De todas as formas que o assassinato pode tomar, o assassinato de uma família pelo pai é um dos mais trágicos e menos compreendido. O primeiro estudo sobre «aniquiladores de famílias», que será publicado amanhã na revista Journal of Criminal Justice, analisou 30 anos de casos e revela quatro novos tipos de aniquilador.

 

«Os aniquiladores de famílias têm recebido pouca atenção como uma categoria separada do assassino», declara David Wilson, um dos três autores do estudo e diretor do Centro de Criminologia Aplicada da Universidade de Birmingham City. «Estes indivíduos são muitas vezes tratados como assassinos em massa ou até mesmo assassinos em série, uma visão que pressupõe traços próprios, tais como a ideia de que o assassino “se passa da cabeça” ou que, depois de matar o seu parceiro ou os filhos, o assassino pode forçar um impasse com a polícia.»

 

Recorrendo a arquivos de jornais para analisar três décadas de destruição da família, de 1980 a 2012, os autores do estudo identificaram as características comuns dos assassinos, mas de quatro tipos diferentes. Os jornais funcionaram como uma valiosa fonte de informação, uma vez que poucos desses «aniquiladores de famílias» tinham antecedentes criminais ou eram conhecidos, de antemão, dos serviços de saúde mental. Alguns, até, eram membros de forças policiais.

 

O documento revela a primeira imagem composta de destruidores da família, revelando tendências como o género, idade, motivação e até mesmo o mês e dia mais provável em que um homem vai aniquilar sua família. «O fator unificador mais evidente é que este é um crime esmagadoramente masculino. Foram identificados 71 destruidores da família, sendo que 59 eram do sexo masculino», diz David Wilson. «Também descobrimos que a taxa a que este tipo de crime está a ser cometido aumentou, com a primeira década do século XXI a reivindicar mais da metade de todos os casos.»

 

Mais da metade desses homens, 55 por cento, estava na faixa dos trinta anos, 10 por cento estavam na faixa dos vinte anos e o mais velho tinha 59 anos de idade.

 

Verificou-se que agosto foi o mês mais comum para as mortes ocorrerem, correspondendo a 20 por cento dos casos. Pouco menos da metade de todos os assassinatos foram cometidos em fins de semana, especialmente ao domingo.

 

«Isto acontece em parte porque o pai teve acesso aos s filhos no meio das férias escolares, quando não está no trabalho», afirma o responsável pela investigação. «Também pode ser um fator simbólico uma vez que os pais que se veem no meio de casos de alienação parental sabem que no final do fim de semana terão de entregar os filhos à mãe.»

 

Oitenta e um por cento dos homens tentaram o suicídio após o ato, o que refuta a ideia tradicional de que os destruidores da família tendem a forçar a polícia para matá-los, como é comum nos assassinos em massa. Não houve casos registados de impasse com as forças policiais.

 

Também refutada foi a ideia de que os assassinos podem ser homens insatisfeitos ou frustrados com uma longa história de fracasso na vida. Alguns tinham sido muito bem-sucedidos nas suas carreiras antes do assassinato. Setenta e um por cento estavam empregados, com ocupações que variavam entre cirurgiões, executivos de marketing, carteiros, polícias e motoristas de veículos pesados.

 

Esfaqueamento e intoxicação por monóxido de carbono foram estatisticamente os métodos mais comuns de assassinato, enquanto a maioria dos assassinatos foram perpetrados em na casa.

 

A equipa também considerou as motivações declaradas dos assassinos, tendo-as reunido por meio de entrevistas com familiares ou pela análise de cartas de suicídio anexadas aos inquéritos de Medicina Legal.

 

A separação da família foi a causa mais comum, sendo responsável por 66 por cento dos casos, embora isto incluísse questões domésticas relacionadas, tal como o acesso aos filhos. As dificuldades financeiras foram o segundo motivo mais citado, seguido pelo crime de honra e doença mental.

 

«A análise desta partilha de características e motivações permitiu-nos identificar quatro tipos de assassinos: hipócrita, dececionado, paranoico e anímico», diz o investigador. «Embora possam sobrepor-se, todas elas vão além das ideias tradicionais da “vingança "ou “assassinos altruístas".»

CATEGORIZAR O ASSASSINO

Hipócrita: O assassino tenta projetar a culpa pelos seus crimes sobre a mãe, que ele responsabiliza pela separação da família. Isto pode envolver o assassino telefonar para o seu parceiro antes do assassinato e explicar o que está prestes a fazer. Para estes homens, o seu estatuto de ganha-pão é fundamental para a sua ideia de família ideal.

 

Dececionado: Este assassino acredita que a sua família o deixou mal ou agiu de forma a prejudicar ou destruir a sua visão de vida familiar ideal. Um exemplo pode ser a deceção de que as crianças não estão a seguir os costumes religiosos ou culturais tradicionais do pai.

 

Paranoico: Aqueles que consideram haver uma ameaça externa à família. Esta ameaça percebida é, muitas vezes, os serviços sociais ou o sistema legal, que o pai teme que estejam contra ele e que lhe queiram tirar os filhos. Aqui o crime é motivado por um desejo retorcido para proteger a família.

 

Anímico: Nestes casos, na mente do assassino, a família tornou-se firmemente ligada à economia. O pai vê a família como o resultado do seu sucesso económico, permitindo-lhe mostrar as suas realizações. No entanto, se o pai se torna num fracasso económico, considera que a família já não serve esta função.

 

Em todos estes casos, a masculinidade e perceções do poder definem o pano de fundo para os crimes. O papel do pai na família é fundamental para suas ideias de masculinidade e os assassinatos representam uma última tentativa de assumir um papel masculino.

 

«O aniquilador da família deve ser visto como uma categoria específica de assassino, dado o aparente aumento deste tipo de crime», conclui David Wilson. «Para começar a resolver este problema, o papel do género deve ser reconhecido, percebendo que são principalmente homens que recorrem a este tipo de violência.»

 

 

Maria João Pratt