A aquisição da linguagem é um processo dinâmico e gradual e cada criança tem o seu ritmo. No entanto, existem alguns sinais que podem alertar-nos para uma eventual perturbação da linguagem. Certas aquisições deverão já ter sido processadas até determinada idade, devendo o médico assistente estar atento, a fim de investigar se existe algum problema. São exemplo de alguns desses sinais de alarme:

•    1 mês – o bebé não fixa a cara humana.

•    2 meses – não reage aos sons nem segue a face ou a voz dos pais.

•    4 meses – não se vira na direção do som.

•    6 meses – deixou de palrar ou de reagir aos sons; não emite sons.

•    9 meses – manifesta uma atitude apática, não reage à presença de estranhos, não utiliza sons como «dá-dá», «pá-pá» ou «mã-mã»; não reage ao nome.

•    12 meses – não interage nem estabelece qualquer contacto com adultos ou outras crianças.

•    15 meses – não entende ordens simples, não percebe o que lhe é dito.

•    18 meses – não diz nenhuma palavra nem dá sinal que entenda ou tenta fazer-se entender.

•    2 anos - Ainda só palra, não junta palavras, não se faz entender.

•    3 anos – não faz frases simples, a fala é impercetível, não faz perguntas.

•    4/5 anos – omite sons ou sílabas; substitui sons por outros sons.

 


Como analisar um atraso da linguagem?

 

É muito habitual os pais manifestarem alguma preocupação e ansiedade se o seu filho não diz nenhuma palavra por volta dos 12 a 15 meses de idade. Será que poderá significar algum atraso? Mais importante do que falar é ter a noção se a criança entende e se faz entender, se interage com os outros ou se, pelo contrário se isola, não manifestando qualquer emoção ou entendimento na presença do adulto e/ou de outras crianças.

Por vezes, a avaliação da linguagem na consulta de rotina é um pouco difícil nomeadamente se a criança é tímida, pelo que se torna necessário fazê-la de acordo com as informações fornecidas pelos pais.

Podem existir variadas razões para que exista um atraso na fala e há algumas questões que é importante colocar aos pais – costumam falar com a criança? Tentam que a criança fale ou satisfazem os seus desejos mesmo antes de ela sentir necessidade de verbalizar? Tentam fazer de conta que não a entendem procurando que ela se expresse?

Se a criança consegue compreender e usar a linguagem corporal para se fazer entender e se tem a facilidade das pessoas a entenderem, torna-se preguiçosa para falar, adota como que uma atitude de negativismo. Não precisa de falar para obter o que pretende, já que existe uma certa superproteção por parte dos pais ou adultos com quem convive diariamente. Normalmente quando existem irmãos mais velhos a criança não tem necessidade de falar porque estes a entendem e falam por ela – os pais devem perceber de que modo o filho mais novo comunica com os irmãos, sendo que em grande parte dos casos predomina a linguagem gestual.

Os filhos de pais bilingues geralmente começam a falar um pouco mais tarde, mas entendem desde cedo as duas línguas. Têm de processar diferentes sons linguísticos para formar as palavras e construir frases. No entanto, quando começam a falar fazem-no nas duas línguas e sabem qual a que devem utilizar dependendo do progenitor a quem se dirigem. É aconselhável que cada um dos pais fale sempre a mesma língua com a criança para que esta não fique confusa.

No entanto, se parecer existir, na realidade, uma perturbação da aquisição da linguagem, é mesmo necessário procurar identificar qual a possível causa. As causas de atraso da linguagem podem ser agrupadas em vários grupos:

•    Problemas motores – por exemplo, uma criança com alterações motoras a nível da face, boca ou língua, pode não conseguir articular os sons de modo correto.

•   Défice auditivo – esta é uma das situações que deverá ser sempre investigada. A dificuldade na audição perturba muito o desenvolvimento da criança. O bebé com surdez profunda tem tendência a mostrar-se alheio e apático, revelando atraso no desenvolvimento motor. Não reage aos estímulos externos, nomeadamente quando os pais tentam interagir com ele, pode ficar deitado no berço, alheado da estimulação, optando por comportamentos repetitivos. O rastreio auditivo neonatal que atualmente é efetuado praticamente a todos os recém-nascidos permite detetar casos de surdez neonatal congénita, mesmo nos que não apresentam qualquer fator de risco. A intervenção poderá ser iniciada precocemente o que facilitará muito a integração da criança no seu meio ambiente.
No entanto, se o défice auditivo não for detetado, poderá ser a causa de um atraso na fala e há que pedir os exames necessários para afastar esta hipótese. Existem outras situações adquiridas de défice auditivo como, por exemplo, infeções virais (citomegalovírus, rubéola, sarampo), otites recorrentes ou otites serosas, pelo que será obrigatório pensar nestas causas e pedir os exames necessários ou mesmo referenciar a criança para uma consulta de especialidade.

•    Deficiência mental – uma história clínica bem feita e o exame objetivo completo da criança também poderão fazer pensar noutras causas para um atraso da fala. Por exemplo, se a criança apresenta sinais de atraso de desenvolvimento, a perturbação da linguagem pode estar associada. Nesta situação, a criança poderá ter de ser avaliada numa consulta de desenvolvimento.

•    Perturbação isolada da fala – nesta situação a criança não tem qualquer problema associado, simplesmente é preguiçosa e apresenta um atraso na linguagem quando comparada com as crianças da mesma idade. Há que estimulá-la, fazendo de conta que não a entendem e obrigando-a a falar. Nos casos mais graves dever-se-á recorrer à ajuda de um terapeuta da fala.

•    Problemas psicológicos ou psiquiátricos.

 

A gaguez

 

É frequente, por volta dos três anos de idade, a criança gaguejar sobretudo se está excitada e muito ansiosa por contar determinada situação – é como se pensasse mais rapidamente do que consegue falar. A gaguez manifesta-se sobretudo no início da frase. Devemos manter a calma dando-lhe tempo para que consiga dizer o que pensa. Se lhe chamarmos a atenção, só iremos contribuir para aumentar a carga emocional – temos de lhe dar tempo sem a pressionar. Se insistirmos chamando a atenção e manifestando preocupação poderemos estar a transformar uma situação transitória num problema crónico.

Relativamente à gaguez que surge na criança mais velha, nomeadamente na adolescência, poderá tratar-se de um problema mais difícil de solucionar e que poderá causar graves perturbações emocionais. Há geralmente uma incidência familiar e poderá ser útil a ajuda de um terapeuta da fala.

 

Alterações da dicção/articulação verbal

 

Por volta dos 4/5 anos a criança, geralmente, fala fluentemente ainda que a construção das frases possa revelar alguma imaturidade, em particular se quer falar muito depressa. Os tempos dos verbos por vezes não estão corretos – «sabo», «fazi», «di» – , mas se corrigida a criança irá repetir de modo correto. No entanto, se troca sistematicamente os mesmos sons ou se fala à «sopinha de massa», poderá ter indicação para ser avaliada por um terapeuta da fala.

Na realidade, se não for corrigida atempadamente poderá revelar dificuldades de aprendizagem com a entrada para a escola – classicamente as crianças escrevem como falam. Por outro lado, quanto mais tarde for corrigida maior será a dificuldade, já que a criança interiorizou os sons de forma errada.

 

Maria João Pratt

Para saber mais:

http://repositorio.esepf.pt/handle/10000/66

http://www.psicologia.pt/artigos/ver_artigo_licenciatura.php?codigo=TL0075


http://www2.ilch.uminho.pt/portaldealunos/Estudos/EP/AH/TCH/P2/Adriana/

 

http://repositorio.chporto.pt/bitstream/10400.16/1281/1/21_XXIII-Reuniao-2b_20-3.indd.pdf

http://www.arsalgarve.min-saude.pt/pais/iframe/linguagemc.php