23 de abril de 2014 - 13h33

Hábitos e costumes enraizados na tradição guineense impedem ainda hoje que uma grávida ou criança coma os alimentos que precisa, denunciaram as autoridades nacionais e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).  

"Alguns tabus impedem o consumo de determinados alimentos pelas grávidas e crianças, tais como ovos, banana, carne e outros", referiu o documento base da nova política nacional de nutrição até 2025. Fonte da Unicef em Bissau esclareceu que a prevalência dos casos "não está estudada", mas há relatos de várias crenças.

Se a mãe comer carne, a criança vai nascer com esse hábito, logo, se um dia faltar dinheiro, ela vai roubar ou pedir a terceiros, de acordo com uma das histórias ouvidas por Ivone Menezes Moreira, diretora do Serviço de Nutrição e Sobrevivência da Criança da Guiné-Bissau. 

Noutros locais do país, há quem acredite que se a criança comer ovos "vai nascer com a pupila branca e virar ladrão" ou que se as mães ingerirem bananas vão ficar com joelhos moles na altura do parto. 

Segundo dados das Nações Unidas, uma em cada quatro crianças da Guiné-Bissau sofre de má nutrição crónica e acaba por ter problemas fatais - por cada sete crianças que nascem na Guiné-Bissau pelo menos uma morre antes dos cinco anos. 

A política dedicada ao tema estabelece diversos objetivos para os próximos 10 anos, entre os quais "reduzir em 40 por cento o número de crianças menores de cinco com atraso de crescimento", referiu-se no documento a que a Lusa teve acesso. 

Acabar com problemas de anemia, falta de vitaminas, iodo e falta de peso dos recém-nascidos são outras das metas e para lá chegar são enumeradas dezenas de medidas em cada área de intervenção do Governo (como sejam a educação e saúde). 

Para as pôr em prática, a máquina do Estado, praticamente
desmantelada após anos de instabilidade política e impunidade face à
corrupção, conta com parceiros internacionais e locais, mas o desafio é
imenso, referiu-se no documento. 

"O mais importante é garantir
que o compromisso político continue para colocar a nutrição como uma
prioridade nacional", disse Abubacar Sultan, representante da Unicef em
Bissau. 

O objetivo fundamental passa por "garantir que os
primeiros mil dias de vida sejam os mais seguros", ou seja, com nutrição
e afetos nos alicerces da formação pessoal. 

A dieta alimentar enraizada junto de quase toda a população "está errada", destacaram as autoridades nacionais e a Unicef. 

Um
terço das crianças não é amamentada, faltam complementos alimentares
para os bebés e o consumo de frutas e legumes, ricos em vitaminas e
minerais, é raro, segundo dados de 2012 do Programa Alimentar Mundial
(PAM). 

De acordo com a mesma organização, os adultos também
seguem um menu deficiente, baseado essencialmente no consumo de arroz e
outros cereais, sem proteínas animais e sem levar à mesa os legumes e
frutas abundantes em todo o território. 

Mudar o cenário até
2025 implica enfrentar a pobreza que afeta 70% da população - sendo que
um terço dela vive em miséria extrema (com menos de um dólar por dia, ou
seja, alguns cêntimos de euro). 

Metade da população é
analfabeta, não há infraestruturas socioeconómicas de apoio ao
desenvolvimento local, nem capitais financeiros, humanos, físicos ou
sociais.

Por SAPO Saúde com Lusa