Os investigadores da Universidade de Trás-os-Montes e alto Douro (UTAD), em Vila Real, quiserem entender quais as maiores resistências a uma recuperação plena dos toxicodependentes.

“E aquilo com que nós nos deparámos é que o problema fundamental e que leva às recaídas é que os indivíduos após o tratamento regressam a situações de desespero social, não têm empregos e é fundamentalmente isso”, afirmou hoje à agência Lusa Vasconcelos Raposo, docente do departamento de Educação e Psicologia.

A investigação incidiu numa Comunidade Terapêutica (CT) e num Centro de Respostas Integradas (CRI) do Norte e recorreu à técnica de entrevista a pessoas com problemas de droga, com idades compreendidas entre os 25 e os 48 anos.

Segundo o estudo, para a recaída, os sujeitos os apresentam uma variedade de fatores e razões que atuam simultaneamente, sobressaindo a “inadequação social, desemprego, problemas financeiros, escolha de companhias, consumo de álcool, falta de controle de uso de substâncias psicoativas quando em tratamento de substituição, dificuldade em lidar com sentimentos e com adversidades e estados emocionais negativos”.

“Os serviços de saúde ao focarem o tratamento apenas nos aspetos médicos descuram os outros aspetos de caráter social e que são de primordial importância, nomeadamente aqueles que são os alicerces para uma boa integração social”, afirmou o investigador.

E entre esses fatores, Vasconcelos Raposo destacou o emprego. “Ter um sentido de valor pessoal que é dado por essa situação de estar empregado e também de ter um salário condigno”, acrescentou.

O responsável referiu que existe um estigma associado às pessoas que consomem o que, na sua opinião, dificulta que eles consigam arranjar emprego. Depois a isso acresce ainda “a falta de acompanhamento” e as “dificuldades em se sentirem socialmente integrados”.

Para a manutenção da recuperação e abstinência de uso de heroína, a investigação destaca a “pertença ao grupo de ajuda Narcóticos Anónimos, conjugada com mudanças comportamentais, alcance de um novo modo de vida, ocupação laboral e pós-laboral e existência de uma rede significativa de apoio social”.

Vasconcelos Raposo defendeu que é preciso reforçar o conhecimento nestes domínios porque o “crescimento do uso de drogas ilícitas ao longo dos tempos requere o ajustamento de intervenções e de planeamentos terapêuticos de forma a melhorar a sua eficácia”.

O investigador quer que este estudo sirva de “alerta” para que seja possível sensibilizar as autoridades políticas para o facto de que uma “política de emprego que não está verdadeiramente vocacionada para o cidadão dificulta e encarece até a recuperação destes indivíduos, porque se mantêm em tratamento por períodos mais longos”.

“Importa apostar cada vez mais em políticas que levem à criação de condições de vida que preservem a dignidade humana, em especial numa sociedade como a nossa em que as desigualdades sociais são cada vez maiores, e onde ter emprego se constitui como fator preponderante para se ter a estabilidade necessária à prevenção e à recuperação”, salientou.

Na sua opinião, as “atuais politicas de emprego servem mais o capital, ou seja, servem mais como uma desculpa para se oferecer salários baixos, do que propriamente para proporcionar os meios necessários aos cidadãos para poderem ter uma vida condigna”.

Este estudo originou um projeto de mestrado em Psicologia Clónica de Rui Silva Alves intitulado “Fatores influentes nos processos de abstinência e recaída: perceções de (ex)consumidores de heroína”.

Há cerca de 15 anos que a UTAD desenvolve investigação na área das toxicodependências e do álcool.