A crise financeira pode estar a aumentar os níveis de obesidade da população, sobretudo nos grupos mais desfavorecidos, afirma o coordenador da Plataforma contra a Obesidade, Pedro Graça. Este é o tema de uma reunião que hoje e amanhã congrega em Lisboa peritos europeus com o objectivo de criar uma rede que estude a relação entre desigualdades sociais e excesso de peso. A ligação entre pobreza e obesidade está identificada.

Vários estudos confirmam que, em grupos sociais com menos recursos, tende a haver mais pessoas obesas, nota Pedro Graça. As razões começam pelo preço dos alimentos. "Os mais calóricos e mais apelativos aos sentidos, pela quantidade de sal e açúcar envolvidos, tendem a ser mais baratos."

Em tempo de crise, quando se trata de diminuir gastos, "a alimentação é mais maleável": é mais fácil do que cortar na luz, o que pode levar a mudar hábitos alimentares, afirma Graça, professor na Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto. Além do preço, também o tempo é um factor premente: há cada vez mais pessoas que precisam de mais horas de trabalho para manter os rendimentos ou mesmo de um segundo emprego.

Resultado? "É natural, sobretudo no caso das mulheres, que haja menos tempo para comprar alimentos e os confeccionar, nomeadamente pratos mais demorados que incluam hortícolas, que obrigam a compras regulares". Assim, a tendência é que se adquiram cada vez mais refeições já confeccionadas, como alimentos com massa folhada, que só precisam de ser aquecidos, exemplifica.

No caso das leguminosas, "a tendência é que desapareçam, porque o tempo de confecção é grande". A própria atenção que a família dá ao tempo de refeição pode sair prejudicada, com "os adolescentes a comer sozinhos, comendo pior". A pobreza pode gerar obesidade, mas esta pode também manter situações de pobreza, num "ciclo vicioso", explica o nutricionista. Porque os obesos gastam mais em saúde, faltam mais ao trabalho e sofrem de discriminação na admissão a empregos.

Ainda não é possível medir efeitos na saúde da actual crise económica, talvez daqui a dois a três anos isso possa ser feito, nota Pedro Graça. Mas os peritos que estarão reunidos na Direcção-Geral de Saúde, à porta fechada, pretendem criar uma rede para perceber o que se passa no terreno e identificar boas práticas. Um exemplo é o Regime de Fruta Escolar, iniciado em Portugal em 2009, e que prevê a distribuição de fruta aos alunos do 1º ciclo duas vezes por semana. No primeiro ano de aplicação foram abrangidos 246.415 crianças.

17 de janeiro de 2011

Fonte: Público