Sabe quem é, gosta de si mesma. É resplandecente. Aprendeu que o autoconhecimento é uma ferramenta poderosa e um processo que nunca está concluído. Permeável ao mundo, aos 47 anos, Fátima Lopes quer continuar a retribuir tudo o que de positivo tem conquistado e recebido. «Acho que é muito importante desenvolver essa capacidade, porque é uma grande mais-valia para o nosso crescimento e felicidade», justifica em entrevista à Prevenir, revista para a qual fez recentemente uma produção fotográfica.

Frequentou seminários de psicologia positiva, lançou um livro sobre o que a vida lhe ensinou e dá formação em empresas na área da melhoria de competências. Quando percebeu que tinha de aprender mais sobre si mesma?

Tinha 27 anos. Era apresentadora há dois e lembro-me de me sentir desorientada. Tinha-me tornado figura pública, tinha trabalho, o meu casamento era tranquilo…

Estava tudo direitinho...

Sim, mas era só tudo direitinho... Eu sentia um vazio, tinha aquela sensação de que não sei o que estou cá a fazer. Já me questionava nessa altura, achava que a vida tinha de ter muitos mais sentidos do que aqueles que, aparentemente, nós lhe lemos. Questionava-me se percebia o que queria da vida. A resposta era não. Conhecia-me mal. Não sabia ouvir-me, que é uma das coisas que leva mais tempo a aprender.

Implica estarmos atentos a que sinais?

A tudo. Implica, por exemplo, ouvir as nossas angústias. Perceber que, se o coração fica apertado em relação a uma determinada decisão, é porque não estamos a escolher o que é melhor para nós. A maior parte das vezes avançamos sem nos ouvirmos e, só depois de batermos com  a cabeça, percebemos.

Como deu o primeiro passo para essa autodescoberta?

Depois de ter procurado algumas áreas que não me davam resposta, cruzou-se no meu caminho a pessoa certa [Christiane Águas, escritora e formadora do método Terapia pelo Vocabulário]. Mas esse encontro aconteceu porque era uma prioridade para mim.

Porque estava desperta?

Porque queria! Quando a pessoa interiormente tomou a decisão de encontrar no seu caminho, acredito que Deus coloca nele a pessoa certa, a porta certa, o sítio certo...

O que descobriu nesse encontro?

A Christiane trabalhava a área do desenvolvimento pessoal e a linha do pensamento positivo. Disse-me que há ferramentas para o autoconhecimento, para a descoberta de respostas dentro de nós, para arranjar estratégias que permitem viver a vida com mais equilíbrio, para perceber quais são as nossas ambições, os nossos sonhos. Foi uma mentora, tornámo-nos muito amigas, fiquei com ela até à sua morte.

Foi ela que me ensinou praticamente tudo o que sei. Despertou-me para a espiritualidade vivida de formas diferentes. Fizemos muitos seminários, retiros… Ensinou-me as bases do reiki, a passar e a sentir energia, a saber interpretar sinais na minha vida e na dos outros. Tudo isto se aprende.

Não é preciso ser dotado, tem de se treinar. É uma competência que todo o ser humano tem, só que há pessoas que entendem que é importante e investem nela e pessoas que acham que não serve para nada e nada fazem em relação a isso. Acho que é muito importante desenvolver essa capacidade, porque é uma grande mais-valia para o nosso crescimento e felicidade.

Veja na página seguinte: As competências profissionais que Fátima Lopes trabalha

Ainda hoje continua a trabalhar o lado espiritual? 

Sim, mas há dois anos senti que precisava de mais ferramentas e comecei a aprender técnicas de coaching com uma psicóloga que está habituada a trabalhar com atletas de alta competição e gestores de topo, pessoas que vivem níveis de stresse muito elevados, como é o meu caso.

Eu sou uma atleta de alta competição no meu trabalho. Todos os dias, sou avaliada quando saem as audiências e, há 21 anos, que sou avaliada todos os dias. Quando começámos, foi tão boa a sensação de que não sabia nada. De que, afinal, havia ainda tanto para aprender.

Parece imune ao stresse...

Não sou. Só é possível lidar com níveis de stresse tão elevados durante tanto tempo e mantermo-nos saudáveis, se fizermos o contraponto, caso contrário adoecemos.  Muitas pessoas sofrem de [síndrome de] Burnout [esgotamento] porque não tiveram ferramentas para baixar os níveis de stresse e viver momentos de equilíbrio, durante o dia.

Trabalham outros aspetos além de competências profissionais?

Quando preciso de trabalhar aspetos pessoais ao nível da psicoterapia, disponho-me a isso. Quem só fala de aspetos profissionais está a empurrar para debaixo do tapete as coisas que magoam e eu não quero isso. Magoa? Pois magoa, mas, então, vamos ver onde está a sua origem. Disponho-me a isso, sempre. Tudo o que eu for encontrando que é para ser arrumado é para ser trabalhado.

A par disso, faz retiros. O que aprende neles?

Aprendo cada vez mais sobre mim. São retiros de dois dias, com cerca de 20 pessoas, em que se fazem exercícios. Nem sempre tenho disponibilidade e já fiz, por exemplo, um retiro individual para o qual foi preparado um plano sobre aspetos que tenho de ultrapassar, potenciar.

Que exercícios se fazem num retiro? Dê-nos um exemplo…

Lembro-me de um exercício em que, através de indicações do terapeuta, fazemos uma viagem desde o momento em que estamos na barriga da mãe até ao presente. Nessa viagem, vamos encontrando aspetos que deviam ser trabalhados. A partir daí, podemos fazer um exercício para os desativarmos. Não deixaram de acontecer, mas já não nos fazem mal.

Quando o campo espiritual é trabalhado por pessoas que são honestas, quem faz praticamente todo o trabalho é a própria pessoa, caso contrário não muda nada na nossa forma de pensar, funcionar e de agir. Se assim não for, provavelmente não vou à origem e, como tal, o que quer que me tenha causado sofrimento será criado mais à frente.

Veja na página seguinte: O triângulo de desenvolvimento pessoal que Fátima Lopes valoriza

Dá palestras em empresas sobre o tema «Vida, compromisso e superação». Porque escolheu este triângulo?

Sinto que faz falta às pessoas perceber que é preciso fazer o que estamos a fazer, neste momento, as duas. Refletir, ir cá dentro… Não são palestras espirituais e não sou terapeuta, mas sei levar as pessoas a olhar para a vida de uma maneira diferente à que estão habituadas. A estratégia que eu delineei para estas palestras é, primeiro, obrigá-las a parar.

Saberem escutar-se, refletir, com a ajuda das várias análises que vou fazendo e de exemplos que vou dando e perceber que aquilo que, tantas vezes, lhes pareceu preto, se calhar, bem perspetivado, não passa de um cinzento claro e que não é inultrapassável. Partilho histórias que ouço, desde há 21 anos, de pessoas que viveram coisas que pensaria serem impossíveis de ultrapassar, mas que são verdadeiros testemunhos de superação.

Com eles, aprendi que o ser humano tem uma riqueza interior que não mais termina. Passo esses exemplos para que as pessoas possam olhar para a sua vida, redimensionando as coisas com o seu valor real.

Como é que as pessoas reagem?

Quando entro nas empresas, dispo-me da imagem de figura pública e apresento-me como a Fátima que fez um caminho, que tem as mesmas angústias de qualquer mãe, mulher e profissional e que, tal como eles, tem de dar provas no trabalho todos os dias.

Quando lhes mostro que estamos lado a lado e percebem o caminho que fiz e que também o podem fazer, as pessoas baixam os braços, deixam de estar à defesa. E aí começa uma conversa mais próxima. Começam a surgir questões…

Qual é a angústia mais comum?

O medo de falhar. O ser humano tem um medo horrível de falhar. O medo de fazer qualquer coisa em que se sintam totalmente incapazes. Noto, nestas palestras, que as pessoas têm muito baixa autoestima.

Mesmo quem tem cargos de liderança?

Sim, mas nesse caso têm técnicas mais sofisticadas de disfarçar.

O que lhes diz para as ajudar a libertarem-se do medo do fracasso?

Procuro fazer-lhes perceber que sofrer por antecipação serve apenas para bloqueá-las de conseguirem fazer bem. Se persistirem no medo, a única coisa que estão a fazer é garantir a elas próprias que estão a falhar e, se não é isso que querem viver, não é isso que têm de alimentar dentro delas. Sofrer por antecipação não serve para nada, simplesmente tira-nos energia, criatividade, tira-nos a alegria do vamos lá experimentar...

Veja na página seguinte: O que a apresentadora faz para medir a felicidade

«Ser feliz dá muito trabalho», disse-nos há três anos. Como se mede a felicidade? Podemos ser felizes e não saber?

Às vezes, somos felizes e não sabemos porque estamos aqui mas temos os olhos postos lá à frente. Não saboreamos. E, às vezes, as pessoas não percebem que são felizes porque não dimensionam a felicidade no seu tamanho real. Continuam a achar que a felicidade tem de ser algo avassalador, como uma criança que assiste, pela primeira vez, a um fogo de artifício.

Não tem de ter essa dimensão, pode ser tão simples e tão bom como o abraço que recebo dos meus filhos, quando me levanto. Depois, há ainda outro aspeto. Só quando as pessoas passam por uma coisa muito má é que, olhando para trás, dizem que foram felizes. Para reconhecer os momentos felizes, às vezes, é preciso passar pelo contraste para depois dizer «Isto foi bom, como é que eu não valorizei?».

O tópico do cuidado com a imagem é abordado nas suas palestras?

Não e as pessoas não colocam questões sobre isso. Aquilo que sinto que mais estão a precisar é de gostarem delas por dentro. O que efetivamente as atormenta é não serem capazes de reconhecer o seu valor. Quando comecei este caminho, na verdade, também eu era uma pessoa à procura de gostar de mim, de me aceitar como sou. Nem melhor nem pior, de me aceitar assim, como sou.

E, aos poucos, fui descobrindo as coisas que tenho cá dentro, que são minhas, que são muito bonitas e que hoje valorizo. Por isso, aceito sempre a crítica construtiva, mas não permito que ninguém me desvalorize. Não permito que ninguém me puxe para uma zona onde eu duvido de mim, das minhas competências, onde me questiono se sou uma pessoa boa ou não.

Hoje, já deve ser raro fazerem isso ou não?

Sim. Mas houve algumas tentativas. Quando acontece, eu ponho a pessoa imediatamente no sítio, sou muito assertiva. Sou Touro.

Sente que o empenho com que cuida do seu desenvolvimento interior, emocional e espiritual, tem efeitos benéficos na sua saúde?

Tenho a certeza absoluta disso. E acredito que alguns sintomas podem também ser um sinal para refletirmos e que, se soubermos o que significam, mais facilmente os ultrapassamos, porque na sua origem pode estar um padrão de pensamento. A nossa mente é maravilhosa, é uma caixa super poderosa e tem um potencial infinito, mas trabalha para nós ou contra nós, e, em ambos os casos, fá-lo com o mesmo empenho.

Que respostas é que alguém que já se conhece bem, ao ponto de partilhar aquilo que descobriu com os outros, ainda procura?

Limito-me humildemente a colocar na minha lista de objetivos ter sempre tempo para investir na minha vida espiritual e no meu crescimento interior. E faço-o com a mente totalmente aberta.

Texto: Nazaré Tocha com Carlos Ramos (fotografia)