Enfermeiros especialistas, muitos deles a trabalhar em blocos de partos, estão a entregar na sua Ordem, desde a passada semana, o título de especialidade, o que impede que exerçam funções nos serviços especializados, uma ação para exigir a revalorização salarial das suas funções como especialistas.

Em declarações à Lusa, o bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, disse que será emitida uma nota aos médicos para que estejam alertados para a situação. Nesse sentido, a Ordem disponibilizará na segunda-feira um requerimento que os médicos devem entregar nos respetivos hospitais no sentido de terem alguma proteção no caso de acontecer alguma coisa fora do normal.

“É uma situação muito preocupante. Tenho tido contacto com colegas de obstetrícia que estão preocupados porque o objetivo principal é assegurar cuidados de saúde às grávidas e as grávidas têm muitas situações urgentes a que os hospitais têm de dar resposta”, disse.

Miguel Guimarães explicou que, se os enfermeiros especialistas deixarem de fazer as suas tarefas, os médicos terão uma pressão maior o que poderá ter consequências negativas para as próprias grávidas. “O que me preocupa é garantir a segurança das grávidas e o seu bem-estar e de alguma forma também a segurança dos próprios médicos de obstetrícia e ginecologia”, disse.

Sem enfermeiros especialistas nas equipas

A nota que será publicada na página da Ordem dos Médicos, explicou Miguel Guimarães, alerta os médicos para a eventualidade de deixarem de ter enfermeiros especialistas nas suas equipas.

Este enquadramento de equipa multidisciplinar na especialidade (médicos e dois enfermeiros, um deles especialista), adiantou, foi criado pela própria Ordem dos Médicos, mas face à situação que agora se coloca não será possível cumprir, diminuindo a qualidade das condições de trabalho. Os hospitais, frisou, também terão de definir o que fazer relativamente a esta matéria.

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Os enfermeiros especialistas estão em protesto há duas semanas, não cumprindo as funções especializadas pelas quais ainda não são pagos. O protesto seguiu-se a outro, nos mesmos moldes, ocorrido em julho e que foi interrompido para negociações com o Governo.

No final de agosto, os profissionais queixaram-se de ameaças por parte dos conselhos de administração dos hospitais e acusaram o ministro da Saúde de desonestidade e de ter enganado os profissionais.

Em comunicado, o movimento que representa estes enfermeiros anunciou no sábado o endurecimento da luta e a bastonária da Ordem dos Enfermeiros disse hoje à Lusa que alguns profissionais já começaram a entregar os títulos que os habilitam para a especialidade.

Ana Rita Cavaco explicou que esta suspensão de título retira-lhes a possibilidade de exercer competências especializadas que só podem ser exercidas por pessoas detentoras do mesmo, sendo-lhe passado o título de generalistas.

“Temos de dar a suspensão do título, porque o título é deles, a vontade é deles e há procedimentos a fazer como a recolha da atual cédula profissional, que é o que os identifica para trabalhar em Portugal ou no mundo inteiro como especialistas”, disse.

O título de especialista, adiantou, é pago pelos próprios enfermeiros, tal como a formação que é feita em horário pós-laboral.

“Eles pagam a formação do seu bolso e até isto está errado. Não entendo como é que um país, um Estado, um Governo que sabe que há uma formação para a qual não contribuiu se acha no direito de usar este benefício em proveito próprio sem lhes dar dinheiro a mais”, disse Ana Rita Cavaco.

Esta situação, adiantou a bastonária, surge porque estes enfermeiros começaram a ser ameaçados pelos conselhos de administração dos hospitais com processos disciplinares, o que levou a Ordem a preparar uma intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias dos enfermeiros.

“Essa tentativa de abertura de processos disciplinares, ameaças e coação diárias começou a acontecer nos hospitais e levou a este limite. Ninguém consegue trabalhar assim”, frisou.

A bastonária sublinhou que os enfermeiros estão exaustos, não têm carreira profissional e levam para casa menos de mil euros por mês, tanto os generalistas como os especialistas, trabalhando 35 ou 50 horas por semana.