Foram muitos anos dedicados aquela que é considerada, por muitas fashionistas, a bíblia da moda: a Vogue. Após dedicar 36 anos da sua vida à publicação, sendo que 25 foram como diretora de moda, em maio Lucinda Chambers foi despedida por Edward Enninful que tinha sido escolhido para assumir as funções de editor-in-chief da edição britânica da Vogue.

Numa longa entrevista à publicação Vestoj, Lucinda Chambers fala abertamente sobre o seu despedimento e expõe o lado menos bonito e glamouroso do mundo da moda. “A moda pode usar-te e deitar-te fora”, começa por afirmar sobre esta indústria, explicando que para além de não apoiar convenientemente os seus funcionários e criativos, exerce uma grande pressão sobre eles, trazendo ao de cima as suas inseguranças, o que, em diversos casos, pode conduzir ao fracasso.

“Não te é permitido falhar no mundo da moda – especialmente na era das redes sociais, onde o principal é que leves uma vida bem-sucedida e incrível. Ninguém pode falhar, a hipótese causa ansiedade e terror. Mas por que razão não podemos celebrar o fracasso? Apesar de tudo, ajuda-nos a crescer e a evoluir. Não tenho vergonha daquilo que me aconteceu”, afirma.

Outra das críticas feitas pela ex-diretora de moda centra-se no facto de este ser um mundo de aparências onde parece prevalecer o lema: "és aquilo que transpareces ser". Chambers recorda um dos momentos da sua carreira: o período em que esteve de licença de maternidade e foi substituída por uma editora de moda inexperiente e pouco profissional mas que, devido à sua aparência, bom gosto e segurança, conseguiu o lugar. “Ela era uma stylist terrível. Simplesmente terrível. Mas no mundo da moda vais longe se te vestires de forma fantástica e fores confiante.”

A pressão que as empresas colocam nos designers para produzirem coleções atrás de coleções é outro dos temas abordados na entrevista. “Estes designers vão ter problemas com o álcool, com drogas. Vão ter um esgotamento nervoso. É louco pedir a um designer para criar oito, ou em alguns casos, 16 coleções por ano. Eles cumprem o pedido, mas o resultado é mau e depois são convidados a sair”, refere.

Lucinda Chambers, que admite não ler a Vogue há anos, apesar de ter trabalhado na mesma até maio de 2017, termina a entrevista a tecer duras críticas às revistas de moda, que em vez de fazerem com que o leitor se sinta empoderado acabam por deixá-lo cheio de dúvidas e preocupações face ao estilo de vida que leva.

“As roupas são irrelevantes para a maior parte das pessoas – ridículas de tão caras que são. Nos dias que correm aquilo que as revistas querem são os exclusivos. É uma pena que as revistas tenham perdido a autoridade que tinham no passado. Deixaram de ser úteis. No mundo da moda estamos sempre a tentar fazer com que as pessoas comprem coisas que não precisam. Não precisamos de mais malas, camisas ou sapatos. E nós persuadimos, intimidamos ou encorajamos as pessoas a continuar a comprar. Eu sei que as revistas devem ser aspiracionais, mas por que não devem ser úteis e aspiracionais? É esse o tipo de revista que eu gostava de ver.”

É de salientar que a entrevista original de Lucinda Chambers, publicada no site da revista no dia 3 de julho, causou tanta polémica que a Vestoj se viu obrigada a retirá-la do ar nessa mesma tarde e republicá-la com a seguinte nota: "No seguimento da publicação original deste artigo, fomos contactados pelos advogados da Condé Nast Limited e de Edward Enninful OBE e foi-nos pedido que fizéssemos alterações à entrevista. O pedido foi aceite."

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