Fazer os computadores “ver como humanos”, reconhecendo as relações entre os objetos que têm perante si e o seu uso, é o desafio de dois jovens cientistas portugueses nos Estados Unidos.

José Jerónimo Rodrigues e Ricardo Cabral seguiram para doutoramento na Universidade norte-americana de Carnegie Mellon depois de concluírem engenharia elétrica e computacional no Instituto Superior Técnico, respetivamente em 2008 e 2009, e estão agora a concluir estágios na Industrial Light & Magic e Qualcomm.

“A visão por computador deveria providenciar o que o humano perceciona quando está a ver”, afirma Rodrigues, que no Técnico ganhou o prémio pela melhor tese de mestrado do seu ano.

Trata-se, explica, de a máquina entender “o conteúdo de uma imagem, a relação entre os objetos, o modo de os usar e inferir modelos tridimensionais embora estejamos a ver só a duas dimensões”, indo além do reconhecimento de imagem, por exemplo que em determinada fotografia estão “dois sofás, uma mesa e uma televisão”.

As dificuldades, explica Ricardo Cabral, estão na “descrição de um problema de alto nível a um computador, cuja linguagem consiste em 'receitas', ou uma série de passos determinísticos", e também “o facto de nem sequer se saber muito bem como o ser humano processa o conhecimento ou extrai informação de alto nível do sistema visual”.

Os domínios de aplicação desta área vão desde sistemas de diagnóstico médico como a ecografia 3D, vídeo vigilância e segurança, carros autónomos, aplicações industriais e indústria cinematográfica ou tecnologias de assistência a idosos e deficientes, além do entretenimento, de que a consola XBox Kinect é exemplo.

“A ideia de fazer um computador pensar e ver – o Santo Graal da área da inteligência artificial e da visão por computador – continua a fascinar-me todos os dias, pela parte tecnológica e pelas suas profundas implicações em áreas como a neurociência, filosofia e ética”, diz Cabral.

Com o doutoramento a meio, ao abrigo do programa Carnegie Mellon University Portugal, os dois jovens cientistas pensam continuar a sua experiência em empresas norte-americanas.

“Não existe muito trabalho em Portugal nesta área, na indústria, que valorize muito o investigador. Se trabalhasse em Portugal as possibilidades seriam começar uma 'start-up' ou fazer investigação em universidades”, afirma Rodrigues.

“Algo que gostaria de ver mais em Portugal seriam empresas com tecnologia de ponta com contactos com as melhores pessoas da área das faculdades. Essa seria a empresa de sonho para eu trabalhar”, adianta o jovem investigador, que esteve nos últimos meses a estagiar na multinacional de telemóveis Qualcomm.

Sobre a sua experiência profissional diz-se “impressionado” com a “capacidade de a empresa fazer de cada indivíduo uma pessoa relevante” e a “capacidade de progressão”.

Ricardo Cabral afirma-se “surpreendido” pelo facto de a divisão da Lucasfilm em que estagiou conseguir, sem muitos trabalhadores, num ano apenas fazer os efeitos especiais de filmes como Avatar ou Harry Potter, e manter "o ambiente de uma família alargada" com "espírito de entreajuda e de abertura e partilha de conhecimentos”.

O seu objetivo imediato, afirma, é “deixar o máximo de portas abertas e tentar fazer outros estágios para perceber como funciona a indústria”.

“Nesta área [visão por computador], embora estejamos a assistir a um crescimento notável em Portugal, com várias PMEs – Observit, Idmind, por exemplo – e universidades, pessoalmente tento manter uma visão internacional em termos das oportunidades disponíveis, principalmente nos EUA, Europa e Ásia”, afirma.

29 de agosto de 2011

Fonte: Lusa