Segundo o despacho de acusação do Ministério Público (MP), a que a agência Lusa teve hoje acesso, a arguida, atualmente com 66 anos, “tomou decisões em prejuízo dos utentes, com vista a gastar pouco dinheiro” no lar.

O MP relata que os idosos viviam sob “insuficiência de cuidados assistenciais de enfermagem e de vigilância” e estavam “subnutridos”, além de a responsável pelo lar de terceira idade ordenar às funcionárias que dessem banho aos utentes “com vinagre, detergente da loiça ou lixívia”.

O lar de idosos A Luz dos Pastorinhos, que estava licenciado e recebia utentes encaminhados por instituições de solidariedade, tinha 24 utentes em janeiro de 2012, que pagavam à instituição uma mensalidade que variava entre 1.535 e 1.750 euros.

No caso de dois dos idosos – que morreram quando moravam no lar - a acusação sustenta que a arguida, “ao não proporcionar os cuidados devidos, zelando pela sua saúde, poderia conduzi-los à morte, atenta a sua idade avançada e a debilidade física”.

O MP defende que a proprietária tinha como objetivo acolher o maior número de utentes “sem que providenciasse pelas condições humanas e materiais necessárias a proporcionar uma razoável qualidade de vida”.

De acordo com a acusação, todo o pessoal contratado não tinha conhecimentos básicos do processo de envelhecimento, assim como não possuía conceitos acerca de saúde/doença, nutrição, higiene, locomoção, medicamentos/riscos e cuidados a ter com utentes dependentes.

Ao permitir que durante uma semana os idosos não recebessem cuidados de enfermagem – pois nenhuma enfermeira desempenhava funções no lar – a responsável fez com que os utentes “sofressem e agravassem as lesões”.

As camas do lar não tinham grades, o que fazia com que os utentes caíssem durante a noite.

“Para evitar esta situação, a arguida ordenou aos funcionários que atassem os utentes às camas com panos. Além disso, não adquiriu cobertores suficientes e, durante a noite, os utentes tinham frio e viam o seu estado de saúde, já fragilizado, agravado”, diz o MP.

Os idosos “apenas tomavam banho completo na banheira uma vez por semana”, sendo “ensaboados com sabão azul e branco e, muitas vezes, com vinagre ou detergente da loiça”.

O MP conta que numa manhã, a arguida “ordenou aos funcionários que dessem banho com lixívia a todos os utentes do lar”.

A acusação acrescenta ainda que, entre as 18:00 e as 08:00, os utentes ficavam apenas com uma funcionária que tinha de lhes dar o jantar, tratar da sua higiene pessoal e prestar-lhes todos os cuidados devidos.

Num dos dias, por exemplo, o jantar deveria ser sopa de legumes, omelete de atum com arroz e fruta/doce, mas, por ordem da arguida, a única comida confecionada para servir aos idosos naquela noite foi sopa aguada com puré de maçã.

O MP relata que a arguida deu ordens à cozinheira para não confecionar o prato principal para o jantar “a fim de evitar que os utentes evacuassem durante a noite”. Do mesmo modo, ordenou à funcionária para que não desse muita água aos idosos “a fim de evitar gastar muitas fraldas, porque eram caras”.

“Os utentes, devido à fome que sentiam, em face dos escassos alimentos que lhes eram fornecidos ao jantar, por vezes ficavam desorientados e caiam da cama, dormindo o resto da noite no chão”, conta o despacho de acusação.

A primeira sessão do julgamento está agendada para a manhã de 03 de fevereiro, em Lisboa.