A convicção é de João Porto, internista do CHUC e presidente do III Congresso Nacional da Urgência, que se realiza no sábado e no domingo em Coimbra, tendo como um dos temas de destaque “O burnout associado à urgência”.

O médico disse à agência Lusa que, à semelhança do que acontece em Coimbra, “a maior parte dos serviços de urgência do país tem um volume de doentes muito maior do que deveria para a sua capacidade de resposta”.

“Por exemplo, o nosso serviço de urgência está dimensionado para receber entre 250 a 300 doentes por dia e recebe uma média de 450 a 470. No inverno, chega a ultrapassar os 600 doentes, nos dias piores”, referiu, acrescentando que, na zona de Lisboa, há situações ainda mais graves.

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Na sua opinião, esta situação “rebenta com tudo, causa um excesso de volume de trabalho nos profissionais de saúde, particularmente nos médicos, e leva a situações de ‘burnout’”.

João Porto explicou que isso leva à procura “de especialidades que não tenham urgências” e a que os profissionais que trabalham nestes serviços tentem abandoná-los.

“Principalmente nas especialidades que fazem muitas urgências, como é o caso da Medicina Interna, assim que atingem a idade em que podem deixar de fazer noite ou de fazer urgência deixam de fazer”, contou.

O médico referiu que, “de há uns anos a esta parte, tentaram criar-se equipas fixas de urgência, ou seja, quando acabavam a especialidade, os médicos, em vez de irem trabalhar para as enfermarias e para outros serviços, iam só para o serviço de urgência”.

“Isso aconteceu muito na Medicina Interna em vários hospitais, como o meu, e, de facto, houve muitos colegas que acabaram a especialidade e fizeram contratos para irem para a urgência. Terão sido mais de 15 que fizeram esses contratos e praticamente todos eles assim que puderam desistiram, porque encontraram outro tipo de alternativa profissional”, acrescentou.

Segundo João Porto, estes médicos “saíram desiludidos, exaustos e desanimados”, porque “não houve capacidade por parte do sistema de criar condições atrativas para que lá permanecessem”.

O médico explicou que, “como o número de doentes é muito elevado, o tempo de espera vai aumentar, ou seja, um doente que poderia resolver a sua situação em duas ou três horas demora cinco/seis/sete horas, porque há um maior número de exames a serem pedidos, os próprios atos de enfermagem também demoram mais tempo, e isso provoca desânimo” nos médicos, que veem que não conseguem “dar uma resposta em tempo útil, o que precipita o ‘burnout’”.

“O tempo passa, isto é um problema transversal a vários governos e nunca ninguém o conseguiu resolver. Eu também não conheço nenhuma cura milagrosa. Isto não tem a ver com a crise, nem com a ‘troika’, tem a ver com o próprio sistema de saúde estar em falência e não ter encontrado resposta para o facto de a população estar envelhecida e haver cada vez mais doentes crónicos”, considerou.

Este congresso, que vai na terceira edição, não tem como objetivo discutir a questão política, nem como resolver o número de urgências.

“Isso não é a nossa competência. O que nós temos é de criar condições para que quem trabalhe nas urgências esteja mais bem preparado e possa ganhar conhecimentos e competências para desempenhar melhor as suas funções”, frisou.