Os relatos emocionados dos pais foram ouvidos pelo Grupo de Trabalho da Educação Especial, que promoveu hoje na Sala do Senado uma audição pública, com o tema "Que mudanças para uma escola e uma sociedade verdadeiramente inclusivas? - Testemunhos de vivências da escolaridade por parte de alunos com NEE".

Luísa Beltrão, mãe de sete filhos, a mais nova com uma deficiência intelectual de 90%, afirmou que “a escola não está a educar para a vida ativa”, uma fase que constitui uma “terrível angústia” para os pais. “O nó da questão é o enorme fosso entre a teoria e a prática”, disse Luísa Beltrão, comentando que a “legislação pode ser maravilhosa”, mas se não for cumprida de pouco adianta.

“Aquilo que é fundamental é que as pessoas interiorizem a legislação e os atores sejam formados, capacitados e que saibam autonomamente educar e criar” para que a escola seja verdadeiramente inclusiva.

Esta opinião é partilhada por Eduarda Melo Cabrita, mãe de três filhos, que defende “mais formação para os professores do ensino regular” e o alargamento da proteção jurídica ao ensino superior. “Partia-se do princípio que os nossos filhos nunca poderiam chegar à universidade, mas chegam se forem intervencionados adequadamente” disse Eduarda Cabrita.

Falta de proteção jurídica

Dados do grupo de trabalho de apoio ao estudante com deficiência no ensino superior mostram que há 169 alunos diagnosticados com dislexia nas universidades, números que esta mãe questiona tendo em conta os 15 mil alunos diagnosticados no ensino obrigatório. “Não há 169, há 170 porque o meu filho tem dislexia e está no ensino superior” e deve haver mais, mas não estão referenciados porque “não têm nenhuma proteção jurídica”.

João Marques, um jovem com NEE, completou o 12.º ano há quatro anos e, desde então, não consegue arranjar “emprego em lado nenhum”, sentindo-se “excluído de tudo”.

Começando por contar que apenas consegue bons resultados nas disciplinas que lhe “fazem sentido”, João confessou que gostava de “ir para a faculdade adquirir conhecimentos” nas área que gosta e em que é “bom”, mas foi-lhe negado a acesso.

Para Ana Sofia Mota, da associação Pais em Rede, a fase de transição para a vida ativa, que deve ser feita nos três últimos anos da escolaridade obrigatória, “precisa e pede cada vez mais educação e preparação”.

“Deveria haver a figura de técnico de transição” que, nunca se sobrepondo à escola, podia “ser determinante na capacitação dos jovens para a vida ativa” em comunidade, defendeu

Em declarações à agência Lusa, a coordenadora do Grupo de Trabalho da Educação Especial, Manuela Tender, adiantou que a audição pública visou ouvir os pais e os jovens sobre “o que é preciso fazer para uma escola e uma sociedade mais inclusivas”.

“São fundamentalmente dramas que os pais nos trazem”, lamentou a deputada, acrescentando: “São testemunhos muito angustiantes de pessoas que nos dizem que isto não está a funcionar ainda e as dificuldades que os filhos têm”.

Apesar de o país já “ter feito muito no sentido da construção de uma escola e uma sociedade mais inclusiva”, os testemunhos ouvidos levaram os deputados a perceber que “é preciso fazer muito mais”, frisou Manuela Tender.