António Alberto Rodrigues dirigia a Roche Colômbia quando lançou um programa de acompanhamento personalizado a doentes com cancro. O sucesso foi tanto que o projecto foi replicado para terras lusas, estando já em funcionamento em três hospitais e devendo ser alargado a mais quatro, ainda este ano.

Para o actual director geral da Roche Portugal, o “Tempo de Viver” materializa um novo paradigma que “coloca o doente no centro”, através de um serviço “humanizado” que melhora a sua qualidade de vida e a adesão à terapêutica, ao mesmo tempo que poupa recursos aos hospitais e ao próprio SNS.

O “Tempo de Viver” é um programa inovador em Portugal, criado pela Roche Farmacêutica,  com vista ao acompanhamento personalizado de doentes com cancro e seus familiares, desde o momento do diagnóstico até ao fim do tratamento.

Aumentar a qualidade de vida e a adesão à terapêutica e, simultaneamente, diminuir a fragilidade emocional inerente a quem passa por uma doença do foro oncológico são os grandes objectivos da iniciativa, que já está em funcionamento em alguns hospitais nacionais, como o São João e o IPO no Porto, ou o Divino Espírito Santo, nos Açores.

O programa apoiado pela Sociedade Portuguesa de Oncologia e desenvolvido através de equipas especializadas de enfermeiras e de outros profissionais de saúde de oncologia dos próprios hospitais onde funciona, “está em franco crescimento” e deverá, em breve, ser alargado a outras instituições hospitalares.

Numa primeira fase o “Tempo de viver” destina-se a doentes com cancro da mama e cancro do cólon, os dois tipos de cancro com maior incidência em Portugal, mas está já previsto o alargamento do programa para acompanhamento de doentes com leucemia e linfomas, segundo avançou, em entrevista ao VER, o director geral da Roche Farmacêutica em Portugal.

Para António Alberto Rodrigues, face ao “significativo número de doentes de cancro que não cumpre o tratamento que lhe é prescrito”, o envolvimento técnico e afectivo de profissionais de saúde especializados na área oncológica e que trabalham nos hospitais onde os doentes são tratados, permite “desmistificar a doença e ajudar a superar, com o maior sucesso possível, esta etapa na vida das pessoas”.

Como lhe surgiu a ideia de criar o Programa “Tempo de Viver”, a partir da sua experiência à frente da Roche Colômbia?
Embora o programa tenha sido desenvolvido e implementado na Colômbia, houve necessidade de, em Portugal, ser criado um programa de raiz, dadas as especificidades locais.

O objectivo do “Tempo de Viver” é proporcionar aos doentes com cancro e suas famílias um acompanhamento próximo, individualizado e especializado durante todas as etapas da doença. Na Roche a nossa visão posiciona os doentes no centro de tudo o que fazemos. Este é, sem dúvida, um programa que materializa essa visão.

Há cerca de três anos, quando assumi as funções de director geral em Portugal e fruto do enorme sucesso que o programa tinha alcançado junto dos doentes na Colômbia, procurei avaliar a viabilidade da implementação do mesmo no nosso país.

No ano passado tudo se conjugou para que iniciássemos este projecto em Portugal, com o Hospital Divino Espírito Santo, nos Açores, e o Hospital de São João, no Porto, que foram os pioneiros. De então para cá já foi possível alargar o projecto ao IPO do Porto.

Quais foram os benefícios visíveis da implementação deste projecto que levaram a que fosse replicado em Portugal?

São de vária ordem. De um ponto de vista emocional, os doentes e as suas famílias sentem-se mais tranquilos, mais seguros. Sabem que têm à sua disposição um conjunto de profissionais de saúde, que conhece o seu quadro clínico, que está disponível, pessoalmente ou através de contacto telefónico, para responder a qualquer questão ou dúvida que lhes surja.

A ansiedade diminui consideravelmente. Este programa também é muito importante do ponto de vista de cumprimento dos tratamentos. O simples facto de os doentes poderem esclarecer uma dúvida, relativamente a um sintoma ou efeito secundário que vivenciaram, pode fazer toda a diferença relativamente à manutenção ou abandono do tratamento.

Existe um número significativo de doentes que não cumpre o tratamento que lhe é prescrito pelo médico, por diferentes motivos: falta de motivação e falta de informação são dois deles. Esta situação tem, não só, consequências negativas nos resultados do tratamento, como também obriga à administração de mais medicamentos, em consequência do agravamento da doença pelo incumprimento da prescrição, o que acarreta um aumento de custos no tratamento dos doentes.

“Existem, em torno desta doença, diversos “fantasmas” e muitos mitos. A informação correcta é, sem dúvida, uma importante arma na luta contra o cancro” 
 

Porque se associaram, numa primeira fase, ao Hospital de São João, ao Divino Espírito Santo e ao IPO do Porto?
Eu diria que houve uma conjugação de diversos factores. Não traçámos propriamente uma “estratégia” de implementação do “Tempo de Viver”. O projecto tomou forma de uma maneira muito natural.

Através de conversas informais que fui tendo com alguns responsáveis de diversos hospitais apercebi-me do interesse que lhes despertava o programa. Rapidamente constatei que fazia todo o sentido o seu desenvolvimento em Portugal, no âmbito da política de responsabilidade da Roche.

Estabelecemos as parcerias com estes hospitais e a receptividade por parte dos profissionais de saúde e dos doentes tem sido muito positiva.

Quais são as perspectivas de alargar o programa a outros hospitais, nomeadamente ao IPO de Lisboa?
Neste momento existem já conversações com vários hospitais, como é o caso do Hospital de Santa Maria, do IPO de Lisboa, do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental e do Hospital de Évora, entre outros.

O processo de implementação é variável e depende de hospital para hospital. O nosso objectivo é de que, ainda este ano, possamos ter doentes, em pelo menos mais três a quatro hospitais a beneficiar deste Programa.

Em que medida contribui este programa de acompanhamento personalizado para a qualidade de vida dos doentes, para a adesão à terapêutica e para atenuar a fragilidade de quem sofre de uma doença oncológica?
De uma forma geral, este programa poderá aumentar a qualidade de vida dos doentes, por exemplo, através de uma diminuição das deslocações ao hospital. Se o doente tiver necessidade de esclarecer uma dúvida e o fizer através de um simples telefonema, estaremos a evitar uma deslocação ao hospital.

Também na motivação à terapêutica este programa pode desempenhar um papel importante, já que ajuda na compreensão e esclarecimento de sintomas ou efeitos secundários de determinados tratamentos. O simples facto dos doentes saberem que determinado sintoma ou efeito adverso é comum poderá tranquilizá-los e motivá-los na continuação do tratamento.

Os profissionais de saúde envolvidos no “Tempo de Viver” são todos especializados na área oncológica e trabalham nos respectivos hospitais onde os doentes são tratados. São, por isso, profissionais que têm uma grande experiência e conhecimento para lidar com os doentes oncológicos.

Sem dúvida que, para além de indicações técnicas, os doentes têm nos interlocutores do programa profissionais sensíveis e capazes de encaminhar, apoiar e ajudar.

E de que modo contribui o programa para a racionalização de recursos e humanização das instituições de saúde, bem como, indirectamente, para a redução de custos no Serviço Nacional de Saúde com os doentes oncológicos?
Este é um Programa que procura ser uma nova forma de abordagem, um novo paradigma no tratamento do doente com cancro. Materializa aquilo que é o novo modelo preconizado pela Roche, o “Personalized Health Care”, que defende o tratamento à medida de cada doente.

Acreditamos que com este tipo de iniciativas, que colocam o doente no centro, os hospitais estarão a proporcionar um melhor serviço aos seus doentes, individualizado, mas também a racionalizar alguns recursos, nomeadamente: menos deslocações ao hospital; menores custos no tratamento de efeitos secundários, dada a maior probabilidade de serem detectados mais precocemente na sua evolução; melhor gestão de tempo dos profissionais de saúde com uma triagem dos casos mais efectiva; e aumento da adesão aos tratamentos prescritos.

O não cumprimento do tratamento estabelecido é mais frequente do que se julga. Existe um número significativo de doentes que não cumpre o tratamento que lhe é prescrito pelo médico, por diferentes motivos, como referi. Esta situação, repito, tem consequências negativas nos resultados do tratamento e acarreta, indirectamente, um aumento de custos no tratamento dos doentes.

Como articulam os vários canais de atendimento – apoio presencial e especializado por equipas de enfermeiras e outros profissionais de saúde e apoio telefónico – para prestar auxílio técnico e, ao mesmo tempo, contribuir para a humanização do doente oncológico?

A equipa de enfermagem estabelece a ligação com os profissionais das restantes valências necessárias ao acompanhamento dos doentes, que poderão ser, dependendo dos casos, a psicóloga, a assistente social ou a nutricionista, entre outros, de acordo com as competências instaladas em cada um dos hospitais.

O número de contacto e o horário de atendimento é variável e depende das indicações e particularidades de cada hospital e serviço. É importante referir que o programa “Tempo de Viver” funciona em dois sentidos, isto é, existe um conjunto de chamadas telefónicas, planeadas pela equipa, que são feitas pelas enfermeiras de forma pró activa.

Existe este acompanhamento que é fundamental e que é muito valorizado pelos doentes. Normalmente as pessoas não estão à espera que alguém lhes ligue do hospital, uns dias depois da consulta ou do tratamento, a perguntar se estão bem, se têm alguma dúvida…

Porque é fundamental desenvolver o programa desde o momento do diagnóstico até ao fim do tratamento para garantir um acompanhamento de proximidade?
O que se pretende é que exista um acompanhamento continuado durante todo o tratamento, existindo casos em que serão contactados também os doentes que finalizaram os tratamentos. Pretende-se desta forma manter um contacto próximo entre os profissionais de saúde do hospital e os doentes, dependendo dos objectivos de cada instituição hospitalar.

O programa “Tempo de Viver” resulta de um acordo de parceria efectuado com os hospitais. Todos os procedimentos que envolvem a implementação do programa são aprovados pelos responsáveis e adaptados, de forma a responderem às necessidades particulares identificadas pelos hospitais.

Porque é que resolveram dedicar, numa primeira fase, este programa aos doentes com cancro de mama e cancro do cólon? A que outros tipos de cancro deverão dedicar, mais tarde, a iniciativa?
Estes são os tipos de cancro com maior incidência em Portugal. Está previsto o alargamento do programa para acompanhamento de doentes com outros tipos de cancro, nomeadamente na área da hematologia (leucemia e linfomas).

O que visa a abordagem do projecto através de material didáctico que informa e sensibiliza não só sobre os aspectos técnicos da doença mas também sobre os problemas “psicológicos” a ela associados?
A Roche, enquanto empresa líder na oncologia e a que mais investiga nesta área, está consciente de que tem um papel social importante a desempenhar. O programa “Tempo de Viver” representa, sem dúvida, este compromisso para com a sociedade, em geral, e para com os doentes, em particular.

O programa pretende encarar o doente como um todo. O objectivo é colocarmo-nos no lugar do doente e perceber quais as suas dúvidas, anseios, preocupações, medos… e de que forma podemos minimizá-los. Sabemos que existem, em torno desta doença, diversos “fantasmas” e muitos mitos.

A informação correcta é, sem dúvida, uma importante arma na luta contra esta doença. O que ambicionamos fazer é ajudar o doente. Desmistificar algumas ideias e ajudar a superar, com o maior sucesso possível, esta etapa na vida das pessoas.

Gabriela Costa

07 de abril de 2011

Portal VER: http://www.ver.pt/conteudos/verArtigo.aspx?id=1166&a=Entrevistas