“Temos uma investigação de qualidade, mas estamos sem futuro à vista. Não sabemos quando vão abrir concursos, com que montantes. Isto é verdade para a saúde e para outras áreas. O impacto da saúde é que é um pouco maior porque tem uma relação direta com a qualidade da medicina que é exercida no país”, disse a investigadora.

Leonor David falava à Lusa no início do Congresso Internacional da ASPIC, que decorre até quarta-feira, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, com a participação de cerca de 250 investigadores e clínicos.

A responsável pelo encontro considerou que “os investigadores não podem aceitar como razoável que venhamos daqui a dois anos a ter apenas dois ou três grupos que tenham conseguido financiamento para trabalhar. Vamos ter que ter confiança para dizer que não vai ser assim. Vamos ter que arranjar formas de se poder financiar e continuar a trabalhar com a qualidade que temos, que é excecional”.

Leonor David disse acreditar que “os grupos melhores terão capacidade de concorrer a financiamento europeu, mas é necessário encontrar outras formas de financiamento. É preciso encontrar na sociedade o suporte para que o país compreenda que não pode deixar de investir nesta área”.

A dirigente da ASPIC salientou “a qualidade e o entusiasmo dos investigadores portugueses desta área”, considerando tratar-se de “uma mensagem de confiança no futuro, apesar das circunstâncias dramáticas que vivemos”.

De acordo com Leonor David, “o último concurso realizou-se em 2012 e foi um financiamento de seis projetos com um milhão de euros. Em 2013, tivemos um financiamento de 140 mil euros, para três projetos pequeninos. Neste momento, não sabemos quando é que vai haver concursos, quanto dinheiro é que vai haver, não sabemos nada. A nossa capacidade de programar o futuro é extremamente reduzida e estamos muito preocupados”.

De qualquer maneira, a participação dos investigadores portugueses neste encontro “está a ser maciça, a qualidade dos trabalhos é enorme e eu acredito que vamos chegar ao fim deste congresso com a força suficiente para contra tudo e contra todos continuarmos a fazer uma investigação de qualidade”, referiu.

No primeiro congresso internacional da Associação Portuguesa de Investigação em Cancro, que foi oficialmente criada em fevereiro de 2013, participam investigadores oriundos de Espanha, Israel, Reino Unido e Portugal, entre outros.

Nas sessões científicas serão apresentadas novas abordagens de investigação, as últimas novidades sobre o diagnóstico precoce de cancro, os genes do cancro e o que já aprendemos com eles e ainda mecanismos e implicações da diversidade de cada tumor.

Leonor David realçou a presença do investigador português Samuel Aparício, que apresentará os resultados da sequenciação de tumores sólidos e implicações terapêuticas mais recentes, e de Moshe Oren, que apresentará resultados inovadores sobre um dos genes mais importantes em cancro humano.

Samuel Aparício é doutorado em Genética do Desenvolvimento pela Universidade de Cambridge (Reino Unido, 1995) e dirige o programa de Oncologia Molecular e Cancro da Mama da British Columbia Cancer Research Center, em Vancouver, no Canadá desde 2005. Foi como líder de uma equipa de investigadores deste centro que descodificou pela primeira vez, em 2009, a evolução genética de um cancro da mama.

Moshe Oren nasceu na Polónia em 1948 e trabalha atualmente no Instituto Weizmann, em Israel. Grande parte do seu trabalho é centrado no gene p53, um gene considerado “guardião do genoma”, mas que, quando mutado, perde essa função de proteção. Sabe-se que é um fator importante na formação de mais de 50 por cento de todos os cancros humanos.

Este investigador foi também presidente da EACR - European Association for Cancer Research – e é defensor de uma política europeia de cancro e da necessidade de uma estratégia de coordenação a nível europeu.