A exposição a poluentes presentes no ambiente, mesmo que em pequenas concentrações, provoca infertilidade masculina.

Esta é a conclusão de estudo internacional liderado pelo investigador João Ramalho-Santos, desenvolvido pela aluna de doutoramento Renata Tavares, do Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra (UC).

As conclusões da investigação foram publicadas na Human Reproduction, revista internacional de referência na área de reprodução humana. Pela primeira vez, a equipa, que envolveu também investigadores das universidades de Dundee na Escócia e de Birmingham em Inglaterra reproduziu em laboratório o que se passa na natureza, expondo espermatozoides humanos a concentrações de um pesticida iguais às encontradas no ambiente.

Ao expor as amostras de esperma humano a concentrações um milhão de vezes inferiores às utilizadas em estudos anteriores, os investigadores provaram que as quantidades de pesticida presentes na natureza provocam danos no espermatozoide.

«Estes disruptores endócrinos (substâncias que provocam alterações hormonais no organismo) boicotam a comunicação intracelular afetando a atividade do espermatozoide que começa a tentar fertilizar sem a presença do ovócito o que causa a sua morte», explica o coordenador do estudo desenvolvido ao longo dos últimos cinco anos.

Em entrevista à Prevenir, o investigador João-Ramalho-Santos ajuda a perceber a importância, o impacto e as consequências das conclusões deste estudo, que recomenda a limitação da exposição dos homens aos níveis de poluição que o planeta tem vindo a registar ao longo das últimas décadas. «Quantidades muito baixas causam efeitos», alerta.

Como é que a exposição a poluentes ambientais para o sexo masculino pode causar infertilidade no homem?

Geralmente os poluentes interferem com a produção de espermatozoides e com a sua função, fazendo com que homens expostos produzam menos espermatozoides e de pior qualidade

Que medidas podem ser tomadas pelo homem para se proteger?

Começaria por uma avaliação rigorosa e publicitação mais alargada dos níveis de diferentes poluentes em diferentes circunstâncias (indústrias, entre outros, por exemplo), procurando limitar a exposição a indivíduos em risco.

Numa situação em que ocorra a fecundação, poderão os futuros fetos vir a nascer com deformações devido à exposição a estes poluentes?

Há indícios de que isso sucede em modelos animais estudados em laboratório, embora em humanos haja apenas estudos quando ocorrerem acidentes muito graves, como o de Seveso em Itália, já que não se podem programar estes ensaios.

[Nos trabalhos de investigação que fazemos], podemos apenas ver os efeitos de ocorrências naturais.

Vários jornais internacionais publicaram notícias, no início de novembro de 2013, sugerindo que o smog e a poluição atmosférica de Xangai da crise na qualidade do esperma que as análises dos médicos têm detetado naquela região. Estas conclusões vão ao encontro das do vosso estudo. Como as comenta?

Não nos espantam, como é óbvio... A questão é que, neste caso, é difícil dizer exatamente a que substância(s) se deve o efeito.

O que motivou esta equipa a centrar-se neste tema e quais as principais conclusões que surpreenderam os investigadores que colaboraram neste estudo?

Inicialmente, foi a polémica da co-incineração de resíduos na região de Coimbra, mais propriamente em Souselas, embora tenhamos depois estudado outras substâncias com maior impacto internacional. A principal surpresa foi que quantidades muito baixas [de agentes poluentes] causavam efeitos, o que não estava descrito.

Falam dos efeitos da fertilidade no homem no vosso estudo. E na mulher? O sexo feminino é afetado por estes problemas da mesma forma?

Pensa-se que sim, embora não
necessariamente do mesmo modo. O problema de estudar o sexo feminino
é que a produção de óvulos é muito limitada, ao contrário da
produção de espermatozoides, o que dificulta obter material para
experiências científicas.

Texto: Fabiana Bravo