Sete da manhã. O despertador toca e um novo dia começa cheio de genica.

Inicia-se a cronometragem. O banho, a roupa vestida, os sapatos enlaçados.

Fecha a mochila (depois de verificar se não falta nada) e corre para a mesa onde o pequeno-almoço a espera. Duas ou três reclamações do pai ou da mãe de que já estão atrasados e toca a correr escada abaixo até ao carro, que segue o caminho frenético para a escola. É lá que tudo acontece. Os amigos e as brincadeiras. As disciplinas e os professores simpáticos. Os livros, as canetas de várias cores. Os exercícios no quadro.

E os sermões porque não se sabe a matéria, aquele menino que anda a pregar partidas e os dias de chuva que não deixam fazer as corridas no jardim. A meio da tarde, o cansaço chega quase sempre ou... quase nunca. Depois de tanta correria, será aconselhável ocupar os tempos livres das crianças com atividades extracurriculares? Alexandra Pinto, psicóloga infantil, ajudou-nos a esclarecer a questão.

Extra-escola

Após a saída das aulas há, muitas vezes, tempos mortos que é preciso ocupar até que o dia termine. A vida agitada dos pais nem sempre permite que os horários sejam compatíveis e das duas uma, ou há a possibilidade de um adulto fazer o percurso da escola para casa, acompanhando a criança até que os progenitores regressem ou resta a hipótese de preencher essas horas com atividades que lhe deem prazer, sem esquecer a utilidade, a nível emocional e intelectual, que estas possam ter no futuro.

Falamos das aulas de ballet (a predileção das meninas), de uns dias dedicados à aprendizagem de uma nova língua, da descoberta da vocação para tocar piano ou outro instrumento... Considerando a carga horária escolar, atualmente tão «pesada», e o cansaço associado, serão estas atividades efetivamente benéficas? Será uma ocupação útil para os mais novos ou não passa de uma forma inconsciente dos pais (pouco disponíveis) sentirem menos culpas no cartório?

«As atividades extracurriculares são importantes para o desenvolvimento da criança. Permite-lhe ter acesso a determinado tipo de experiências que, de outra forma, não teria. Tocar piano, por exemplo, pode ser um talento intrínseco, que muitas vezes é levado a sério, transformando-se, na idade adulta, em profissão», explica Alexandra Pinto, psicóloga infantil.

Preencher o tempo livre é também uma forma de afastar a criança da televisão, jogos de computador ou outros hábitos que em nada promovem o seu crescimento social e intelectual.

«As atividades lúdicas, feitas ao ar livre, estão praticamente extintas. As brincadeiras de rua, que ajudavam a um crescimento conjunto, já não existem e os jogos sofisticados de computador tornaram-se na principal atração», alerta, também, Alexandra Pinto.

Assim, um plano de ação pode ajudar a adquirir o gosto por novas áreas do conhecimento e até mesmo revelar talentos escondidos. Um número crescente de pais compreende que a educação dos filhos é um processo contínuo que não deve ser deixado ao acaso. Vivemos numa sociedade cada vez mais competitiva e exigente, daí a importância do acesso dos mais novos a uma formação completa em todos os campos.

É útil a fluência em várias línguas, o domínio na utilização do computador, a prática de desporto e consequente estímulo para que adotem um estilo de vida saudável. Mas, infelizmente, «nem todas as escolas têm espaços físicos com capacidade de proporcionar à criança condições para que possam praticar exercício físico ou ateliês», comenta a psicóloga infantil.

Limitar é preciso

«Não há dúvida de que as crianças atuais estão sujeitas a um alto grau de stress, estados de depressão e hiperatividade. E a falta de tempo livre para elas próprias é uma das razões», afirma Alexandra Pinto. As atividades extracurriculares devem fazer parte da vida dos mais novos sim, mas com conta, peso e medida.

Mesmo que estejam motivados e peçam para frequentar várias, é necessária a sensibilização por parte dos pais para que tenham apenas uma ou duas (por eles escolhidas), de modo a que não fiquem sobrecarregados. Dispor de algum tempo livre para ser ocupado das formas mais simples e variadas como conversar com amigos, ouvir música ou brincar é igualmente importante.

Se por um lado estas atividades são um complemento a considerar para um crescimento mais rico, por outro, é preciso saber limitá-las para que, ao fim de um dia, as crianças não sintam excesso de cansaço físico e psicológico. Aliás, algumas destas ocupações devem exatamente servir para descomprimir. Dança e desportos como ténis, andebol e natação são alguns dos exemplos.

«É também importante referir que as atividades frequentadas fora do horário escolar, dependendo da forma como são ensinadas, podem contribuir para o aumento da criatividade e imaginação», salienta Alexandra Pinto.

Etapa a etapa

Acima de tudo há que pensar com moderação nas atividades que pode e deve proporcionar ao seu filho, tendo em conta a idade deste. Antes dos cinco anos estão recomendados exercícios que favoreçam a coordenação motora, proporcionada através da ginástica em geral.

A natação, que normalmente é apreciada devido ao contacto com a água, ajuda a controlar a respiração, trazendo ainda outros benefícios à saúde.

Só depois dos cinco anos é que a criança deve ser inscrita em atividades que exigem uma formação específica como o ballet, artes marciais ou ginástica desportiva. O ténis deve iniciar-se nunca antes dos seis/sete anos e a prática de equitação é apenas aconselhável cerca dos oito, para evitar possíveis problemas de coluna.

Como nem só de desporto vivem os mais novos, opte por atividades igualmente cativantes. Aos cinco anos, aprendizagens ligadas à música, já são permitidas. Dê-lhe a liberdade de escolher o instrumento que mais o fascina. No entanto, e caso este não tenha ouvido para a música, coloque de lado a hipótese de fazer dele um verdadeiro artista.

Nem todas as crianças têm talento para as mesmas áreas. «Entre os três e cinco anos, não são precoces as atividades ligadas à pintura e às línguas estrangeiras. Nesta fase, as crianças estão recetivas a aprender novas formas de linguagem», diz a psicóloga infantil.

Sobre dotes

E, se aos poucos, pais, amigos e familiares percebem que a criança possui uma inteligência e aprendizagem invulgar para a idade? A descoberta permitirá encaminhar a criança no sentido de ser enquadrada no nível de aprendizagem certo para que se sinta motivada e consiga aplicar a criatividade e imaginação de que dispõe.

Existem vários grupos distintos de crianças sobredotadas. Aquelas com inteligência linguística, que revelam grande facilidade desde cedo com a palavra, tanto oral como escrita. A inteligência lógico-matemática, onde os números e todos os campos relacionados são tarefa fácil desde tenra idade.

Há ainda a inteligência musical, existente na maioria dos músicos e compositores, reveladora de uma sensibilidade fora do normal neste campo. E a inteligência corporal, cuja capacidade de expressar atitudes através do corpo é extraordinária. Se o seu filho revela alguma destas aptidões, deve procurar atividades extracurriculares adequadas à sua idade e inteligência para que possa tirar o máximo partido do seu intelecto.

Na escolha correta, procure o apoio de quem sabe. Fale com o pediatra do seu filho e um psicólogo infantil. Estes dois especialistas estão habilitados a orientá-lo na escolha das atividades mais indicadas.

Texto: Filomena Nascimento