Durante as últimas décadas verificou-se uma valorização da saúde relacionada com a dieta e, em resultado desta tendência, muitos alimentos e bebidas, com grande divulgação, ficaram em apreciação, incluindo o café. Mais de 37 000 documentos técnicos sobre o café foram publicados em mais de 5000 revistas médicas nos últimos 30 anos.

A cafeína é um estimulante suave do sistema nervoso central e, em consequência, capaz de influenciar o comportamento humano, nomeadamente melhorando o estado de alerta. Esta é provavelmente a acção responsável pela popularidade e divulgação universal do café.

Ultimamente têm sido publicados na literatura médica diversos artigos atribuindo-lhe acções benéficas em diversas áreas, nomeadamente na prevenção da diabetes, da doença de Parkinson, da demência e das hepatopatias.

Como endocrinologista, interessa-me particularmente a diabetes e o conhecimento de que o consumo crónico e moderado de café, a partir de duas chávenas por dia, tem efeito benéfico em todos os estádios de desenvolvimento da doença, nomeadamente na alteração da glicemia em jejum, na alteração da tolerância à glicose e na diabetes tipo 2.

A acção benéfica do café é devida ao aumento da sensibilidade à insulina e à melhoria da função das células ?, existindo outras acções possíveis, nomeadamente, inibição da hidrólise hepática da G-6-P, diminuição da absorção intestinal da glicose, interferência no metabolismo das incretinas intestinais e a libertação de catecolaminas com subsequente aumento do metabolismo e da termogénese do tecido adiposo castanho.

Estes benefícios verificam-se em diversas populações, parecendo ser independentes de outros factores de risco, da dieta, do estilo de vida, e ocorrem com o uso de variadas modalidades de preparação do café, nomeadamente com o café instantâneo. Esta não pode deixar de ser uma excelente informação para todos os consumidores habituais desta bebida.

Café e diabetes

O café constitui um dos componentes da alimentação mais ingeridos no mundo inteiro, sendo a substância farmacologicamente activa mais utilizada universalmente. A cafeína - a substância activa do café - pertence ao grupo das metilxantinas. O café é uma complexa mistura de milhares de componentes químicos, incluindo carboidratos, compostos nitrogenados, lípidos, minerais, vitaminas, alcalóides e compostos fenólicos.

Devido ao seu consumo generalizado, o café encontra?se na primeira linha das preocupações do sistema de saúde e dos consumidores, assim como das instituições reguladoras dos produtos alimentares.

O Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência (CEMBE) emitiu um relatório com conclusões científicas para responder à pergunta: "O café pode reduzir o risco da diabetes tipo 2?" O CEMBE identificou estudos científicos que analisaram esta associação entre consumo de café e o desenvolvimento de uma determinada doença, neste caso a diabetes tipo 2.

Para esta análise, foram incluídos 20 estudos tendo em conta um conjunto de requisitos definidos pelo CEMBE e que garantem a fiabilidade científica da informação. Entre eles, salientamos o estudo prospectivo de coorte (o European Prospective Investigation into Cancer and Nutrition [EPIC]?Potsdam Study), que contou com a participação de 9729 homens e de 15 438 mulheres com idades compreendidas entre os 35?65 anos. Neste estudo, a ingestão de café revelou?se protectora da incidência de DM 2, com uma redução do risco relativo e um score de ?4 (com ingestão de 150 g/dia de cafeína).

O café constitui uma complexa mistura de produtos químicos fisiologicamente activos, cuja composição depende (pelo menos em parte) de factores agrícolas, de manufactura (torrefacção), de mistura e de modo de confecção (filtragem, fervura, etc.).

O relatório do CEMBE contempla 20 trabalhos científicos que estudam a associação entre o café e a DM 2, e podemos dizer que são consistentes e importantes, porque seguem um padrão dose?dependente. Estes estudos mantêm-se em doentes obesos e sedentários, com ingestão ou não de álcool, em novos e velhos, mulheres e homens (ainda que de modo variável).

Por outro lado, verificam?se em diversas populações (europeias, norte-americanas e asiáticas) e parecem ser independentes de outros factores de risco conhecidos da dieta e estilos de vida. Importa ainda dizer que estão presentes em todas as modalidades de confecção, incluindo o café instantâneo.

Tendo em conta a revisão sistematizada da literatura feita pelo CEMBE, pode concluir-se que "a ingestão crónica de café reduz o risco da diabetes tipo 2".

09 de Dezembro de 2010

Fonte: SAPOMédicos de Portugal