Aos 33 anos, em virtude de uma amigdalite severa, Luísa Venda descobriu que tinha um cancro da tiróide. Sentiu-se perdida e pensou não ter mais seis meses de vida, mas decidiu não se deixar vencer pela doença e lutar.

Há três anos, casada e com uma filha de quatro, Luísa Venda, farmacêutica, viu o seu mundo desmoronar.

«Descobri (que tinha cancro) de uma forma ocasional, na sequência de uma amigdalite muito severa (tinha a sensação que poderia sufocar a qualquer momento), que me levou a uma urgência hospitalar».

«Fizeram-me uma ecografia, através da qual foi detectado um nódulo da tiróide. Depois fiz mais alguns exames complementares e a conclusão é que se tratava de um nódulo maligno», revela Luísa Venda.

Na altura, sentia-se cansada, com falta de força, muito sono e uma rouquidão que teimava em não desaparecer. Mas estava longe de imaginar que aqueles sintomas (sempre desvalorizados por si) pudessem ser algo mais do que a expressão de algum stress.

A má notícia veio pelo correio

A descoberta de que afinal estava doente e que a situação era muito grave, abateu-se sobre Luísa Venda como se de uma bomba se tratasse. E descobriu-o da pior maneira possível: «Soube que tinha cancro da tiróide pelo correio. Parece surrealista, mas não é. Foi mesmo verdade».

«Tinha sido feita uma biopsia e enviaram-me o resultado para casa, o que até uma situação mais ou menos frequente. O primeiro impacto é muito forte. Senti-me completamente perdida. Pensei que ia morrer em seis meses», desabafa.

Na verdade, já tinha ouvido falar da doença, mas tinha pouca informação sobre as suas consequências e desconhecia mesmo que era o cancro com maior prognóstico de cura. Uma situação que, segundo diz, se alterou nos últimos anos:

«Hoje já se ouve falar mais sobre o cancro da tiróide». Tomada de assalto pela tempestade que a notícia provocara, Luísa Venda experimentou sentimentos como o medo, desespero e impotência.

«Quando vi o resultado do exame, em que se lia que tinha sido detectado, carcinoma da tiróide, pensei que ia morrer. Naquele momento, só pensei na minha filha, que na altura tinha três anos, e no que tinha de fazer para a deixar o melhor possível», confessa.

Conhecer o inimigo

Abalada, mas confiante, o primeiro
passo foi consultar toda a informação possível sobre o cancro da tiróide
e como podia lutar contra ele: «Depois do choque inicial e depois de me
informar mais sobre a doença, comecei a encará-la de forma muito mais
positiva.

Como se fosse mais uma etapa da vida que tinha que ser
ultrapassada», explica.

Começou, assim, por traçar um objectivo:
vencer a doença.

«E para isso, ia fazer tudo o que fosse necessário para
o conseguir», confessa.

Depois de lhe ter sido removida a tiróide
na totalidade, teve de fazer iodoterapia. Para isso é preciso estar-se
numa fase de hipotiróidismo e podem ocorrer sintomas que, no seu caso,
foram muito complicados de gerir, como cansaço extremo e falta de
forças.

«Houve uma altura em que tive mesmo de estar de cama nos
últimos 15 dias. Também me aconteceu pegar no carro para fazer uma
viagem de uma hora e meia e ter de parar porque não tinha forças e ficar
a descansar uma, duas horas na estação de serviço. Não podia sequer
pegar na minha filha ao colo», conta.

Hoje, porque não tem
tiróide, é obrigada a tomar a hormona produzida pela tiróide de forma
química, ou seja, todos os dias tem de tomar um fármaco. Um procedimento
que tem de repetir o resto da sua vida.

Na altura, Luísa Venda
contou com um apoio muito importante nos bons e maus momentos: a
família. Segundo recorda, ninguém optou pela negação da doença, mas
também ninguém escondeu a preocupação:

«Assim que soube que tinha
cancro da tiróide, senti necessidade de partilhar a notícia com os meus
pais. No início, as pessoas ficaram muito assustadas e um pouco
incrédulas. Querem ajudar e dar-nos força, mas ao mesmo tempo têm
dificuldade em acreditar. Afinal, pensamos que estas coisas só acontecem
aos outros», explica.

A cura chegou sete meses depois e, hoje, está
muito habituada a que os amigos ou familiares que se relacionam com
pessoas que estão a passar pelo mesmo lhe telefonem a pedir informações.

Uma segunda vida

Três anos depois, Luísa Venda não tem dúvidas
de que o seu grande trunfo foi nunca ter virado as costas à doença e
acreditar sempre que podia vencê-la. Mesmo que isso implicasse passar
por momentos de sofrimento, de dúvida, receio, desânimo...

O
importante era acreditar que podia vencer o cancro da tiróide e que para
isso  não podia desistir: «Houve alturas em que me senti
deprimida. Vivi momentos de solidão, mas o optimismo é fundamental. É  importante a pessoa acreditar que pode vencer a doença».

Hoje,
admite que é uma pessoa mais calma e que aprendeu a dar mais valor à
vida e às pessoas que realmente são merecedoras da sua atenção: «Depois
de ter experimentado a sensação que a morte pode surgir quando menos
esperamos, sem dúvida que hoje dou mais valor e usufruo muito mais da
vida. Uma situação destas faz-nos repensar todos os aspectos da nossa
vida», confessa Luísa Venda que, entretanto, se divorciou e construiu
uma nova relação.

Os conselhos de Luísa Venda

Não entrar em
pânico. «O facto de ter um nódulo não quer dizer que seja um cancro, mas
é preciso estar atento e esperar que o médico analise.»
Nunca
desistir. «Nunca perder a esperança de vencer a doença. O optimismo é
fundamental. No caso do cancro da tiróide, o prognóstico é muito bom e a
percentagem de sucesso muito elevada.»

Procurar informação. «Deve
informar-se bastante, de modo a poder lidar da melhor forma com a doença
e saber quais os sintomas e os efeitos dos tratamentos, que podem ser
mais ou menos intensos em diferentes pessoas. O papel do médico é
fundamental.»

Enfrentar a verdade. «É preciso ser realista. Não achar
que é muito mau nem muito bom, é preciso ter a noção da realidade.»

Seguir
em frente. «A vida continua, não podemos viver sob o estigma do cancro.
Ao mesmo tempo, é preciso ter a noção de que nos próximos 20 anos se
tem uma probabilidade maior do as outras pessoas de ter um cancro na
tiróide.»

Conhecer o cancro da tiróide

O que é a tiróide?

A
tiróide é a glândula endócrina fundamental em todo o funcionamento do
nosso organismo. Muitos dos processos bioquímicos do corpo são da
responsabilidade das hormonas libertadas pela tiróide e que estimulam o
metabolismo.

O hipotiroidismo e o hipertiroidismo são as
perturbações mais frequentes da tiróide, mas os nódulos e o carcinoma da
tiróide são cada vez mais comuns.

O que é o cancro da tiróide?

É
um tumor maligno da glândula tiroideia que surge, normalmente, sob a
forma de nódulo no pescoço. Atinge maioritariamente as mulheres e o seu
diagnóstico é quase sempre fruto de uma palpação espontânea do doente ou
do médico num exame típico de rotina.

Quais os seus sintomas?

A
rouquidão prolongada e a dificuldade na deglutição ou na respiração
podem ser os primeiros sinais de alerta.

Qual a sua causa?

Não há
nenhuma razão específica que justifique o aparecimento deste tipo de
cancro. Pode surgir em qualquer pessoa e a sua causa é quase sempre
desconhecida.

Contudo, estudos feitos nas últimas décadas indicam
que a radioterapia da cabeça, pescoço ou tórax podem ser um factor de
risco.

Qual a hipótese de cura?

95% dos casos têm sucesso
terapêutico, não causando dor nem incapacidade. O diagnóstico atempado é
fundamental neste processo.

Para saber mais:
Sociedade
Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismoz

www.spedm.org

Texto: Evelise Moutinho

Fotografia Estúdios António J. Homem Cardoso