“São números muito pesados e, por isso, estamos conscientes de que a infância em Portugal não é um período de vida feliz para muitas crianças, porque vivendo em situação de pobreza e exclusão social encontram-se privadas de várias dimensões de bem-estar”, diz o presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN Portugal), padre Jardim Moreira.

A Cáritas Portuguesa defende, por sua vez, a importância de se encarar o combate à pobreza infantil como uma prioridade para os decisores políticos e para a sociedade civil.

"Os custos humanos deixaram marcas não apenas na geração futura, mas no tecido humano e social do país. Um país que não dá às crianças as oportunidades necessárias para um crescimento equilibrado e de esperança nunca poderá ser considerado um país desenvolvido", afirma o presidente da Cáritas, Eugénio Fonseca, num comunicado conjunto.

A Cáritas, em conjunto com a EAPN, que coordena um grupo de trabalho de reflexão sobre este tema, defendem “a criação urgente de um programa de ação, assumido como instrumento de política pública para a prevenção e combate eficazes da pobreza infantil e exclusão social em Portugal”.

Crianças vítimas de múltiplas violações

Já Dulce Rocha, vice-presidente do Instituto de Apoio à Criança, que também integra o grupo de trabalho, destacou “as múltiplas violações de que ainda são vítimas as crianças”.

“Em nome da defesa dos direitos humanos, não podemos silenciar o aumento da pobreza infantil, a violência, a exploração sexual e o fenómeno associado do tráfico de crianças que continuam a ensombrar um futuro que queremos de respeito e dignidade”, sublinhou Dulce Rocha.

Para Amélia Bastos, professora do Instituto Superior de Economia e Gestão, também membro do grupo de trabalho, “as crianças têm sido o grupo etário mais penalizado pela deterioração das condições de vida” em Portugal.

“Esta constatação deverá levar-nos a refletir sobre as consequências da pobreza infantil para as crianças que, desta forma, têm o futuro ameaçado. Trata-se de um problema societal” que a todos diz respeit”, sustenta Amélia Bastos.

As instituições defendem no comunicado, publicado no ‘site’ da Cáritas, que “construir memórias positivas é crucial para o desenvolvimento harmonioso de uma criança”, sendo que essa construção não depende apenas dos pais, mas também dos seus educadores, dos seus pares e de todos os adultos que os rodeiam.

“Situações de abusos, violência, bullying, são passíveis de criar memórias negativas numa criança e afetar o seu equilíbrio físico e emocional”, advertem.

Fernando Diogo, da Universidade dos Açores e membro do grupo de trabalho, salienta que “no contexto de grande crise que o país atravessa, os esforços parentais para proteger as crianças dos efeitos da pobreza têm limites”.

“Esses limites consubstanciam-se na escassez de todo o tipo de recursos, fazendo com que a possibilidade de efeitos duradouros da pobreza infantil na vida dos indivíduos seja muito grande”, sublinha.

Fernando Diogo adverte que “problemas de desenvolvimento mal resolvidos, traumas psicológicos e uma escolaridade medíocre traçam um destino provável de inferioridade social construído na infância e vigente ao longo de toda a vida, mau grado a precocidade e a ousadia da previsão”.