Hélder Simões: um saco mais leve do que parece
créditos: Pedro Loureiro

Foi o medo que fez Hélder Simões, então com 71 anos, evitar ir ao médico. «Eu sabia que algo não estava bem. Tinha sintomas estranhos, como diarreia, mal-estar e muita vontade de urinar», conta. Mas, só após um ano ganhou coragem para ir ao hospital. «Primeiro, pensei que era um problema na próstata. Essa foi a minha primeira consulta. Mas, alguns exames depois, foi-me dado outro diagnóstico: tinha um tumor de 10 centímetros no intestino». A operação teve caráter de urgência.

Estávamos a 14 de julho de 2014 e, dias antes, o bancário reformado, tinha-se casado pela terceira vez. «Foi uma grande lua-de-mel», ironiza Lurdes, a esposa que passou as noites que se seguiram no Hospital do SAMS, em Lisboa, e que, ao terceiro dia, descobriu o pior. «Ela levantou-me a camisola e viu a minha barriga cheia de sangue. Chamaram o médico de imediato e fui novamente operado», lembra Hélder, acrescentando: «Ouvi o médico dizer para a equipa que me operou “Se for preciso, tira-se as tripas ao homem”». Quando acordou, estava ostomizado.

O saco preso ao corpo foi algo «difícil de aceitar ao início», admite, mas agora, três anos volvidos, confessa que está acostumado. «O corpo humano tem uma excelente capacidade de adaptação».

A vida viria a trazer-lhe mais uns quantos dissabores. Poucos meses depois e após os tratamentos em simultâneo de quimioterapia e radioterapia, uma nova operação, desta feita a uma hérnia.

Já este ano, novo sinal de alerta: sangue na urina. Mais exames e a confirmação do pior: o fígado estava invadido com metástases do primeiro tumor. A 24 de fevereiro, foi operado no Hospital Curry Cabral. «A cirurgia durou exatamente quatro horas e 32 minutos. Pelo menos, é o que diz nos papéis que tenho aqui. Tudo correu bem, a equipa do hospital era fantástica e, cerca de uma semana depois, já estava em casa», lembra.

«Voltei a 17 de março para a primeira consulta após a operação, já com a ressonância magnética feita, e estava tudo bem», garante Hélder que aos 75 anos, repete, estoicamente, os tratamentos de quimioterapia. Carrega uma bolsa à cintura ligada a um cateter no peito. O processo demora 48 horas e, mais tarde, é repetido.

«Serão três meses assim e, depois, veremos se será necessário fazer radioterapia também».

 Dias mais felizes

Voltas e contravoltas que não lhe tiram o sorriso, nem a boa-disposição. Recebe-nos na sua casa com um abraço e despede-se com um olhar emocionado para celebrar o aniversário da sua «menina» mais velha, que cumpria 50 anos. Outra filha, na casa dos trintas, e três netos «todos rapazes», acrescenta com orgulho, fazem os dias de Hélder mais felizes.

«Aos 38 anos fiquei viúvo, a minha mulher faleceu com um tumor. Mais tarde, voltei a casar e a ficar novamente viúvo, por causa de um cancro da mama. Agora casei novamente. E, o curioso, é que todos nos conhecíamos da escola!», e abre muito os olhos, em sinal de admiração e estranheza pelos caminhos que a vida às vezes desenha.

Também a mãe de Hélder lutou contra um tumor no intestino que metastizou, mais tarde, no pulmão. Mas os tempos eram outros e não fez nem radioterapia nem quimioterapia. «Mesmo assim, viveu mais cinco anos. Estou convencido de que, se fosse hoje, a minha mãe teria sobrevivido».

A rotina habitual pouco mudou. Continua a levantar-se bem cedo para cuidar de si, como se de um ritual se tratasse, ou não fosse esse o seu «defeito»: «Sempre fui muito vaidoso», pausa «e namoradeiro!». E solta uma gargalhada.

Gosta de passar temporadas na casa de Fonte da Telha, onde tem uma horta e animais. Às vezes, vai à pesca. Só a caça ficou para trás. «Mas ainda tenho as armas. Estou a guardá-las para, um dia, dar ao meu neto», confessa, com um brilho orgulhoso no olhar, enevoado apenas quando nos fala da exceção à regra: «A vida íntima é que ficou muito afetada. E contra isso não há volta a dar».

A visita à farmácia

Da sua rotina faz parte, também, a visita regular à farmácia, situada a «cerca de 100 metros de casa», para comprar os produtos de que necessita. «Normalmente, compro quatro embalagens. Cada uma tem 30 sacos. É um processo simples e rápido», garante.

Desde 1 de abril, as farmácias passaram a disponibilizar produtos de ostomia, o que facilita muito a vida aos doentes. «Há uns tempos, estive meses sem conseguir comprar sacos. Foi muito complicado! Claro que tenho sempre uns quantos de reserva em casa, mas vi-me aflito». Uma situação que agora não se repete. «Geralmente, avio a receita médica na farmácia e no próprio dia tenho o que preciso», garante Hélder.

Os produtos de ostomia passaram este ano a ser comparticipados a 100%. «É uma grande ajuda. Quatro embalagens de sacos chegam a custar 250 euros».

Hélder Simões obtém as receitas médicas no Centro de Saúde dos Olivais, onde já é conhecido. «Toda a gente me cumprimenta, pergunta se estou melhor e já tenho bons amigos lá».

Aliás, «como esta é uma doença prolongada, já criei amizades com médicos, enfermeiros, técnicos e farmacêuticos. Todos são muito boas pessoas!», remata, emocionado.​

Texto de Rita Leça

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