É seguramente a cozinheira mais famosa de Portugal e, em breve, vamos vê-la na televisão no júri do novo reality show da RTP, Master Chef.

O Nobre da Ajuda era frequentado por Mário Soares quando era presidente da Republica, e o Nobre da EXPO pelos mais famosos jogadores de futebol. Agora está no Campo Pequeno, no Spazio Buondi a fazer o que mais gosta: a surpreender os clientes com a sua cozinha de autor. Justa Nobre nasceu cozinheira.

Vai fazer parte do júri do Master Chef?

É verdade. É o formato australiano, mais calminho que o americano, e só para gente anónima. Vai começar a ser exibido na RTP a partir do dia 2 de Julho. Já fizemos a seleção dos 100 concorrentes e agora vamos começar a gravar com os 14 finalistas. A partir de agora, começa a sair um por semana.

Sente-se confortável na televisão?

Sinto, porque estou consciente daquilo que estou a fazer. Embora custe um bocado avaliar os outros, porque aquelas pessoas estão ali a dar o litro.

Gosta de novos desafios?

Adoro. Ainda recentemente participei no Pro-Portugal, dedicado a Trás-os-Montes, também para a RTP, que será emitido dia 16 de Julho, e mostra o que cada região tem para oferecer.

É uma estudiosa da cozinha portuguesa ou é mais intuição?

É muita intuição mas também leio coisas de gastronomia. Costumo dizer que nasci cozinheira, porque há coisas que nos saem da alma.

Não se imagina a fazer outra coisa na vida?

Quando eu era miúda queria ser enfermeira. Sempre fui uma pessoa muito dedicada aos outros. Normalmente são os outros, principalmente a família, e depois é que sou eu.

É transmontana. Conheceu o seu marido, que é de Abrantes, cá ou lá?

Conhecemo-nos em Lisboa. Vim para Lisboa com 15 anos com uma irmã e quando tinha 18 conheci o meu marido, e aos 19 casei-me. Ele era empregado de escritório e o chefe a seguir ao 25 de Abril resolveu abrir o restaurante 33 na Av. Alexandre Herculano, e convidou-me para ir chefiar o restaurante.

Tinha alguma experiência?

Nenhuma, nessa altura trabalhava numa tipografia. Ele convidou-me porque sabia que eu cozinhava bem. E fiquei lá oito anos: o meu marido a chefiar a sala e eu a chefiar a cozinha. Depois abri o Iate Ben, em Carcavelos, de onde saímos um ano depois para abrir o nosso restaurante, o Constituinte, na Rua de São Bento, em 1988.

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Quanto começa a ficar pequeno para a vossa clientela é que decidem abrir na Ajuda?

Já com a nossa marca. Em 1990, abrimos o primeiro restaurante Nobre. Ia lá toda a classe política a começar por Mário Soares então Presidente da República. Era talvez dos restaurantes em Lisboa mais frequentado pela classe política e empresarial. Como tínhamos salas privadas, era o espaço ideal para tratarem de negócios.

Sempre respeitaram a privacidade dos vossos clientes?

Fizemos sempre muita questão de tratar os nossos clientes com a maior discrição possível. Éramos cegos, surdos e mudos a tudo o que ali se passava, fosse a namorar ou a tratar de negócios, e sempre nos demos bem com isso.

Em 1998, com a abertura do Nobre na EXPO, dá-se o grande salto empresarial?

Foi mais uma fase e faz tudo parte da vida. Tivemos o azar de encontrar uns sócios que não prestaram para nada e financeiramente nos deixaram sem nada, mas como dizia o meu pai, gastem-se os anéis mas fiquem os dedos e eu ainda tenho dedos! No fundo só se perderam bens materiais… Claro que também se ganham cabelos brancos, mas tudo isso faz parte da vida.

E diz quem a conhece que é muito teimosa…

Sou pois. E nestas alturas temos é de arregaçar as mangas e ir em frente. Enterrar a cabeça na areia não resolve nada.

Isso é uma visão corajosa e optimista da vida.

Tem de ser. Para mim ontem foi passado, e só temos de estar agora a falar nisso porque estou a dar uma entrevista, porque essas coisas nem as lembro. Judicialmente resolvemos tudo: ganhámos os oito processos!

Foi uma fase dura. Até tiveram de trabalhar num barco do Tejo…

Trabalhámos no Lisboa Vista do Tejo, um barco que faz jantares a bordo, e depois demos o nome a um restaurante no Montijo, mas não deu resultado.

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Depois do Montijo abriram no Campo Pequeno onde ainda estão?

Tomámos conta deste espaço que era de umas pessoas nossas amigas, com as minhas duas irmãs e o meu cunhado.

Ainda está com vontade de crescer ou agora pretende ficar por aqui?

Já não temos idade para isso, já estamos cansados

Tem quantos filhos?

Um filho com 28 anos e três netos lindos, a Mariana vai fazer um ano, o Gabriel vai fazer três, e a Mónica vai fazer seis.

O seu filho não trabalha nesta área?

Por enquanto não, mas a qualquer altura pode vir porque ele até sabe.

O papel de mãe foi o que privilegiou mais na vida?

Sem dúvida. Foi o mais importante.

Vai lançar um livro?

No dia 18 de Julho, aqui no restaurante. É dedicado aos meus clientes e vai chamar-se “Justa Nobre: Paixão pela Cozinha”. Tem 74 receitas com fotografias e revelo pela primeira vez a receita da sopa de santola.

Há três anos que está no Peixe em Lisboa ao lado dos grandes chefs. É um motivo de orgulho?

Gosto muito, e também fiz o Algarve Gourmet em Portimão e Olhão e faço workshops sempre que me pedem.

Gosta mesmo do que faz?

Adoro. Sempre tive muita vontade de aprender e gosto muito de cozinhar. Estou sempre a tentar superar-me.

Gosta mais de cozinhar doces ou salgados?

Salgados.

Ainda gosta de ir à sala cumprimentar os clientes?

Vou sempre.

Quando viaja também gosta de experimentar o que se faz lá fora?

Como estamos tantas horas fechados no restaurante, quando chego a casa não cozinho. Normalmente nos dias de folga vou comer fora com o meu marido, e quando viajo também gosto de experimentar restaurantes diferentes. O meu preferido é o Arzac, em San Sebastian. Tenho prazer em saborear uma boa refeição.

Chegou a conhecer o El Buli, em Barcelona?

O meu marido ainda tentou, mas não conseguimos.

A sopa de santola ainda é o ex-libris da sua ementa?

Ainda é. Há pratos na minha ementa que não consigo mudá-los nunca.

Já está casada há quantos anos?

Vamos fazer 35 anos, e trabalhamos juntos há 34.

Está grata à vida?

Estou. Sou uma pessoa muito agradecida, mesmo quando as coisas não correram bem, estive sempre agradecida à vida porque nem eu nem a minha família tivemos nenhuma doença má, e nunca nos faltou trabalho para governar a nossa vida.

Texto: Palmira Correia