18 de outubro de 2013 - 00h55

O número de pessoas em unidades de tratamento de dependentes está a aumentar, com o recrudescimento do consumo de heroína, o aparecimento de novas drogas altamente aditivas, como o “crack”, e o aumento do consumo de álcool, como anti-depressivo.

A revelação foi feita hoje pelo presidente do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD), João Goulão, durante a apresentação do relatório do “Movimento Clínico IDT 2001 – 2012”, em Lisboa.

“Temos um aumento da população em acompanhamento nas unidades dedicadas ao tratamento de dependentes. É uma população constituída por três componentes: pessoas com problemas ligados ao álcool, ao uso de substâncias ilícitas e outro tipo de população que recorre aos nossos serviços - sejam pais que procuram orientação para lidar com problemas em casa, sejam jovens referenciados pelas comissões de proteção de crianças e jovens em risco”, afirmou.

Segundo o responsável, estas componentes têm pesos equivalentes no total - um terço, cada uma delas.

Em 2012, entraram no serviço 1872 novos utentes com problemas relacionados com o álcool, 1979, com problemas ligados a drogas, e 1817, com outros problemas, valores que têm vindo a crescer desde 2002.

Crescimento exponencial do número de casos

Os dados mais recentes, relativos a setembro de 2013, indicam que entraram, neste ano, 1367 por causa do álcool, 1503 devido a drogas e 1511, por outros motivos.

O aumento do número de pessoas que recorre aos serviços indicia, por um lado, uma maior acessibilidade e disponibilidade dos serviços e, por outro, um eventual aumento da prevalência desses problemas na sociedade portuguesa, explicou João Goulão, embora esclarecendo não ser possível afirmar com segurança qual o peso relativo de cada uma dessas componentes.

Embora esta evolução dos números não possa ser diretamente atribuída à crise, o presidente do SICAD reconhece que há “outros fenómenos relacionados com a crise, nomeadamente as recaídas e as readmissões de pessoas com passado de uso de heroína, e que se estão a aproximar dos serviços”.

“Essa, do nosso ponto de vista, é uma consequência mais legítima de correlacionar com a questão da crise do que propriamente os números globais”, afirmou.

Segundo o relatório, em 2012 procuraram os serviços 4700 pessoas por
risco de recaída, 3897 só relacionadas com drogas (mais 1883 do que em
2011).

Entre estes casos de readmissão por causa de drogas, a
heroína está no topo, com uma procura por parte de 2418 pessoas em 2012
(mais 1066 do que em 2011).

No entanto, em setembro deste ano,
apenas 906 pessoas foram readmitidas, uma descida acentuada que os
responsáveis ainda não sabem explicar.

Quanto ao número de
“utentes ativos” nas unidades de tratamento, em 2012 eram, no total,
37.128, sendo 29.064 só devido a substâncias ilícitas.

Discriminando
por tipo de droga, o relatório revela que havia nesse ano 18.153
consumidores de heroína ativos nos serviços, ainda assim um número que
não se compara aos 100 mil consumidores que se estima terem existido em
Portugal em 1995, sublinha João Goulão.

“A heroína foi o inimigo
público número um em Portugal, que devastou gerações. Há algum risco de
recrudescimento, sobretudo à custa de antigos consumidores que estavam
parados e que aparecem recaídos”, disse.

No entanto, a
preocupação do SICAD recai agora também sobre novas “substâncias
emergentes”, nomeadamente o “crack”, e o consumo excessivo do álcool,
“usado um pouco como um antidepressivo, calmante, alguma coisa que
funciona como um amortecedor do sofrimento”.

Sobre o “crack”, o
responsável salientou que é uma droga que está a “aparecer no nosso
mercado, na nossa sociedade” e que é um sucedâneo da cocaína,
tradicionalmente uma droga relacionada com ambientes festivos e com uma
sociedade com poder aquisitivo mais elevado.

“Estes são
sucedâneos mais baratos, a pasta base e o crack, altamente geradores de
adição, altamente geradores de degradação e com efeitos comparáveis à
heroína, nos contextos de outros tempos, que todos nos lembramos de ver
em Portugal”, frisou.

Não sendo ainda um fenómeno com grande peso
na sociedade portuguesa, João Goulão assinala que é um fenómeno
emergente e que concentra as preocupações do SICAD, na procura de
“mecanismos eficazes para o contrariar”.

Lusa