A empresa start-up nova-iorquina GenePeeks irá concentrar-se inicialmente em dadores de esperma, simulando antes da gravidez como a sequência genética de uma cliente feminina poderá combinar com as sequências genéticas de diferentes homens.

 

Os dadores de esperma que mais frequentemente produzam «filhos digitais» com um risco mais elevado de doenças hereditárias serão filtrados, aceitando apenas os dadores que serão geneticamente «mais recomendáveis».

 

«Neste momento, o nosso negócio é apenas o fornecimentos a futuras mães, que recorrem à dadores de esperma para conceberem, de um catálogo filtrado de dadores baseadono seu perfil genético subjacente», declarou Anne Morriss, co-fundadora da GenePeeks, à BBC News. «Estamos a filtrar os dadores com um elevado risco de doenças pediátricas hereditárias raras.»

 

Avanço da tecnologia

Anne Morriss foi motivada em parte pela sua própria experiência de começar uma família. O seu filho foi concebido com um dador de esperma que passou a partilhar com Anne Morriss o gene para uma doença hereditária chamada MCADD.

 

A MCADD (sigla em inglês para desidrogenase de acil-CoA de cadeia média) impede os afetados de converter gorduras em açúcar. Pode ser fatal se não for diagnosticada precocemente. Felizmente, no caso de Anne Morriss, a doença foi detetada em testes de triagem neonatal.

 

«O meu filho tem uma vida muito normal», declarou Anne Morriss, «mas cerca de 30 por cento das crianças com doenças genéticas raras não chega à idade de cinco anos.»

 

A GenePeeks formalizou uma parceria com um banco de esperma – o Manhattan Cryobank – e tem uma patente pendente sobre a tecnologia de triagem de ADN.

Filtro digital

Lee Silver, parceiro de negócio, geneticista e especialista em bioética da Universidade de Princeton, em New Jersey, disse à BBC: «Temos as sequências de ADN de dois futuros pais. Nós simulamos o processo de reprodução, formação esperma e óvulos virtuais. Juntamo-los e formamos o genoma de uma hipotética criança.»

 

«Então, podemos olhar para esse genoma hipotético e – com todas as ferramentas da genética moderna – determinar o risco que o genoma irá resultar numa criança com doença. Estamos a olhar diretamente para a doença e não para o estatuto de portador. Para cada par de pessoas que iremos analisar, faremos 10 mil crianças hipotéticas.»

 

O processo será executado para o cliente e cada potencial dado, um por um, procurando alguma das 600 doenças recessivas associadas a um único gene. Desta forma, os pares com risco mais elevado poderão ser filtrados.

 

Mas os fundadores da empresa têm planos para expandir a triagem além das doenças recessivas associadas a um único gene para doenças mais complexas, em que vários genes desempenham um papel.

 

Para alguns, esta perspetiva pode parecer como um passo para bebés de design – até agora confinados às páginas da literatura de ficção científica e a argumentos de filmes e séries de televisão.

 

Especialistas em bioética abordados pela BBC afirmaram que a GenePeeks é um resultado lógico da crescente procura por mais informações na tomada de decisões reprodutivas.

As dúvidas e objeções

No entanto, alguns levantaram preocupações sobre potenciais comunicação de risco e a expansão da triagem além das doenças raras associadas a um único gene.

 

Especialistas em bioética contatados pela BBC afirmaram que a GenePeeks é um resultado lógico da crescente procura por mais informações na tomada de decisões reprodutivas. No entanto, alguns levantaram preocupações sobre potenciais comunicação de risco e a expansão da triagem além das doenças raras associadas a um único gene.

 

Um especialista em ética, disse à BBC News: «A grande questão para mim, desde o início, é a compreensão da incerteza. Mesmo as pessoas que têm vindo a fazer genómica durante anos ainda têm dificuldade para descobrir exatamente o que o risco para uma determinada predisposição genética realmente significa para uma família, até porque interações gene-ambiente podem levar pessoas a manifestarem ou não a doença.»

 

Ewan Birney, diretor-adjunto do Instituto Europeu de Bioinformática repetiu a preocupação: «É salutar que a GenePeeks esteja a concentrar-se no estatuto de portador de tais doenças mendelianas raras em que a evidência á mais clara. Dito isto, estas coisas são mais complexas do que aparentam ser à primeira vista», disse. «Tenho a certeza de que os cientistas compreendem esta complexidade. Mas, ao transmitir esta complexidade às pessoas comuns, estas coisas podem parecer mais absolutas e certas do que realmente são.»

 

O especialista acrescentou: «O que eu gostaria de destacar aqui é o quão complexo é este processo. É excelente que as pessoas estejam a pensar em usar esta tecnologia em várias maneiras diferentes, mas a nossa lacuna de conhecimento é muito grande.»

 

A comunicação do risco aos clientes é, declarou Anne Morriss, «absolutamente crítica para qualquer pessoa nesta indústria.»

 

«Temos de ser bem claros sobre o que estamos a testar, quais os riscos que estamos a ajudar a reduzir; que não há nenhuma garantia de que não vai ser dada à luz uma criança doente», disse a responsável pela GenePeeks.

 

Mildred Cho, diretora associada do Centro para Ética Biomédica de Stanford, na Califórnia (EUA), levantou questões sobre se o dador de esperma também deve receber informações sobre o seu genoma adquirida a partir do processo de triagem.

 

«Ao contrário da cor do cabelo, da profissão ou da história familiar – estas são as coisas que, provavelmente, o dador já sabe – a única coisa que aqui parece ser diferente é que poderá criar informação de que o dador não dispõe. E isto também tem implicações para outros membros biológicos da família do dador», declarou Mildred Cho à BBC News.

 

 

Maria João Pratt

Fonte: BBC News