Há dias, uma conhecida confidenciou-me que apenas não se separa do marido porque não quer perder o conceito de família que proporciona, há cinco anos, à sua única filha. E, enquanto ela me relatava a miséria emocional em que se sente viver, eu dei por mim a pensar: fará sentido hipotecar a nossa vida em prol de conceitos que se revelam verdadeiras utopias?

Não se pense que não entendo a dúvida. Entendo e já a senti na pele. Houve também uma fase da minha vida em que questionei se faria sentido terminar o meu casamento, já que tinha quatro filhos e uma vida familiar harmoniosa e tranquila. Na altura, este foi um tema muito discutido em casa, com quem de direito e com os meus amigos mais próximos. Li muitos livros, ouvi demasiados testemunhos, falei tremendamente com o meu coração. E com a minha cabeça. Mas sempre acreditei na velha máxima de que “pais felizes fazem crianças mais felizes”. Mesmo que isso aconteça com eles, os progenitores, separados.

A vida não tem fórmulas. Aquilo que me serve pode ser totalmente despropositado para o meu vizinho do lado. Mas confesso que me faz alguma confusão saber que se adia a felicidade na crença de que, mantendo algo que não se quer, se vai garantir mais harmonia às crianças.

E se não se garantir? E se, nisto, o tempo se arrastar até que eles sejam adultos e saiam de casa, deixando-nos, então, numa vida que concluímos finalmente não nos servir? Mas numa idade em que parece muito mais difícil decidir e fazer qualquer mudança?

Começar de novo pode não ser fácil. Abandonar aquilo que já conhecemos pode revelar-se uma tarefa hercúlea, sobretudo quando a decisão envolve uma série de intervenientes que, sem ter voto na matéria, são arrastados para uma nova vida que não escolheram. Mas será preferível acomodarmo-nos ao que não nos traz felicidade, adiando – muitas vezes “até sempre” – a possibilidade de nos sentirmos bem na vida e na nossa pele?

Tive a enorme bênção de nascer numa família estruturada e de duas pessoas que ainda hoje trocam beijos escondidos pelos cantos da casa. E talvez seja por isso mesmo que, acreditando no amor (e na felicidade que ele nos pode oferecer), não consigo conceber menos que isto: a manutenção de apenas aquilo que nos faça realmente felizes.

Os meus “amores pequenos” são filhos de pais separados. Mas também são filhos de pais felizes. De pais que, apesar das diferenças e dos desacordos que os levaram a seguir caminhos diferentes, aprenderam que a felicidade tem muitas bifurcações e que são precisamente as dificuldades - ou as tomadas de decisão mais complexas - que nos tornam mais completos. Mais nós.

[mesmo que isso nem sempre seja fácil.]

Alda Benamor