Depois de admitir que tem um problema e de reconhecer que precisa de ajuda médica, quem sofre de depressão acaba por ser reencaminhado para um especialista e sujeito a um tratamento que pode implicar mais do que um método.

Cumpri-lo passa a ser o novo desafio, o segundo de um processo que pode ser moroso e complicado.

Os antidepressivos são o principal tratamento farmacológico para a depressão e uma arma eficaz, sobretudo, nas depressões de origem biológica. Atuam ao nível dos neurotransmissores, substâncias químicas existentes no cérebro e envolvidas na regulação do humor, como a serotonina, a noradrenalina e a dopamina. Os mecanismos exatos de atuação variam, o que determina a existência de vários tipos de antidepressivo.

Quais as contraindicações e efeitos secundários dos antidepressivos?

Dependem da substância ativa e de fatores individuais. Por exemplo, «existem cuidados em caso de doença cardíaca, glaucoma e hipertrofia da próstata», refere o psiquiatra. Mas, «mesmo que a bula não aponte determinadascontraindicações, nem toda a gente reage bem aos mesmos antidepressivos», sublinha.

«O tratamento é um jogo relacional entre cada pessoa, a sua depressão e determinado antidepressivo. O médico deve ter uma visão panorâmica e identificar os fatores relevantes», acrescenta ainda o especialista.

Os antidepressivos provocam dependência?

«Não têm o mesmo potencial de dependência química e de síndrome de abstinência dos ansiolíticos. Há um ou outro antidepressivo com maior tendência para provocar sintomas de privação (tonturas, ansiedade aguda, dores de cabeça, náusea, entre outros), mas com outros isso não acontece. No entanto, a pessoa pode ter receio de deixar de a tomar por uma questão psicológica», esclarece Vítor Cotovio.

Que cuidados devem ser adotados com a utilização de medicamentos antidepressivos?

«É essencial a adequação a cada caso (não usar o medicamento do vizinho) e respeitar os tempos da terapêutica: tem de se esperar o início do efeito (pelo menos, duas a três semanas). Depois há que manter o tratamento quando já se sente melhoras, para consolidar a regularização», alerta o especialista.

«Finalmente, há a retirada progressiva (no mínimo, um a três meses, dependendo da dose). Todos devem ser respeitados para evitar recorrências e recaídas», refere ainda o psiquiatra e psicoterapeuta.

Quanto tempo dura um tratamento?

«Nunca menos de seis a nove meses», considera Vítor Cotovio, segundo o qual «em depressões recorrentes, em que a parte neuroquímica é determinante, pode ser necessária a toma como manutenção».

Dose mínima eficaz

Salvo em casos excecionais, o psiquiatra deve prescrever doses baixas de antidepressivos e ir aumentando progressivamente, se necessário. Assim, identificará a dose mínima eficaz e aumentará a hipótese de resposta positiva aos medicamentos.

A utilização de ansiolíticos

Outros medicamentos usados no tratamento são os ansiolíticos. O seu uso pode justificar-se se a depressão for acompanhada de um quadro de ansiedade. O grupo principal são as benzodiazepinas. Estes têm efeito imediato. Devem ser tomados durante o mínimo de tempo possível, já que provocam habituação.

Classes de antidepressivos

Os mais usados para tratar a depressão são:

- Inibidores da recaptação da serotonina (SSRIS)

São os mais seguros e, muitas vezes, a primeira opção de tratamento. Os efeitos secundários incluem, entre outros, diminuição do desejo sexual e dificuldade de obtenção de orgasmo. As substâncias ativas que incluem são a fluoxetina, a paroxetina, a sertralina, a citalopram e o escitalopram.

- Inibidores da recaptação da se rotonina e no radrenalina (SNRIS)

Podem ter indicação para depressões com sintomas físicos, nomeadamente dor. Os efeitos secundários são equivalentes aos dos SSRIS. As substâncias ativas que incluem são a duloxetina e a venlafaxina.

- Inibidores da recaptação da dopamina e no radrenalina (NDRIS)

Efeitos secundários equivalentes aos dos SSRIS e SNRIS, com menor probabilidade de efeitos a nível sexual. Em doses altas, pode aumentar o risco de convulsões. A substância ativa deste medicamento antidepressivo é o bupropiom.

- Atípicos

Têm efeitos sedativos, podendo ser usados como indutores de sono. São tomados à noite e podem complementar a toma de outros antidepressivos. As substâncias ativas que incluem são a trazodona e a mirtazapina.

- Tricíclicos

De antiga geração, são tão eficazes como os mais recentes, mas têm mais efeitos secundários e mais sérios (sonolência, alterações do ritmo cardíaco, aumento de peso, dificuldades na acomodação visual). São uma solução de recurso quando um SSRI não resulta. As substâncias ativas que incluem são a clomipramina, a amitriptilina, a nortriptilina, a imipramina e a trimipramina.

- Inibidores da monoamina oxidase (IMAO)

Dividem-se em dois tipos, os irreversíveis e os reversíveis. Os primeiros, mais antigos, não são seletivos e têm efeitos secundários sérios resultantes da interação com alimentos com tiramina (queijos, pickles e vinho tinto) e alguns medicamentos. Não podem ser combinados com SSRIS. Em Portugal apenas estão disponíveis os reversíveis e seletivos da MAO-A (bloqueiam apenas este subtipo da enzima MAO). A substância ativa presente é a moclobemida.

O recurso à psicoterapia

Trata a depressão através da relação terapêutica assente no diálogo sobre a doença e assuntos relacionados. É executada por um psicoterapeuta, que pode ser um psiquiatra ou um psicólogo com formação psicoterapêutica complementar.

Como atua?

«Ajuda as pessoas a identificar os fatores que contribuem para a sua depressão e a lidar de forma eficaz com os fatores psicológicos, comportamentais, interpessoais e situacionais associados», responde a American Psychological Association (APA).

Quando se aplica?

«O modelo de tratamento com mais êxito é o que combina antidepressivos com psicoterapia», realça Vítor Cotovio. No entanto, «o capital de intervenção da psicoterapia é maior nas depressões reativas» e, «para ter a eficácia pretendida, a abordagem tem de ser adaptada a cada caso».

Pode ser usada isoladamente?

Segundo o National Institute of Mental Health esta pode ser a melhor opção «em depressões leves a moderadas». Para Vítor Cotovio, é uma hipótese a considerar em «pessoas que deprimem por reação a uma perda quando se percebe, com base na sua história, que em situações parecidas anteriores apresentaram alguma resiliência». A psicoterapia é frequentemente recomendada como primeira linha de tratamento para crianças e adolescentes.

Modelos psicoterapêuticos

Os mais usados no tratamento da depressão são:

Modelo cognitivo-comportamental

O objetivo é identificar crenças e pensamentos distorcidos que estão na base de um funcionamento pessimista. Por exemplo, generalizações como «o meu chefe repreendeu-me, não valho nada». Para reestruturar o pensamento podem ser prescritos trabalhos de casa, como há quem lhes chame.

Modelo de orientação analítica

Centra-se na identificação e interpretação de conflitos com base na relação entre o passado e o presente e na tentativa de os resolver. É o caso da psicanálise e das psicoterapias breves analíticas.

Modelo humanista-existencial

Foca-se em variáveis relacionadas com a procura de sentido para a vida, como a gestão da liberdade, a solidão, o isolamento ou a morte. É útil quando a depressão tem por base preocupações existenciais, como muitas vezes é o caso de pessoas mais idosas.

Modelo interpessoal

Com ênfase nas circunstâncias atuais, foca-se nos problemas e questões interpessoais da depressão.Tem uma componente psicoeducacional e de resolução do stresse psicossocial.

Modelo transpessoal

Tem origem na psicologia humanista e baseia-se na ideia de que as pessoas são, antes de mais, seres espirituais. Debruça-se sobre estados não ordinários de consciência e abrange técnicas como a hipnose, a meditação e o relaxamento.

Terapias de grupo

Baseiam-se na identificação, partilha e resolução de problemas em grupo.

Texto: Rita Miguel com colaboração e revisão científica de Vítor Cotovio (psiquiatra e psicoterapeuta)