Saber comunicar não é para todos mas, no caso de Júlio Isidro, revelou-se um dom. O seu percurso profissional confunde-se com a história do audiovisual em Portugal. Começou com 15 anos na RTP, passou pela rádio, foi jornalista, escreveu livros e hoje, aos 70 anos, continua no pequeno ecrã com «Inesquecível», um programa transmitido pela RTP memória. Passados 55 anos, continua a ser colaborador ocasional do canal estatal, casa onde apresentou alguns dos maiores sucessos do entretenimento televisivo. Para a história ficaram programas como «O Fungagá da Bicharada», «O Passeio dos alegres», «Arroz Doce» ou «E.T. - Entretenimento total».

Entrou no canal público com uma década e meia, para apresentar o «Programa Juvenil», «numa altura em que se vivia uma moral instituída muito beata», recorda. «Hoje, os programas juvenis parecem formatados, seguindo uma espécie de elogio da rebeldia. Os tempos são outros.  A minha geração tinha uma preparação diferente e ainda hoje isso me permite dar conta do recado quando, por exemplo, sou chamado de urgência para apresentar o programa da manhã da RTP», como recentemente aconteceu.

Assumir o papel principal num programa como o «Agora Nós» não o assustou. Muito pelo contrário! «É preciso apelar ao sentido pragmático para superar desafios. A isso junto a experiência, a confiança e a honestidade de dizer o que se está a passar, de preferência com graça, sem vedetismos. Isso é essencial para ultrapassar a insegurança, vencer os nervos e encarar a plateia», aconselha.

A análise que muitos profissionais não fazem

Ao contrário de muitos apresentadores da geração atual, Júlio Isidro não encara as suas responsabilidades de ânimo leve. «Devemos fazer uma análise às nossas capacidades, tentar ultrapassar questões psicológicas, ter noção dos limites. E trabalhar o tal poder de seduzir, cativar. Por vezes, basta começar com um sorriso. É isso que tento fazer, adaptando-me sempre à realidade do programa e do público», sugere.

Foi o que aconteceu quando apresentou programas como o «Programa Juvenil», «A Febre de Sábado de Manhã» ou o «O Passeio dos Alegres. «E tive frutos, pois esse público continuou e continua comigo», desabafa. «O segredo está na sinceridade, no motivar e dar luta ao ouvinte e ao espetador», confessa. Ao longo destes anos, destaca a experiência que tive na rádio com programas como o «Em Órbita» ou o «Febre de Sábado de Manhã».

Em televisão, ficaram-lhe na memória «O Passeio dos Alegres», «A Outra Face da Lua» e, agora, o «Inesquecível», espaços que lhe permitiram dar corpo ao que sempre soube fazer melhor. «Faço a apologia do culto da palavra como uma forma de me sentir bem no mundo, como um ato de sedução. Sei que nada se faz sem talento, sem trabalho. Acredito que tenho qualidades, mas nada nasce de forma espontânea e o talento pode não ser suficiente para sustentar uma caminhada», reconhece.

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 As críticas ao panorama televisivo atual

Depois do aparecimento das estações de televisão privadas, Júlio Isidro perdeu protagonismo no pequeno ecrã. «Profissionalmente, já tive altos e baixos mas consegui dar a volta por ser persistente e resiliente, pois, felizmente, tenho consciência que o público ainda me quer. Ainda que os critérios para se trabalhar em televisão tenham mudado e, na ausência de um perfil helénico, mantenho as meninges e os neurónios em perfeito funcionamento», afirma, sem rodeios.

Os programas marcam pelos períodos da vida, pelo conteúdo e recordações. Tem clara noção disso. Mas também não deixa de ter um olhar crítico. «Tenho noção de que a televisão mudou. Para melhor, no que se refere ao aparato técnico e, para pior, no que respeita ao desaproveitamento dos talentos dos portugueses face às apostas de produtos importados», critica o apresentador.

Ainda assim, como é seu apanágio, encara o futuro com alguma esperança e optimismo. «Vivemos sob a ditadura das audiências e dos números, mas prefiro pensar nas pessoas a que os meus programas podem agradar e valorizar o espetador», confessa Júlio Isidro, que chegou a apresentar noticiários no Rádio Clube Português. Apaixonado pelo aeromodelismo, frequentou engenharia mecânica mas acabou por desistir. «Podia ter sido piloto ou mecânico mas assim não aconteceu», confessou já publicamente.

Texto: Carlos Eugénio Augusto com Luis Batista Gonçalves (edição internet)