O homem percorre o seu próprio caminho para se tornar pai, embora de forma mais lenta no tempo que a companheira, influenciado pela sua própria experiência de infância. As mudanças internas que o homem começa a sentir na relação com a companheira, com os seus próprios pais e irmãos e em relação à sua identidade podem ser sentidas como prazerosas e enriquecedoras, mas também como irritantes e distratoras. Cada fase da gravidez constitui um novo desafio tal como acontece com a mulher.

 

A relação do pai com o feto é mais orientada pela expectativa do que pela estimulação hormonal, psicobiológica ou pelo impulso, uma vez que experiencia tudo em segunda mão. Mesmo assim o pai expectante vincula-se ainda durante a gravidez ao filho e isto irá ser precursor da forma como se torna pai do bebé. A intensidade com que o faz depende da relevância que ele dá ao papel de pai. Alguns pais respondem à gravidez com o entusiasmo que lhes desperta uma pedra de toque natural no seu desenvolvimento, outros porém sentem a sua trajectória de vida dramaticamente alterada por se tornarem pais.

 

As primeiras reações

As primeiras tarefas específicas de desenvolvimento do pai são criar uma ligação ao feto e, ajustar-se à transição da relação a dois para uma relação a três e à necessidade de partilhar o afecto da parceira, diz-nos Condon. O envolvimento do pai, facilitado por uma mãe que o apoia e valoriza, reforça a sua identidade como agente participante e activo, destaca o investigador Barnard, o que reduz a sensação de exclusão (Barnard, 1982) e o prepara para uma intervenção mais directa após o nascimento do bebé, com benefícios protectores e estimulantes para o desenvolvimento do bebé.

 

No segundo trimestre a gravidez torna-se mais real, ocorre um aumento significativo da ligação ao bebé associado à capacidade do pai sentir o feto na barriga da mãe e senti-lo a mover-se. O feto começa a ser visto como um ser separado da mãe, um bebé a quem começam a atribuir características de personalidade «vai ser um grande jogador de futebol» e como um ser interactivo que responde aos estímulos do pai. Para uns, este é um momento de maior interesse pelo, bebé, pela gravidez e pelo parto, lendo livros sobre o assunto em busca de informação, acompanhando as ecografias, cursos e consultas pré-natal, preparando o enxoval e o quarto do bebé. Nesta fase o futuro pai tende a demonstrar uma preocupação com o seu próprio corpo, numa identificação materna, que muitas vezes se traduz em vários tipos de dores, náuseas, vómitos, distúrbios gastro-intestinais.

O pai queria estar grávido?

Por vezes, o homem pode ter dificuldade de se afastar do desejo de ser como a mulher e invejar a sua capacidade de engravidar, vivendo de tal forma intensa a gravidez e o parto que exibe sintomas semelhantes ao da mulher, ou, ao contrário, foge desse desejo, ausentando-se física ou psiquicamente durante a gravidez. Centra-se muitas vezes nas preocupações financeiras que levam a um investimento acrescido no trabalho, ou nas viagens, em aventuras extraconjugais, no alcoolismo ou toxicomanias ou remete-se a um papel de espectador desinteressado. A depressão ou uma relação conjugal pouco satisfatória podem também inibir a vinculação ao bebé no parecer de Condon e outros investigadores, os pais devem por isso procurar apoio.

 

Conforme os conflitos internos forem tendo resolução o homem poderá identificar-se de forma empática com a mulher grávida. Citando Bayle, «um pai só poder vir a ser pai depois de aceitar a sua parte feminina, integrando assim a sua própria mãe nele, sem que isso lhe traga angústias de perder a sua virilidade». Aquilo que nesta fase é mediado pela mãe, deixará de o ser quando a criança nascer. À medida que espera, imagina e sonha o filho, o pai vai fazendo uma reorganização da sua nova identidade, o maior ou menor envolvimento durante a gravidez e o sucesso deste processo, traduz-se numa maior disponibilidade para perceber os sinais precoces do bebé e é preditivo de intimidade e cuidados adequados ao filho, como refere Eduardo Sá. Para o final do trimestre o homem afasta-se da sua mãe para se poder aproximar do pai.

Preocupações com o parto e a paternidade

Reorganizar a sua identidade como pai e abandonar um estilo de vida mais independente, adoptando as responsabilidades e restrições do papel de pai é a tarefa actual. Neste último período da gravidez, os homens tendem a analisar o seu relacionamento com o próprio pai (em sonho ou na realidade), voltam-se para ele para enfrentarem o papel que vão ser chamados a desempenhar. Na medida em que no revisitar da relação com o seu próprio pai, lhe faltem referências sintónicas com o tipo de pai que o homem pretende ser, pode ter dificuldades em desenvolver a sua nova identidade e sentir-se ansioso em relação à forma como irá lidar com o novo papel.

 

O mais comum é uma solução equilibrada, que permite que o homem aceite o seu papel como cuidador, que tenha a capacidade de se identificar com a gravidez da sua mulher e que venha a contribuir para a educação do filho, enquanto pai, sentindo uma criatividade renovada e a consolidação da sua identidade como homem. Como citam os investigadores Gomes e Resende, «o homem-pai é aquele que encontrou o seu pai e reencontrou a sua mãe».

Muitos pais desejam estar presentes no momento do parto

Como nos diz Bárbara Figueiredo, psicóloga especialista na área da gravidez e da parentalidade, a presença do pai como apoio e suporte efectivo para a mãe facilita uma experiência de parto mais positiva e promove o envolvimento emocional materno com o recém-nascido, além de ser um momento privilegiado de ligação à mulher e favorecer a vinculação ao bebé. É, todavia, também uma experiência causadora de desgaste emocional para o pai pela percepção da dor e do medo vivido pela parturiente, das preocupações do pai em relação à saúde, normalidade e perfeição do bebé e à saúde da mãe e da extrema exposição da intimidade da companheira. O pai também precisa de conforto.

 

A investigação destaca o terceiro trimestre como aquele em que há um maior envolvimento emocional do pai com a mãe que faz com que sintam a gravidez como algo presente nas suas vidas preparando-se, deste modo, para a paternidade. Os homens estão mais atentos nesta fase às crianças e seus pais e algo apreensivos em relação ao seu papel como pais. Neste trimestre a energia dos pais está bastante concentrada na sua antecipação e preparação para ser o pai real do bebé real, em função da eminência do nascimento.

 

À medida que se envolve na preparação para a chegada do bebé começa a desenhar-se uma rivalidade natural entre pai e mãe em relação ao cuidar do bebé. Brazelton e Bertrand Cramer falam da competição pela educação do filho que vem juntar-se a competição com o bebé que vai nascer, através da disputa pela atenção do outro. Este tipo de competição, na justa medida, é natural e necessária para fomentar o vínculo crescente ao futuro filho e reforçar os laços afectivos que unem o casal.

Após o nascimento

Após o nascimento o pai vira-se para o exterior para enfrentar o mundo, num contraste gritante com a sua parceira. Da mesma forma que ela poderá não compreender esta viragem para o exterior, também ele poderá não compreender a grande concentração dela no bebé e vivê-la com um misto de confusão, ciúme, espanto e um leve sentimento de inadequação por não conseguirem entrar neste reino de experiências, como refere Stern.

 

Assistiu-se a uma evolução do ideal de pai desde o pai colonial, ao provedor distante, ao pai moderno envolvido, ao pai como co-parente. O pai tradicional vê-se como a pessoa que apresenta a criança ao mundo, onde ele próprio se sente mais confiante, aparecendo mais no terceiro ano da vida da criança. No caso dos pais mais igualitários, há uma espécie de ruptura com os papéis masculinos tradicionais, o pai assume um maior envolvimento emocional e é um participante sensível nos cuidados infantis e tarefas domésticas. Com excepção da amamentação, a maior parte das coisas que a mãe faz podem ser feitas pelo pai, assim como a maior parte das coisas que o pai faz podem ser feitas pela mãe, cada um tem uma contribuição significativa não tanto ao nível do que é feito, mas de como é feito, «há muitos caminhos para chegar a Roma» nos cuidados ao bebé. O bebé vai aprender desde logo a relacionar-se de forma diversa com cada um deles e com ambos.

 

O problema surge quando não existe consenso entre o homem e a mulher acerca da natureza do casamento e os seus diferentes papéis nele ou quando os pais competem pelo bebé, para que a relação dos três seja penalizada. Muitas zangas conjugais podem surgir nesta ocasião e há necessidade de negociar entre pai e mãe cada instante do bebé.

 

A qualidade da experiência do homem como pai e o seu envolvimento vão depender muito da qualidade do casamento e modera a influência do envolvimento mãe-criança. O homem pode ser uma ajuda imprescindível para a grávida, como antes o seriam as famílias em que coabitavam várias gerações. A investigação de Parke, mostra que o apoio emocional do pai contribui para uma boa adaptação da mãe à gravidez, para menos medicação à grávida, para uma experiência de parto mais positiva, para melhores competências na amamentação, e para um retorno mais pronto da mulher à vivência conjugal, renunciando à satisfação de um apego exclusivo ao seu bebé encarado, por vezes, como extensão da própria mãe. O pai introduz esta separação vital na linha que circunda bebé e mãe, permitindo que o filho se desenvolva também para o mundo de forma segura entre dois seres adultos que o amam. Quando um bebé nasce e os pais estão lado a lado nesta nova aventura, eles formam as margens por onde pode correr o rio, «Kawa» para os Japoneses, o nosso bebé.

 

Teresa Abreu, com Violante Assude