A Direção Geral de Saúde já tem prontas as orientações sobre mutilação genital feminina dirigidas aos profissionais de saúde, que estão agora a ser estudadas pelas sociedades da especialidade, disse hoje à Lusa uma das médicas que preparou o documento.

À margem do seminário “Saúde e Género”, que decorre hoje em Lisboa, Lisa Vicente, chefe da Divisão de Saúde Reprodutiva, da Direção Geral de Saúde (DGS), adiantou que o protocolo de atuação médico – que se inspirou em documentos idênticos produzidos em países como “Austrália, Nova Zelândia, Inglaterra e França” – está já a ser analisado pelas sociedades médicas de Ginecologia e Obstetrícia, Pediatria, Medicina Interna e Psiquiatria, às quais cabe agora dar contributos para o documento, que serão discutidos numa reunião conjunta com a DGS marcada para o dia 12 de dezembro.

Lisa Vicente estima que o documento final – que vai estabelecer os procedimentos médicos para os casos existentes em Portugal de mulheres mutiladas e de meninas em risco de o serem – possa estar definido no início do próximo ano.

Esta discussão acontece oito anos depois de o primeiro estudo realizado em Portugal sobre mutilação genital feminina dirigido a profissionais de saúde ter revelado um grande desconhecimento médico sobre a prática, com 44 por cento dos inquiridos a admitirem que apenas “talvez” reconhecessem uma mutilação dos órgãos genitais femininos, prática corrente em três dezenas de países, sobretudo africanos.

A pesquisa, realizada em 2003 pela Associação para o Planeamento da Família (APF), indicava que, apesar de a quase totalidade dos médicos e enfermeiros questionados já ter ouvido falar da mutilação genital feminina, pouco mais de metade já tinha discutido o tema, quer com colegas, quer com familiares ou amigos.

Ao mesmo tempo, os inquiridos admitiam ter tomado conhecimento do fenómeno sobretudo através da comunicação social, e não em ações de formação específicas, e 98 por cento reconheciam mesmo não saber enquadrar legalmente a mutilação genital feminina: ou seja, desconheciam que a prática é, de acordo com o Código Penal português, uma ofensa grave contra a integridade física.

No mesmo inquérito, a maioria dos profissionais de saúde inquiridos defendia a adoção de um protocolo de atuação a ser aplicado nos casos de mutilação genital feminina e 91 por cento concordavam com a necessidade de sinalizar a prática junto das autoridades competentes.

Lisa Vicente adiantou hoje à Lusa que ainda não estão definidos os termos em que esta sinalização será feita, sendo este um dos temas em discussão entre os profissionais de saúde, pois põe em confronto a proteção e posterior acompanhamento das pacientes e a confidencialidade dos dados.

21 de novembro de 2011

@Lusa