A astragalus é utilizada pela medicina tradicional chinesa há milhares de anos. Sozinha ou combinada com outras plantas, reforça a imunidade do organismo, incluindo cancro, diabetes, anemias e hepatites.

Nos últimos anos, no entanto, são os seus benefícios no condicionamento da evolução da SIDA em portadores de HIV que têm merecido elogios de membros da comunidade médica e científica internacional.

Em entrevista à Prevenir, Wenqian Chen, médica especialista em medicina tradicional chinesa no Centro de Terapias Chinesas, em Lisboa, explica como atua esta planta, que também tem propriedades anti-bacterianas e
anti-inflamatórias. Esta não é, no entanto, a única espécie botânica usada pela fitoterapia chinesa. Descubra outras plantas que podem fazer verdadeiros milagres pela sua saúde.

De um modo mais técnico e pormenorizado, como é que a fitoterapia, nomeadamente a astragalus, condiciona o avanço da SIDA em portadores de HIV?

Geralmente os telómeros (cromossomas das células) são longos o suficiente para se dividirem muitas vezes sem problemas pois, quando estão a combater infeções, as células podem ativar uma enzima chamada telomerase, que impede que os telómeros se encurtem. O problema é que, quando lidamos com um vírus que não pode ser eliminado do corpo, como o HIV, as células não conseguem manter as suas telomerases ligadas e os telómeros ficam sucessivamente mais curtos.

No entanto, num estudo divulgado pelo Centro de Terapias Chinesas, os pesquisadores usaram um composto químico chamado TAT, originalmente identificado nas plantas utilizadas na medicina tradicional chinesa, nomeadamente a astragalus, chamada huang qi em chinês, que provou melhorar a atividade da telmerase noutros tipos de células. Eles testaram o TAT2 de diversas formas.

Primeiro, expuseram as células-T CD8 de pessoas infetadas com HIV ao TAT2 e descobriram que o composto não retarda apenas o encurtamento dos telómeros, mas também melhora a produção de fatores solúveis da célula chamadas quemoquinas e citoquinas, que outros estudos já comprovaram ter a capacidade para inibir a replicação do HIV. Outros estudos com a astragalus em pessoas com outras infeções virais têm demonstrado um aumento nas células imunes.

A astragalus é a única espécie botânica usada em fitoterapia a garantir esses resultados ou existem outras?

A astragalus, usada atualmente para tratar a hepatite B e outras infeções virais, foi uma das primeiras ervas a ser identificada como tratamento potencialmente útil para o HIV, apesar de existirem bastantes outras plantas da medicina tradicional chinesa, cujos efeitos já foram estudados e comprovados positivamente no combate aos sintomas do HIV e, no seu retardamento. Na China, por exemplo, a astragalus é utilizada em combinações que tratam de supressão da célula imunológica após quimioterapia.

Na verdade, a maior parte da informação clínica sobre os efeitos desta planta é proveniente de estudos em que são utilizadas outras ervas, as célebres fórmulas. A fitoterapia chinesa não se esgota na utilização dos chamados simples, isto é, no tratamento com a utilização de uma única planta. Antes pelo contrário, os simples são o nível menos importante da fitoterapia chinesa, que se especializa sobretudo na criação de fórmulas.

Esta possui uma teoria muito desenvolvida da combinação de plantas entre elas, chegando ao ponto de adaptar estas fórmulas a cada paciente individualmente. A ideia nestas fórmulas passa também por garantir que umas plantas contrabalançam os efeitos menos positivos das outras, ou potenciam os efeitos positivos de outras de modo sinergístico.

O recurso a terapêuticas anti-retrovirais continua a ser a prática
mais comum. Tem a desvantagem de ser mais cara. Mas, se não pensarmos
na parte económica, que vantagens tem em relação à medicina tradicional
chinesa e à fitoterapia?

As terapêuticas anti-retrovirais têm
a sua eficácia comprovada mas, dada a sua vertente invasiva, acabam por
nem sempre ser bem toleradas por algumas pessoas que vivem diariamente
com HIV.

Os anti-retrovirais são medicamentos complexos, com grande
potencial de reações adversas, algumas delas muito graves.

Existem
muitos pacientes para quem os riscos de tomar estes medicamentos podem
ser maiores do que os seus potenciais benefícios e, nesses casos, a
utilização da medicina tradicional chinesa é uma boa solução. E
claro que a medicina chinesa deveria ser considerada como uma das
principais terapias na gestão dos efeitos secundários dos
anti-retrovirais, no caso de pacientes que necessitem mesmo de os tomar.
Aliás, esta máxima aplica-se a todos os tratamentos invasivos com
efeitos adversos.

No Centro de Terapias Chinesas, temos muita
experiência em ajudar pacientes que estão a combater cancros com
radioterapia ou quimioterapia, a tratar os efeitos secundários dessas
terapias muito agressivas. Existem muitas fórmulas que podem ser
usadas em complemento dos tratamentos contra a SIDA, e que podem ajudar
imenso a melhorar a qualidade de vida dos pacientes. Estas fórmulas da
fitoterapia chinesa são receitadas por um especialista tendo em conta o
próprio paciente, os sintomas que ele sente e as maneiras como a doença
se está a manifestar com ele.

Provavelmente a fórmula mais
típica e imediatamente útil para um paciente com SIDA seria shen qi da
bu, que é uma combinação de astragalus e de dang shen, obtida a partir
da raiz de codonopsis, uma planta da família do ginseng e que é muito
usada em substituição deste por causa do seu preço mais baixo, que é
receitada como um tónico geral para o corpo todo e sistema imunitário,
bem como um tónico em todos os casos de problemas e fraquezas do sangue.
Mas, dependendo dos sintomas, existem muitas outras fórmulas.

Por
exemplo, a fórmula xiao huo luo é muito indicada quando o paciente
sente dores musculares ou nas articulações. Esta fórmula contém seis
plantas, das quais a mais importante será provavelmente a morus alba, um
arbusto da família da amoreira, mas sempre em ação sinergística com
todas as outras. A SIDA causa também frequentemente problemas ao nível
respiratório e propicia inúmeras infeções oportunistas por esta via.
Nestes casos é especialmente indicada uma fórmula antiga, a yu ping
feng, que é receitada muitas vezes para combater infeções respiratórias
mas, sobretudo, como prevenção, para tonificar o sistema imunitário e
preparar o corpo contra ataques externos.

Esta fórmula também
tem como um dos seus principais ingredientes a planta astragalus, em
conjunção com outras cinco plantas. Esta fórmula, pelo seu preço e
segurança, foi a fórmula básica que as autoridades chinesas recomendaram
à população como preventivo de infeções respiratórias durante a crise
da chamada gripe das aves (SARS, em inglês, a síndrome respiratória
aguda grave), que causava uma pneumonia atípica.

A fitoterapia
tem-se revelado benéfica na prevenção e no tratamento de uma série de
doenças. Quais são as mais comuns e quais as plantas que acabam por ser
mais usadas em cada uma delas?

É difícil responder a essa
pergunta de modo tão genérico e tão simplista.

Na China, a utilização da fitoterapia é
tão generalizada que podemos dizer que ela constitui a principal linha
de tratamento médico, independentemente de estarmos a falar da medicina
chinesa ou da convencional, sendo que as duas estão muito integradas.

Praticamente não existem problemas que não sejam tratados com
fitoterapia. Mais uma vez, mais importante do que as plantas em si, são
as fórmulas que as combinam. Mas podemos falar de algumas das
principais plantas medicinais, daquelas que entram em inúmeras fórmulas,
e sobretudo que são frequentemente recomendadas como simples (usadas
sozinhas), geralmente como prevenção, um dos aspetos mais importantes da
medicina chinesa. O ginseng, por exemplo, é uma das plantas mais usadas
como tónico.

O fungo fu ling (poria) é muito utilizado em inúmeras
fórmulas, e em particular para tratamento de problemas metabólicos ou
ligados ao colesterol e à gordura, entre outros. Talvez uma das
mais conhecidas plantas seja a da huang (ruibarbo), usada numa variedade
grande de problemas gastro-intestinais e que entra em centenas de
fórmulas. Mas existem literalmente milhares de plantas e fórmulas usadas
na medicina chinesa. A principal exigência para a utilização das
fórmulas da fitoterapia chinesa é a existência de um diagnóstico correto
de acordo com a medicina chinesa.

Se o diagnóstico for correto,
é certo que existe uma ou mais fórmulas que poderão ser receitadas e
que os resultados serão bons no tratamento de quase todas as patologias.
Isso é ainda mais verdade se a fitoterapia vier em complemento de
tratamentos de acupuntura, já que muitos estudos apontam para que a
combinação destes dois métodos de tratamento seja o ideal. Mas a
fitoterapia chinesa é uma das mais antigas e mais vastas tradições
médicas do mundo e possui fórmulas utilizáveis para praticamente todas
as patologias.

Todas as pessoas podem recorrer à fitoterapia ou existem grupos de indivíduos a quem este método não é recomendado?

Esta
é outra pergunta difícil de responder de um modo abstrato. Todas as
pessoas podem recorrer à fitoterapia mas nem todas as fórmulas serão
indicadas para todos os pacientes, e sobretudo, para todas as alturas.
Por mais segura que seja, a fitoterapia possui algumas contraindicações,
dependendo das plantas e fórmulas a usar. Existem plantas que não são
indicadas para pacientes que tenham hipertensão, por exemplo, ou plantas
que podem ser usadas com segurança em quase todas as pessoas, mas que
não podem ser usadas por grávidas.

Assim, uma fórmula que
aumenta a energia geral e seja muito tónica não deve ser receitada a
pacientes que já estejam em estado ansioso, tal como fórmulas que
aumentem o fluxo ou a força do sangue podem ter efeitos adversos em
grávidas. Mais uma vez, o diagnóstico correto é talvez a coisa mais
importante, e o médico que receita ser bom conhecedor das plantas. Mas
duma maneira geral, e não entrando em situações específicas.

A
fitoterapia é indicada para todas as pessoas e todas as idades, sendo
aliás de enorme segurança, quase não se conhecendo casos de reações
graves à utilização da farmacopeia chinesa. Devemos lembrar que mesmo em
casos em que uma fórmula possa conter uma planta com alguma toxicidade
(como, por exemplo, o acónito), a própria fórmula vai incluir plantas
que vão reduzir esse risco.