Não tenha medo de errar. Errar não é forçosamente mau. Errar, de quando em vez, também é positivo.

 

Pelo menos assim o defende a Associação Paris-Montagne, que todos os anos organiza «Détrompez Vous!», um festival dos erros para crianças dos seis aos 18 anos.

Acontece desde 2006 e consiste num conjunto de experiências laboratoriais, espetáculos, animações e apresentações de pessoas ligadas à ciência, cuja base é ajudar os mais novos a ter gosto pela descoberta. O objetivo principal, explica a associação francesa em comunicado, é «tornar a ciência acessível a todos e incitar os jovens a ultrapassar a autocensura na sua orientação escolar».

Na escola

De acordo com a teoria apresentada neste festival, os erros podem ajudar a melhorar a criatividade e inteligência de uma criança. Em entrevista à Agence France Presse, Maëlle Lenoir, diretora da Associação Paris-Montagne, explica que a ideia por detrás deste projeto é «desdramatizar o erro. Aquilo que na escola pode parecer uma coisa negativa faz parte do processo de aquisição». O ponto de partida é sensibilizar os adolescentes para a ciência, «incitar a pesquisa e o questionamento, pondo em causa os seus próprios pressupostos».

Num dos textos que serve de base ao festival, La Fecondité de L’erreur Scientifique, o investigador francês Daniel Perrin, argumenta que «todo o erro retificado através de um contraexemplo ou de um argumento é um passo para a solução e para uma melhor compreensão».

Estratégias originais

Girolamo Rammuni, um dos professores que marcou presença no festival, em entrevista a The Guardian revelou as estratégias que usa com os seus alunos, para ensiná-los a rejeitar a pressão para fazerem sempre as coisas certas, dando-lhes, por exemplo, «problemas que não podem ser resolvidos», diz.

«No princípio eles não querem correr riscos, mas aos poucos, nota-se que começam a ser mais criativos. Aos poucos vão aceitando que fazer coisas erradas não é o fim do mundo e começam a aparecer com algumas ideias», acrescenta.

Outro dos seus trabalhos consiste em criar debates cujo ponto de partida pode ser absurdo. «Quero dar às crianças a coragem de dizer coisas excêntricas para que saibam debater com os outros e eliminar aquilo que não está no caminho certo (...) É importante habituá-las a ver o mundo com um olhar interrogativo», acrescenta, ainda, o especialista.

A pesquisa

Um dos pontos fortes do festival dos erros é dedicado à investigação científica.

Existe mesmo um ateliê de experiências impossíveis (como encher um copo sem nada lá dentro ou criar uma fita só com uma face), uma aula de erros de interpretação e outra onde aprendem a tirar lições dos seus fracassos.

«No mundo da ciência, em várias situações, o erro é fecundo», salienta Etienne Klein, diretor de pesquisas do conselho científico do festival.

Nestes dias, fazem também questão de recordar cientistas como Louis Pasteur, que descobriu a vacina da raiva por engano, ao injetar um vírus em pássaros que sobreviveram e se tornaram imunes à doença. «Quando fazemos pesquisas, criamos hipóteses que são depois anuladas ou confirmadas», explica o diretor deste original evento.

Errar é bom

É fundamental que as crianças experimentem o insucesso. «Só assim poderão construir estruturas sólidas que lhes permitam, mais tarde, ter a capacidade de resistir à frustração sem desanimar ou desistir», comenta Rita Faria Blanc, psicóloga infantil. No entanto, a pergunta que muitos se colocam face a esta teoria relaciona-se com as vivências traumáticas que podem surgir.

A psicóloga salienta que «mesmo prevendo as consequências negativas de determinado comportamento, será fundamental que os educadores permitam que a criança passe pela experiência educativa de enfrentar o sofrimento ou a tristeza resultante de uma má opção. Só assim aprenderá a agir de forma autónoma e a ser capaz de prever consequências e agir de acordo com os benefícios futuros de determinado comportamento».

Por outro lado, uma criança que não tem oportunidade de falhar «será facilmente derrotada pelos imprevistos e experiências negativas que lhe surjam mais tarde. Não saberá como agir e deixar-se-á abater pelo mais simples obstáculo».

Texto: Mariana Correia de Barros com Rita Faria Blanc (psicóloga infantil)
Foto: Artur (com produção de Mónica Maia)