O que podemos encontrar no DVD “One (Her)man Show”?

É um espetáculo que reduz a duas horas cinco anos de estrada. É muito rico em termos de conteúdo e muito pessoal. E fiz um exercício, do qual não me arrependo nada, antes pelo contrário, estou orgulhosíssimo… Cortei todas as partes para lá da linha vermelha, para que o DVD seja familiar, ou seja, para que nenhum pai tenha de ir a correr apagar a televisão porque de repente estou a dizer os palavrões que normalmente saem num espetáculo ao vivo.

Este DVD é apenas centrado no espetáculo que deu no Tivoli em 2012 ou contém alguns extras?

É centrado no concerto e depois tem uma faixa bónus de uma canção inédita, “40 anos sempre a bombar”. onde toco todos os instrumentos e onde em três minutos faço o balanço dos 40 anos de carreira. É o brinde extra.

Neste trabalho, Herman revisita os imensos personagens que criou. Houve algum que o tenha marcado especialmente?

Não… O que me espanta é chegar a um sítio e ter milhares de miúdos de 13 ou 14 anos que sabem, por exemplo, as letras das cantigas do Serafim Saudade de uma ponta à outra. Espanta-me e encanta-me. Entra o génio do Carlos Paião também, como é óbvio. Da mesma maneira como também me espanta vestir o casaco do Estebes e sentir-me o Estebes, sentir-me portuense.

Estes personagens são os alter-egos do Herman?

Não sei como funcionava o Fernando Pessoa com os seus heterónimos, mas os meus bonecos existem em mim. Às vezes basta-me pôr o lenço da Maximiana e vivo intensamente aquilo que a personagem sente. Esse lado é muito curioso porque, se calhar, vem do facto de ter sido filho único e de ter passado toda a minha a juventude a criar bonecos imaginários para obviar a minha solidão. 

Não brincava com outras crianças?

Era filho único, num oitavo andar. No verão, não, tinha casa em São João do Estoril e convivia muito com os vizinhos. Mas quando acabavam as férias, voltava para as Avenidas Novas, para o meu oitavo andar, e estava horas, horas e horas na solidão. Aí criei um mundo próprio que acho que transportei para a minha vida artística. 

Ainda consegue fazer rir a sua mãe?

Sim. Ainda ontem (5 de dezembro) ela esteve num espetáculo, na primeira fila, e quando me meto com ela fica em pânico, fica lívida. Mas diverte-se imenso sim, e é uma grande fã.

E sua mãe continua a ralhar com o Herman, quando acha que ultrapassa os limites, ou já desistiu?

O problema não é esse. O problema é que eu não admito a ninguém que teça considerações sobre as minhas coisas profissionais, nem à minha mãe, e ela sabe isso… Ninguém tem o direito de o fazer, a menos que eu peça opinião. Para mim é um terreno sagrado, sou completamente feroz nesse aspeto.

O Herman fez alguns inimigos ao longo da sua carreira, alguns deles em situações bastante mediáticas. Esses inimigos ficaram para a vida ou as situações resolveram-se?

O problema dos países pequeninos é que o sucesso gera sempre inimizades. Por cada êxito que temos nasce um conjunto de pessoas que nos odeia. No fenómeno Cristiano Ronaldo, por exemplo, as mesmas pessoas que hoje o endeusam porque ele marcou estes golos, se ele falhar no próximo jogo são os primeiros a rezar para que ele caia de uma ravina abaixo. O amor-ódio existe sempre e quem não está preparado para viver com isso fica pelo caminho.

Sabe quem são os seus inimigos?

Os meus principais anticorpos são perigosíssimos porque não se veem, são as pessoas que sub-repticiamente vão inventando coisas e destruindo projetos. Mas foi sempre assim. Com a Amália foi igual e depois do 25 de Abril foi ainda mais exacerbado. Juntaram-se e acusaram-na de ser da PIDE, o Artur Agostinho teve de fugir para o Brasil… Acho que é um fenómeno quase internacional. Quando se tem êxito continuado por muitos anos, ganha-se uns anticorpos assustadores. E, depois, tens de te aguentar à bronca!

O fim anunciado do seu programa “Herman 2013” é consequência desse terreno minado?

Não. É por um motivo muito pragmático. As pessoas que estão à frente da RTP têm por mim uma grande estima. O que se passa é que a grande tarefa desta administração foi tirar a RTP1 da letargia em que estava. Infelizmente, os “talk-shows” em Portugal não têm a capacidade de atrair muita gente. O “Herman 2013” teve, em média, este ano 8,4 por cento de share, o que é frágil. Nessa perspetiva, por muito que me doa acabar o programa que adorava fazer, ponho-me na posição de quem dirige o canal, que tem de o fazer sobreviver, e olho para o Herman e penso em usá-lo de uma maneira que me possa trazer mais benefícios. É natural que volte à antena com outro projeto mais atraente.

Entretanto, vai regressar à estrada?

Ir para a estrada foi a melhor decisão que tomei. O programa só me ocupava um dia, a quinta-feira, e fiz imensos espetáculos por todo o mundo. O ano passado fui a Macau, Moçambique, Angola, Estados Unidos, França, Alemanha, dei uma volta imensa por todos os sítios onde há portugueses. E ainda fazia espetáculos por cá.

Ainda tem paciência para falar com os fãs?

Agora é que tenho! Nunca tinha tido. Fugia sempre a seguir aos espetáculos sem dizer nada a ninguém. Agora acaba o espetáculo e não saio sem os receber. 

Mas fugia dos fãs porquê? 

Não tinha paciência nem pachorra e achava que tudo me era devido. Quando somos novos estamos um bocadinho a borrifar-nos. Hoje, emociona-me ver uma plateia cheia com pessoas que tiveram de gastar 22 euros por bilhete e isso implica respeito.

O Herman é uma referência para a nova geração de humoristas. Revê-se neles?

Sim, revejo-me nalguns. Outros fui eu que formatei. Há muito bom humorista hoje em dia que não sabia escrever para televisão e fui eu quem transmitiu as técnicas. E ao fim de alguns anos de aprendizagem seguiram caminho. Orgulha-me imenso quando eles são gratos e invocam isso mesmo.

É mais difícil fazer humor agora ou é mais fácil?

É mais fácil. O mais difícil é que hoje em dia ninguém tem notoriedade, nunca nada “pára o trânsito” como parava nos anos 70 e 80. Nada do que se faz é verdadeiramente importante. Julgo que sou o último de uma época que ainda teve a felicidade de fazer personagens que perduram ao longo de 10, 20, 30 anos. Quais são os nomes de personagens de humoristas que ficam agora? Muito poucos. E os diálogos também não duram mais do que três ou quatro meses.

O Herman ainda consegue rir-se de si próprio?

Rio-me muito de mim próprio, mas não acho muita piada quando os outros se riem de mim. O humorista nunca tem muito poder de encaixe, é engraçado. Quando toca a nós não temos sentido de humor nenhum (risos).