Depois de entrar na vida profissional, sobretudo para as mulheres casadas e com filhos, conseguir fazer novas amizades torna-se um dilema de difícil resolução. Porém, frequentar os grupos e atividades certas poderá ser uma grande ajuda. Aos 35 anos, Erica Lima, designer gráfica e árbitra de andebol, parece ser uma exceção num mundo onde as pessoas se isolam cada vez mais. Não tem qualquer dificuldade em fazer novos amigos.

Onde quer que vá, seja em trabalho seja em lazer, trava sempre novos conhecimentos, estabelece boas relações e faz amizades duradouras. Mas nem sempre foi assim, confessa. «Na infância e adolescência era introvertida, mas, com o tempo, aprendi a relacionar-me mais facilmente com os outros», desabafa. Para quebrar o gelo, inicia a conversa com algumas piadas, criando logo empatia.

Numa das últimas viagens que realizou, durante três semanas na Tailândia, sozinha de mochila às costas, fez dois novos amigos, um escocês e uma singapurense, e, desde então, têm-se mantido em contacto. Solteira, sem filhos e sem prisões para além do trabalho, o entrosamento com novas pessoas parece-lhe facilitado. Érica Lima pode não ser a exceção à regra, mas a verdade é que, na faixa etária dos 30, nem sempre é fácil fazer novas amizades.

O que dificulta a construção de novas relações

São vários os elementos que dificultam o estabelecer de novas relações de afeto. Demasiadas horas passadas no trabalho, família (sobretudo marido e filhos) e falta de tempo para novas atividades de lazer, são os principais entraves. Marla Paul, ex-jornalista e atualmente relações públicas da Northwestern University, nos Estados Unidos da América, escreveu um livro sobre a crise de fazer amigos depois dos 30/35 anos, baseado na sua própria experiência de vida.

Depois de passar cinco anos em Dallas, Marla Paul regressou a Chicago e deparou-se com uma dura realidade. Onde estavam os amigos que deixara e por que era tão difícil fazer novos? Começou a escrever crónicas sobre o tema no jornal Chicago Tribune e apercebeu-se que, tal como ela, outras mulheres se queixavam do mesmo problema, contando as suas próprias histórias.

Foi assim que surgiu o livro «The Friendship Crisis – Finding, Making, and Keeping Friends When You Are Not a Kid Anymore», à venda em sites como o Amazon.co.uk, que procura analisar o porquê desta situação, quais as possíveis soluções e fornece, ainda, conselhos sobre como manter e fazer novos amigos. Nele, Marla Paul explica que «passar tempo com um amigo especial, nos enche de energia e nos torna mais felizes», defende.

«Se partilharmos um problema com um amigo sentimo-nos menos feridos», afirma. «A amizade tem um impacto positivo na saúde emocional e física», considera ainda a especialista. O problema ganha ainda maiores contornos numa altura em que viver sozinho é uma tendência que veio para ficar.

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Mulheres são as mais penalizadas 

Estudos recentes mostram que as mulheres casadas e com filhos são as mais penalizadas, pois reduzem, de uma média de 14 horas semanais para apenas cinco horas, o tempo que pode ser dedicado aos amigos. Muitas delas nem isso conseguirão. Basta que trabalhem fora e dediquem os fins de semana à casa e à família, defendem muitos especialistas.

O que acontece frequentemente é que os amigos mais próximos são outros casais, também com filhos, e a amizade centra-se muito em torno das atividades em comum, sobretudo com as crianças, não se aprofundando muito em termos pessoais. Mulheres com filhos pequenos acabam por afastar amigos sem filhos, quando estes não são flexíveis, tolerantes ou compreensivos.

Ana Almeida, psicóloga e diretora clínica da Psicronos, refere que a dificuldade em fazer amigos depois dos 30 anos, se prende com o facto de que «a partir dessa idade já não existem instrumentos sociais facilitadores de novas relações de amizades, como é o caso da escola e das universidades. Entre os 15 e os 25 anos, há uma maior disponibilidade para novos conhecimentos e novos amigos, mas a partir dos 30/35 o mercado de trabalho e os condicionalismos sociais penalizam esta disponibilidade».

O local de trabalho acaba assim por ser a principal fonte de novos conhecimentos e, logo, da elaboração de novos amigos, mas, se por um lado, as profissões mais liberais (como relações públicas, gestores de clientes, multinacionais que facilitem mobilidade internacional e por aí fora…) até permitem a abertura a novas afinidades, as mais clássicas acabam por fechar um pouco o círculo.

O que esperar de uma amizade depois dos 30

Ana Almeida explica que, a partir dos 30, a tendência geral é para que nos voltemos a centrar no núcleo familiar, existindo um reforço dos laços familiares, quer para os ascendentes, como pais, tios e avós, quer para os descendentes. Mas depois de uma certa idade, sobretudo a partir dos 40/45 anos, há uma insatisfação interna que nos empurra para fora do ninho e voltamos a procurar novas amizades ou a reforçar as antigas, entretanto perdidas ou descuradas.

«As amizades também se vão perdendo por falta de tempo, por falta de alimento. Há depois uma segunda ronda, muito ligada ao divórcio, em que se volta à posição de solteiro e se desperta novamente a vontade de conhecer novos amigos, pulsão esta que fora esmagada pela dinâmica familiar», explica a especialista.

Enquanto na fase dos 15 aos 25 anos, se espera dos amigos companhia para a realização de atividades, saídas, em que a quantidade é tão ou mais importante que a qualidade, por uma questão de afirmação social, da imagem de popular. Já depois dos 25/30 anos, procuramos amigos que fiquem do nosso lado, que tenham disponibilidade para nos ouvir, para nos apoiar, que sejam capazes de nos chamar a atenção e sobretudo que sejam benevolentes e tolerantes.

Os melhores locais para fazer amigos

Os melhores locais para encontrar novos amigos, segundo a psicóloga, são a frequência de grupos de atividades várias. Por exemplo, pessoas que se juntam para correr, para fazer caminhadas ou montanhismo, workshops de interesses variados, como a culinária, leitura, escrita, entre outros, onde a propensão para relações de amizade é maior entre pessoas com os mesmos prazeres, tal como acontece com cursos e aulas de desenvolvimento pessoal.

Festas de aniversário e festas das escolas também propiciam o bom relacionamento entre pais de crianças em idade escolar, surgindo daqui boas afeições pessoais. Ginásios, ao contrário do que muita gente pensa, não são o local ideal para amizades desinteressadas, pois ainda têm um cunho muito sexual. E tenha sempre em atenção esta importante dica: os bons amigos encontram-se quando não estamos à procura deles.

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O imperativo de evitar amizades tóxicas

Margarida Vieitez, autora do livro «Pessoas Que Nos Fazem Felizes – Perceba Quem Realmente Gosta de Si e Liberte-se de Pessoas Tóxicas» e coautora da obra «SOS Manipuladores», com Fernando Mesquita, ambos criadores da página de Facebook Love Doctors também admite que é mais difícil fazer novos amigos depois dos 30 anos. No entanto, diz que mais importante do que a idade ou o local onde fazemos amigos é saber escolher as pessoas com quem nos relacionamos.

«Assim como quando algumas pessoas procuram namorado desesperadamente e não encontram, ou o que encontram são namorados tão desesperados quanto elas, também procurar fazer amigos rapidamente e sem critério de escolha pode acabar na escolha de amigos tóxicos. Por isso, o mais importante, e independentemente do sítio onde os encontrar, é conhecer bem as futuras amizades e escolher bem», diz.

E nada melhor do que ter em conta que é mais importante bons amigos do que ter muitos amigos. A seletividade assume, assim, um caráter essencial num mundo cada vez mais interligado, apesar do isolamento individual. Até porque há pessoas de quem gostamos que não nos são benéficas. Veja também o artigo que explica o que fazer quando os amigos nos fazem mais mal do que bem.

Texto: Helena C. Peralta