Carlos Martins, investigador da Faculdade de Medicina do Porto e responsável por uma investigação publicada na revista científica Plos One, alerta para a realização de diagnósticos desnecessários do cancro da mama.

Este estudo revela que «os portugueses fazem um número excessivo de exames complementares de diagnóstico e com uma frequência muito superior àquela que é recomendada pela melhor evidência científica», adverte o especialista.

«Há uma mensagem que deve ser transmitida aos portugueses. Submeter-se a exames médicos é expor-se a riscos. Se, num período de dez anos, forem rastreadas com mamografias duas mil mulheres, evita-se a morte de uma delas, mas são realizados dez diagnósticos desnecessários e 200 mulheres vão passar pela experiência de ter um falso positivo. As dez mulheres diagnosticadas desnecessariamente irão ser submetidas a cirurgias e tratamentos com considerável impacto na sua qualidade de vida», exemplifica mesmo Carlos Martins.

O que acontece nos casos de falsos positivos?

Muitos exames nem sempre apontam para um diagnóstico correto, como sucede muitas vezes nas mamografias. «Um falso positivo significa uma alteração na mamografia. O exame não está normal, logo essas 200 mulheres serão sujeitas a exames adicionais (por exemplo, repetir a mamografia ao fim de alguns meses, complementar com ecografia) e a maior parte delas acabará por ser submetida a biopsia, que mostrará que, afinal, não têm cancro», sublinha.

«Contudo, existem estudos que demonstram que ter um falso positivo acarreta bastante sofrimento psicológico para as mulheres e vão sempre ter tendência para serem mais preocupadas com a mama do que mulheres que não tenham passado por isso», acrescenta,ainda, ainda o especialista.

O que está em causa num diagnóstico desnecessário ou num sobrediagnóstico de cancro da mama?

A resposta não se faz esperar. «São cancros que nunca se iriam manifestar ao longo da vida da mulher, nem nunca iriam provocar doença ou morte. As células da biopsia analisadas ao microscópio revelam características oncológicas, só que são cancros não evolutivos, de evolução tão lenta que nunca se irão manifestar. Estes cancros só foram detetados porque, num dado momento da vida daquela mulher, ela foi submetida ao rastreio», afirma Carlos Martins.

«O problema é que a medicina atual, depois de detetar o cancro, não consegue saber se é deste tipo (não evolutivo ou de evolução lenta) ou se é aquele cancro que irá matar a mulher, e acaba sempre por tratá-la. Os estudos mais recentes mostram que, num programa de rastreio de cancro da mama, a dimensão do sobrediagnóstico é significativa e daí a comunidade médica estar cada vez mais preocupada com o dano que pode provocar em mulheres que, de resto, seriam saudáveis», conclui o investigador.

Texto: Fátima Lopes Cardoso com colaboração e revisão científica de Drª Berta Sousa (especialista em oncologia da Unidade de Mama do Centro Clínico Champalimaud), Drª Celeste Alves (radiologista da Unidade de Mama do Centro Clínico Champalimaud) e Dr. Carlos Martins (investigador da Faculdade de Medicina do Porto)