher e muitos fatores como o tabaco, álcool, stresse, obesidade e défices alimentares podem ser fatores adjuvantes que retardam o início da gravidez.

É muito importante que um casal que esteja a tentar engravidar há mais de um ano, faça uma consulta com um especialista de medicina da reprodução, quer seja numa clinica certificada quer seja num hospital público. O sucesso dos tratamentos no entanto tem ajudado a que as taxas de natalidade sejam mais equilibradas e em alguns países como os escandinavos, as crianças nascidas por estas técnicas já representam 4% da totalidade das crianças nascidas.

Por isso, são tão importantes as campanhas de divulgação e informação para a população, como os Encontros da AVA, uma iniciativa que desenvolvemos regularmente que consiste em sessões gratuitas de esclarecimento, nas quais os fatores físicos e psicológicos são discutidos e esclarecidos por profissionais.

Existem alimentos e terapias alternativas que potenciem a fertilização masculina e feminina?

O melhor é ter uma alimentação saudável e uma vida regrada e com atividade física regrada. Alguns suplementos alimentares podem ser tomados para substituir algumas carências. Contudo, não existem alimentos ou vitaminas que só por si restaurem a fertilidade. Apesar de alguma publicidade a alguns produtos, é necessário muito cuidado com certos produtos que não estão cientificamente comprovados, pois muitas vezes o que fazem é atrasar o início de tratamentos eficazes.

O que produz a infertilidade é, geralmente, a ausência de espermatozoides ou a sua fraca qualidade, as deficiências hormonais na mulher, algumas doenças como a endometriose ou alterações genéticas, embora existam outros fatores desconhecidos. Os hábitos de vida são depois causas adjuvantes que podem melhorar ou piorar ligeiramente a capacidade fértil do casal.

O tabaco, bebidas alcoólicas em excesso, o consumo de drogas ou de hormonas anabolizantes nos homens e a obesidade são claramente alguns fatores que influenciam a fertilidade. Não há suplementos alimentares que se sobreponham às boas de uma vida regrada e saudável.

Texto: Luis Batista Gonçalves