28 de fevereiro de 2014 - 13h11
O departamento de Saúde britânico lançou uma consulta de três meses para dar a conhecer o rascunho do projeto de lei que regulará uma técnica científica recente e inovadora que pretende prevenir doenças hereditárias graves, as designadas doenças mitocondriais cuja causa é ainda desconhecida. Mas o método é controverso: requer manipulação genética. 
Em traços gerais, o embrião receberia uma combinação de ADN de três pessoas: do pai, mãe e doadora.
As doenças mitocondriais ocorrem em um em cada 5 mil a 10 mil nascimentos e são causadas por um defeito na mitocôndria materna. Para evitar herdar este património genético, a técnica em causa utiliza um óvulo doado. Na verdade, toda a informação genética da mãe é transferida, à exceção da mitocôndria defeituosa. O novo ovo é fertilizado com o esperma do pai e o bebé resultante desta técnica recebe 20.000 genes dos seus pais e apenas 37 genes mitocondriais da mulher doadora.
O governo do Reino Unido, com o apoio do Ministério da Saúde, anunciou em junho que apoia esta técnica de reprodução assistida, valendo-se do relatório do Conselho de Bioética de Nuffield, um órgão independente que faz assessoria ao Governo em questões éticas e médicas. 
Porém, a regulamentação da técnica tem de ser debatida e aprovada pelo Parlamento em Londres, para que a técnica seja legislada.
Esta tripa procedência genética introduziria alterações genéticas na criança mas também nas futuras gerações, ainda que não tivesse impacto nas características da pessoa, já que o ADN do núcleo da doadora é eliminado. Porém, desconhece-se ainda se o método tem efeitos secundários inesperados.
“Permitir a doação de mitocôndrias daria a uma mulher com doença mitocondrial a oportunidade de ter filhos sem transtornos genéticos devastadores”, como cegueira ou surdez, por exemplo, salienta a médica Sally Davies, responsável do Ministério da Saúde britânico, citada pelo jornal espanhol El Mundo.

O projeto de lei, ainda em formato de rascunho, tem 47 páginas e aponta caminhos na regulação e no estatuto da doadora. A criança, por exemplo, não poderá um dia conhecer a doadora, nem o inverso.
Na terça-feira, a agência americana que regula medicamentos, terapias e tratamentos (FDA) anunciou que iria criar um comité de especialistas para estudar a nova técnica.
Porém, o que o Reino Unido pretende não é debater se a técnica deve ou não ser permitida, mas sim como deve ser implementada.
O projeto em estudo salienta que apenas as mulheres com defeitos na mitocôndria grave podem ser submetidas à prática, o que corresponderia a cerca de 10 mulheres por ano no Reino Unido.
Resta dizer que a técnica nasceu nos Estados Unidos pelo grupo de investigação de Shoukhrat Mitalipov, do Oregon National Primate Research Center, o mesmo que conseguiu realizar em humanos técnicas de clonagem terapêutica. A investigação foi depois aprofundada pela Universidade de Newscastle, no Reino Unido, que corroborou as descobertas norte-americanas.
Nuno de Noronha