O Protóxido de Azoto é um gás com propriedades analgésicas e utilizado, há mais de um século, como complemento da anestesia em muitos tipos de cirurgias diferentes. É um gás incolor, não inflamável, pouco tóxico e de sabor e odor ligeiramente adocicado. É também chamado de “gás hilariante” ou “gás do riso” porque provoca uma sensação de bem-estar e é geralmente administrado como uma mistura de 50 por cento de protóxido de azoto com 50 por cento de oxigénio, para impedir que surja hipoxemia (fornecimento inadequado de oxigénio).

O Protóxido de Azoto é, portanto, um "velho amigo" dos anestesiologistas tendo sido amplamente estudado. E a sua utilização na analgesia do trabalho de parto (ATP) também não é nenhuma novidade. De facto, este gás começou a ser utilizado para retirar a dor às grávidas, durante o parto, ainda no século XIX.

Atualmente, no Reino Unido, na Escandinávia e Australásia, a inalação intermitente de Protóxido de Azoto continua popular, mas na América do Norte e na Europa Continental, nomeadamente em Portugal, a sua utilização é rara. A auto-administração inalatória deste gás constitui um método analgésico simples e seguro, não requerendo, na maior parte dos casos, supervisão médica.

De acordo com dados da Associação Internacional para o Estudo da Dor, mais de 95% das mulheres relatam dor durante o parto.

Atualmente, as técnicas loco-regionais (epidural e sequencial) representam o “gold-standard” da ATP, mas nem sempre estão indicadas, disponíveis ou desejadas. E além disso, existem grávidas que desejam ter um parto o mais próximo possível do natural, em que a dor seja perfeitamente controlada por elas, sentindo-a em menor ou maior intensidade ao longo de todo o trabalho de parto. O protóxido de azoto não tem a eficácia da epidural no controlo da dor, mas permite que a grávida possa fazer opções, várias e diferentes, naquele momento que é tão especial.

Sem efeitos secundários

Este gás tem um efeito analgésico máximo atingido em 30 a 60 segundos e é eliminado facilmente assim que cessa a sua utilização, sem efeitos secundários duradouros para a mãe, para o feto ou para a progressão do trabalho de parto. Se a grávida não estiver satisfeita com o resultado ou não tolerar os efeitos secundários (mais comuns são a sonolência, náuseas e vómitos) pode interromper, a qualquer momento, a sua administração e em cerca de cinco minutos o fármaco está completamente eliminado do seu organismo. Depois pode optar por outra forma de analgesia.

Como é administrado este gás misturado em 50% com o oxigénio? De um modo extremamente fácil. Quando começa a contração, a grávida deve iniciar a auto-inalação da mistura gasosa, através de um dispositivo (máscara ou bucal), com inspirações profundas e regulares, até ao fim da contração ou dor.

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Este dispositivo está conectado a uma válvula de segurança, que só permite a passagem de gás quando a grávida inspira. Quanto maior a inspiração, maior quantidade de gás é oferecida e, portanto, mais analgesia. Quando não se sente dor, ou ela não incomoda, simplesmente deixa-se o aparelho de lado. Até à próxima contração demasiado dolorosa.

Neste momento, o protóxido de azoto encontra-se disponível em algumas maternidades a título experimental. A maternidade onde trabalho é uma delas. Experimentamos não a segurança do medicamento, pois isso já está largamente demonstrado, mas sim a adaptação das nossas grávidas a esta nova modalidade.

O limiar de dor de cada pessoa é muito diferente, e nas grávidas a dor ainda está mais influenciada pelos múltiplos fatores que a condicionam. O nascimento é algo maravilhoso, talvez mesmo o maior dos mistérios, mas envolve igualmente muito receio e ansiedade, modulados pela sociedade onde uma grávida está inserida.

Eu sou anestesiologista e portanto a minha maior preocupação é o bem estar da grávida e do seu bebé, olhando para cada uma como se fosse única. Por isso, e apesar de ser acérrima defensora da analgesia loco-regional, tenho que acreditar que nem todas as grávidas querem ou precisam do mesmo.

E o meu dever ético é tentar oferecer-lhes as mais variadas opções analgésicas, desde que clinicamente seguras.

Um artigo de Filipa Lança, Médica Anestesista, assistente hospitalar de anestesiologia e sub-coordenadora da anestesia obstétrica do do Centro Hospitalar Lisboa Norte