Aos 41 anos, Pedro Castro é uma nova pessoa. Corre maratonas, já participou no Ironman, mas o seu maior troféu é a ajuda ao próximo. «Em criança, perto dos seis anos, fui para a natação porque sofria de bronquite asmática. Como treinava todos os dias, melhorei capacidades enquanto nadador e acabei por me tornar federado pela Associação dos Bombeiros Voluntários dos Estoris. A corrida surge de forma intrínseca à natação pois, no inicio de cada época, a preparação física e a resistência muscular tinham como base essa atividade», recorda.

Pedro Castro não esquece esses tempos. «Esses treinos pela Avenida Marginal, que liga Lisboa a Cascais, ficaram gravados na minha memória. Apenas sentia a liberdade plena enquanto corria. Mais tarde, com os Jogos Olímpicos de Barcelona de 1992 no pensamento, ingressei no [Sport] Algés e Dafundo, dei o meu máximo, mas ficaria a quatro segundos do sonho olímpico», desabafa com alguma tristeza o diretor financeiro no livro «Vontade de Ferro», publicado pela editora Lua de Papel.

98 quilos aos 36 anos

A vontade de um futuro mais tradicional obrigou Pedro Castro a tomar uma decisão mais drástica. «Desisti da natação e dei prioridade aos estudos universitários», assume. «Quase sem dar por isso, construi um percurso profissional sólido e passaram 20 anos. Deixei de praticar desporto e abracei uma vida mais sedentária, focada no trabalho e na família. Ainda que a asma tivesse sido ultrapassada, perdi saúde e ganhei quilos», recorda.

«Aos 36 anos, tinha 98 quilos. Tornei-me uma pessoa cansada e o alerta chegou quando, depois de um dia fazer um percurso de 300 metros para chegar ao trabalho num ritmo mais acelerado, senti um nível de exaustão assustador. Decidi que tinha de mudar de vida, tinha de voltar a correr. Por vezes, precisamos de um clique. Percebi que para ver as minhas filhas crescer e trabalhar precisava de saúde e repensei tudo. Senti que tinha ultrapassado o limite e tinha de agir», admite.

A necessidade de mudar de vida

Nessa altura, a decisão de voltar a fazer desporto levou-o a correr no Parque Florestal de Monsanto, «ainda que sem grandes regras ou metodologias, com ténis pouco apropriados e sem acompanhamento», refere. Esse compromisso fê-lo ganhar consistência e viver novamente. «O importante era mudar e, para correr, só precisamos de um par de ténis. Depois, é colher os frutos da atividade», assegura.

Mas seria com o amigo Vítor Cabrita, que tinha concluído diversas maratonas, que ganhou alguma disciplina. «Comecei a descobrir trilhos diferentes todos os domingos e, durante muitos meses, fui redescobrindo a paixão e os benefícios da corrida, sabendo que tinha uma grande luta pela frente, com dores musculares, desconforto, cansaço. Queria perder peso, fazer manutenção e interiorizei também que tinha de ter melhores hábitos alimentares. Gradualmente, senti melhorias, força, e tornei-me ambicioso. Queria mais e o sonho da maratona foi ganhando asas», diz.

De Lisboa a Nova Iorque

Em março de 2011, fez a primeira meia-maratona. «Foi uma experiência de múltiplos sentimentos», confessa Pedro Castro. «Senti uma angústia tremenda entre o quilómetro 15 e o 18. Interrogava-me o que estava ali a fazer? O meu corpo queria parar, a cabeça decidiu continuar e chegar à meta. Nesse dia, defini um caminho. Procurei um treinador, consultei uma nutricionista, comecei a pensar nos objetivos de forma mais sustentada e defini a maratona de Nova Iorque como a grande meta», conta.

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Os ciclos de treino de preparação seguidos pelo maratonista

A preparação para essa prova consistiu em dois ciclos de treino. «Numa primeira fase, procurei informação em revistas da especialidade, sobretudo na internet. E, até 2012, o meu treino foi baseado em ferramentas online. Para manter a dinâmica, sacrifiquei o sono pois estruturei a vida de forma a treinar de manhã cedo, durante a semana, na Cidade Universitária. Ao fim de semana, fazia treinos mais complexos», revela.

Esses decorriam geralmente aos sábados de manhã, na companhia das minhas filhas, que treinavam triatlo no Clube Olímpico de Oeiras, no Jamor. «Aos domingos, fazia duas ou mais horas de corrida. Entretanto, consegui inscrever-me na maratona de Nova Iorque de 2012 e sentia-me preparadíssimo. Mas, ao chegar aos EUA, para fazer a corrida da minha vida, tinha-se abatido um furacão sobre a costa este do país e a corrida foi cancelada», lamenta.

«É então que conheço um grupo de atletas que participavam na maratona por causas sociais e que se juntaram à hora da suposta partida para dar quatro voltas ao Central Park, fazendo jus ao lema que defende que quem corre por uma causa, corre de qualquer maneira. Fui sem expetativas mas, quando vi 20 mil pessoas a correr por aquilo em que acreditam, fiquei definitivamente marcado  e emocionado. Foi um momento de verdade, um ato de fé», considera.

A fundação da Run with Castro

A sensação fê-lo tomar uma decisão. «O impacto foi tão forte que decidi que, quando regressasse a Portugal, além de continuar a sonhar com a maratona, fá-la-ia sob um enquadramento solidário.  É assim que fundo, em dezembro de 2012, a Run With Castro (link www. facebook. com/runwithcastro), aquando da edição da maratona de Lisboa. Algumas pessoas juntaram-se à ideia e acabei a correr, lado a lado, com 26 amigos», recorda.

O objetivo era ajudar a Fundação O Século, nomeadamente crianças que viviam nos lares de acolhimento da instituição. «A partir daí, passei a atuar em duas frentes. Mudei a metodologia de treino com o treinador Nuno Barradas e participei em diversas maratonas, nunca esquecendo as causas humanitárias. Ajudei um ATL da Galiza em Cascais, a Comunidade Vida e Paz e a Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla, entre outras instituições», afirma ainda.

A participação mais emblemática aconteceu, no entanto, no Ironman de 2014, na Áustria. «Consegui reunir apoios que possibilitaram levar 13 crianças da Acreditar à Disneyland Paris. São estes desafios que me motivam, que me levaram a acreditar mais em mim. Estas experiências desenvolvem um sentimento de gratidão que não consigo descrever. E prometo não parar por aqui. Acredito que correr é muito mais do que cruzar a meta e hoje, aos 41 anos, sinto que recuperei a vida, a saúde, e nada melhor do que fazê-lo a ajudar o próximo. Sem dúvida o maior troféu que conquistei enquanto atleta e pessoa», diz.

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Lidar com a adversidade

Treinar para uma maratona é um exercício exigente a nível físico e psicológico. «Encaixar treinos numa vida familiar preenchida e numa atividade profissional exige sacrifícios e uma capacidade de compromisso muito além do que julgamos possível. Como em tudo na vida, é importante aprender a lidar com imprevistos ou imperativos que impedem de concluir o objetivo», refere Pedro Castro.

«Nesses casos, e para limitar danos, é importante ter em mente dois aspetos fundamentais, a redefinição do objetivo e a valorização da viagem. É fundamental seguir metas realistas para evitar sentimentos de frustração e incapacidade, mas a valorização da viagem, o percurso percorrido, é aquilo que verdadeiramente nos molda e nos valoriza», acredita.

Os três conselhos do treinador de Pedro Castro:

1. Não esquecer a atividade física

«Devemos encontrar um mínimo de atividade que impeça a paragem total do treino. Encontrar um ginásio perto do trabalho ou da escola dos filhos, correr de manhã cedo duas a três vezes por semana ou nadar duas vezes por semana podem ser a solução», considera Pedro Castro.

2. Dicas para corredores iniciados

«Ao dar os primeiros passos na corrida, recomenda-se um bom par de ténis, adequados ao corredor e ao piso, assim como malhas técnicas com a respirabilidade certa, tendo em conta o esforço de corrida», acrescenta o maratonista.

3. Manter objetivos

«Uma prova de dez quilómetros, de seis em seis meses, pode ser suficiente para manter a motivação de um praticante amador e evitar que desista do seu programa de treino, por muito reduzido que este seja», afirma ainda Pedro Castro.

Os três objetivos graduais que deve estabelecer na corrida como na vida:

1. Abordar cada quilómetro com a consciência de que estamos preparados para qualquer eventualidade.

2. Enfrentar os imprevistos com calma e naturalidade.

3. Estar preparado para fazer adaptações ao plano da prova.

Texto: Carlos Eugénio Augusto com Artur (fotografia)