O enfarte cardíaco afecta homens e mulheres de forma idêntica e resulta, na maior parte dos casos, da adopção de estilos de vida pouco saudáveis.

A prática de um regime alimentar saudável e de exercício físico podem fazer toda a diferença, num contexto nacional marcado pelo aumento crescente das taxas de obesidade, adulta e infantil.

Resultado? Níveis elevados de mau colesterol (LDL), tensão arterial, diabetes e triglicéridos que podem provocar um enfarte cardíaco.

Como se dá o enfarte cardíaco?

A contracção do músculo cardíaco (miocárdio) faz trabalhar o coração e, para que esta missão seja cumprida, é necessária a obtenção de energia. Essa energia é conseguida pela «combustão» dos açúcares. Os hidratos de carbono são os fornecedores de açúcar no organismo. Quando a combustão dos açúcares é feita na presença do oxigénio, produz-se a energia necessária ao funcionamento do coração.

«Se não existir oxigénio, não é realizada parte da combustão do açúcar e produz-se o ácido láctico que “fere” o músculo cardíaco, provocando dor e desconforto e ficando comprometida a contracção cardíaca», explica Luís Negrão, médico de Saúde Pública e assessor da Fundação Portuguesa de Cardiologia.

Se a falta de oxigenação (isquémia) superar os cinco minutos e a pessoa não recuperar, a célula cardíaca morre e dá-se o enfarte. Conforme explica o especialista, «o enfarte do miocárdio é a morte da célula cardíaca por falta de oxigénio».

Quais os sintomas de um enfarte?

Sensações de morte iminente, de dor, de peso no peito, ansiedade, suor. Para fazer face ao evento, deve descontrair, tentar não se emocionar e chamar um familiar para o auxiliar.

Chame o 112 explique muito bem o que está a sentir e como a dor apareceu, mantenha-se calmo, respire fundo e fale pausadamente.

Porque nem todas as isquémias culminam em enfarte?

A isquémia pode evoluir de forma irreversível, culminando num quadro clínico de enfarte de miocárdio, ou reversível, gerando «apenas» uma angina de peito, uma situação menos grave, porém de risco para a ocorrência de enfarte, mais tarde.

«Frequentemente, muitos doentes que tiveram um enfarte, têm uma história de angina que se manifesta a partir de uma dor, após a realização de um esforço por menor que seja, ou de um estado de nervos», sublinha Luís Negrão.

Este cansaço ocorre porque o coração tem que trabalhar mais e as artérias não têm o oxigénio necessário. As pessoas com angina de peito podem descansar após o esforço, mas o seu coração trabalhará mais devagar do que antes e a oxigenação será inferior. A dor pode abrandar só pelo facto de se descontrair e de estar menos ansioso.

Quais as consequências de um enfarte?

Um enfarte do miocárdio origina sempre uma zona do coração que funciona mal (o músculo deixa de se contrair eficazmente), situação que pode ser mais ou menos grave consoante a zona atingida.

Se a obstrução da artéria afectar uma zona bastante extensa, deixando-a sem aporte sanguíneo, então as consequências
funcionais para o coração serão muito maiores e a disfunção deste órgão passa a ser grande. Pelo contrário, se a zona afectada for muito pequena, o prejuízo funcional é também reduzido.

Há zonas no coração que são vitais para o seu funcionamento e se o enfarte abranger zonas relacionadas com a estimulação eléctrica do coração, deixa de haver corrente e ele pára (morte súbita).

A principal consequência do mau funcionamento do coração é a insuficiência cardíaca, situação caracterizada por um cansaço fácil para gestos muito simples como são a higiene pessoal ou o vestir-se.

Quais as causas de um enfarte cardíaco?

Por definição, o enfarte cardíaco é uma situação clínica provocada pela oclusão súbita de uma artéria coronária, conduzindo à total falta de irrigação e oxigenação de uma determinada área de músculo cardíaco.

Luís Negrão explica que o sangue não circula nas artérias coronárias (que formam uma espécie de coroa em torno do coração) e, portanto, todas as doenças que lesionem estas artérias são perigosas.

«Falamos de uma doença aterosclerótica responsável pelo surgimento de gordura nas artérias, que se manifesta, na maioria das vezes, no coração, embora possa afectar os rins, os membros inferiores, entre outros orgãos», ressalva. Explica que todas as doenças do aparelho circulatório começam habitualmente por ocasionar isquémia (falta provisória da irrigação sanguínea) e acabam por evoluir para um enfarte.

A hipertensão arterial, a hipercolesterolémia (colesterol elevado no sangue), a diabetes e a hipertrigliceridémia (os triglicéridos aumentados no sangue) são factores que estragam as nossas artérias.

Quando estes factores de risco aparecem precocemente estão quase sempre associados a hábitos e estilos de vida poucos saudáveis. Assim, se quer diminuir o seu risco cardiovascular, designadamente de enfarte, deve ter atenção ao seu estilo de vida. Isto porque um estilo saudável anda de mãos dadas com a saúde do coração, sendo importante resistir, em particular, ao sedentarismo, ao seguimento de uma dieta pouco saudável, à obesidade e ao tabagismo.

«O estilo de vida pouco saudável faz com que as doenças do aparelho circulatório surjam com mais frequência e mais cedo, daí a importância da prevenção », alerta Luís Negrão.

Quais os factores de risco de enfarte?

Diabetes

A diabetes é uma doença do metabolismo dos açúcares e provoca uma desregulação das gorduras. Se não estiver bem controlada contribui grandemente para a formação de placas de gordura no interior das artérias, especialmente as da microcirculação. Manter a diabetes muito bem controlada é decisivo para uma maior esperança e qualidade de vida.


Hipertensão arterial

Caracteriza-se pela perda de elasticidade das artérias, que dificulta o transporte do sangue, e pela ausência de permeabilidade do seu interior. As artérias «ficam entupidas devido aos depósitos de gordura e rígidas por causa da hipertensão», explica Luís Negrão.

A tensão arterial ideal é 12/8 em centímetros de mercúrio (cmHg) ou 120/80 em milímetros de mercúrio (mmHg).

Colesterol elevado

O colesterol é uma gordura que vai depositar-se no interior das artérias prejudicando a circulação sanguínea e comprometendo o funcionamento do coração.

A prática de uma alimentação muito rica em carne (vermelha especialmente) e pobre em legumes e hortícolas contribui para a deposição do excesso de colesterol no interior das artérias.

O valor do colesterol não deverá ser superior a 190 mg/dl.

A hereditariedade é um factor de risco?

Se vivêssemos numa sociedade sem hábitos prejudiciais à nossa saúde, a hereditariedade teria uma importância grande e determinante na saúde das pessoas. Mas vivendo numa sociedade em que os factores, hábitos e comportamentos de risco abundam, o peso da hereditariedade dilui-se. A existência de uma história familiar marcada pelo aparecimento precoce de doença cardíaca (hereditariedade) não pode desresponsabilizar-nos do aparecimento precoce de alguns problemas de saúde individual.

Por outras palavras, a ideia fatalista «eu sei que tenho a tensão alta, mas o meu pai e a minha mãe também já tinham tensão alta» é errada. A atitude certa seria «como os meus pais também já tinham a tensão alta, eu tenho que redobrar os cuidados relativamente ao meu problema de tensão».

INIMIGOS DO SEU CORAÇÃO

Efeitos do sedentarismo

- Aumento do peso
- Aumento do risco de diabetes
- Agravamento da tensão arterial
- Agravamento do colesterol sanguíneo
- Redução da auto-estima
- Agravamento da osteoporose
- Agravamento do reumatismo articular

Efeitos de uma má alimentação

- Aumento do peso
- Atraso do trânsito intestinal
- Aumento do risco de cancro no aparelho digestivo
- Facilita o aparecimento de hipertensão
- Facilita o aparecimento do colesterol elevado
- Aumento do risco de aparecimento das doenças cardiovasculares
- Agravamento dos défices nutricionais nalguns nutrientes e consequentes disfunções orgânicas

Efeitos do tabaco

- Aumento da frequência cardíaca
- Aumento da tensão arterial
- Substituição do oxigénio pelo monóxido de carbono
- Dificuldade de circulação sanguínea
- Aumento da coagulação sanguínea

Como tratar o enfarte?

Acalmar o doente e retirar-lhe a dor é o primeiro passo. A segunda etapa do tratamento consiste na desobstrução da artéria e, como tal, o doente deve tomar uma substância que elimine o coágulo sanguíneo que se formou, responsável pela
obstrução do sangue.

Quando se realiza um cateterismo (introdução de um tubo na artéria que vai até ao coração), avalia-se a possibilidade de colocação de um stent. «Trata-se de uma armação em rede que está apertada e se expande (como um guarda-chuva) e faz com que a artéria obstruída abra e desobstrua», define Luís Negrão.

As mais-valias deste material são várias, principalmente, repõe o fluxo sanguíneo, isto é, permite que o sangue não deixe de passar por ali. No entanto, «como corpo estranho que é, podem reaparecer coágulos, depositarem-se gorduras e
pode, em raras situações, ser rejeitado pelo organismo», adverte o especialista.

A realização de um ecocardiograma é um dos passos seguintes, para ver como o coração está a trabalhar, ou seja, verificar se o músculo – o miocárdio – mantém a sua capacidade contráctil.

Posteriormente, importa reduzir os factores de risco cardiovascular, o colesterol, a tensão arterial e a viscosidade do sangue e implementar um programa de vida saudável.

«O médico não pode tratar o coração afectado como uma vítima, deve antes, discipliná-lo, nomeadamente, a partir da elaboração de um plano de actividade física adequado», afirma Luís Negrão.Estes esforços têm por objectivo garantir a sobrevivência do coração e devem culminar num trabalho consistente de reabilitação do doente, sendo fundamental a relação estabelecida com o seu médico.

Imprescindível é, igualmente, o seguimento diário de uma medicação que dilate as artérias para ajudar o coração a funcionar com um ritmo mais tranquilo.

Texto: Daniela Gonçalves com Luís Negrão (médico de Saúde Pública e assessor da Fundação Portuguesa de Cardiologia)