Quase 60% das crianças envolvidas em trabalho infantil estão na agricultura, um dos setores mais perigosos, e há crianças a partir dos cinco anos a trabalhar no pastoreio, revela um relatório da FAO hoje divulgado.

 

Intitulado "Trabalho infantil na pecuária", o relatório da agência das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) conclui que pouco se sabe sobre o envolvimento das crianças nesta atividade, em que a participação dos menores é comum cultural e tradicionalmente.

 

Embora reconheça que a participação na agricultura pode ser um fator normal do crescimento, desde que em tarefas adequadas à idade, que não tenham riscos para a saúde e que não interfiram com o tempo necessário para estudar e brincar, a FAO sublinha que muito do trabalho das crianças na pecuária pode ser categorizado como trabalho infantil.

 

"É provável que seja perigoso, que interfira com a educação da criança e que seja prejudicial à saúde e ao desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral ou social", pode ler-se no texto.

 

O relatório, que se baseia em pesquisa bibliográfica e numa consulta junto de organizações e de especialistas, cita "uma série de estudos de caso" focados em países específicos que mostram que o trabalho infantil no pastoreio - a mais documentada de todas as atividades infantis na agricultura - "pode começar muito cedo, entre os cinco e os sete anos".

 

A FAO manifesta uma "particular preocupação com o facto de algumas crianças serem traficadas dentro do país ou para outro país em atividades (forçadas) de pastoreio".

 

As condições de trabalho das crianças que pastoreiam o gado variam bastante, adianta o relatório, segundo o qual algumas crianças podem fazê-lo algumas horas por semana sem deixar de frequentar a escola, mas outras passam dias seguidos naquela atividade, às vezes longe de casa, e sem qualquer possibilidade de escolaridade.

 

"Em muitas situações, a natureza do trabalho das crianças na pecuária dificulta a frequência da escola formal e os riscos e as condições envolvidos tornam-no a pior forma de trabalho infantil", pode ler-se no relatório, que exemplifica com os riscos de doenças relacionadas com animais, problemas de saúde devido aos longos horários de trabalho em condições extremas, ou o uso de químicos, além dos fatores psicológicos associados ao medo dos castigos dos empregadores e ao sentimento de responsabilidade com o capital familiar.

 

“A redução do trabalho infantil na agricultura não é apenas uma questão de direitos humanos, já que também contribui para promover a verdadeira sustentabilidade do desenvolvimento rural e da segurança alimentar”, afirmou Jomo Sundaram, adjunto do diretor-geral do Departamento de Desenvolvimento Económico e Social da FAO.

 

Para o responsável, “a crescente importância da pecuária na agricultura significa que os esforços para reduzir o trabalho infantil devem concentrar-se sobretudo nos fatores que conduzem a trabalhos prejudiciais ou perigosos para as crianças e, ao mesmo tempo, devem respeitar e proteger os meios de subsistência das famílias rurais pobres”, sublinhou Sundaram.

 

Um dos setores agrícolas de maior crescimento, a pecuária representa 40% da economia agrícola e é uma fonte de rendimentos e de segurança alimentar para 70% dos 880 milhões de pobres no mundo rural que vivem com menos de um dólar por dia, escreve a FAO.

 

No seu relatório, a organização apela à academia que faça mais estudos sobre esta realidade e recomenda aos governos que apertem a malha legal para diminuir o trabalho infantil na pecuária.

 

Às associações de produtores, de patrões e de trabalhadores, a FAO pede empenhamento na sensibilização das populações e às empresas e multinacionais exige que garanta que não há crianças envolvidas em trabalho infantil nas suas cadeias de abastecimento.

 

Lusa