O movimento O MAIOR SORRISO DO MUNDO nasce em 2013 para reforçar esta mensagem e representa alegria, amor, saúde e bem-estar.

Figuras públicas e empreendedores aderiram à causa e partilharam os seus testemunhos. Leia a história de Luís Filipe Borges.

O que o faz sorrir?

Luís Filipe Borges: Sei que é um cliché, mas as crianças fazem-me sorrir. Não têm limites no pensamento e imaginação. Há um tempo vi um programa na televisão onde eram apresentados desenhos minimalistas a adultos, um neurologista questionava o que viam nessas imagens e estes diziam no máximo duas coisas, depois mostravam os mesmos desenhos às crianças, que diziam uma dúzia de coisas diferentes. No meu trabalho faço um esforço para manter um contacto com o meu “eu” antigo, tento ser saudavelmente infantil. Os verdadeiros amigos fazem-me sorrir. Expressões da minha mãe que só ela é que tem também.

Expressões açorianas?

Luís Filipe Borges: Sim, os sotaques fazem-me sorrir. Gosto do orgulho que as pessoas têm dos seus sotaques. Tenho pena de ter perdido o meu.

Aquilo que o faz sorrir é o mesmo que o faz feliz?

Luís Filipe Borges: Fazer feliz é mais complicado. O sorriso está para a felicidade como uma ervilha está para uma lagosta [risos]. As ervilhas sabem bem com ovos escalfados, mas a felicidade é mais difícil de atingir, já é uma lagosta. A felicidade não é um estado, não é uma estação em que chegamos e ficamos, é efémera. O que me faz feliz é o que faz feliz qualquer ser humano, quando nos sentimos confortáveis com outra pessoa, quando estamos realizados profissionalmente, quando estamos reunidos no Natal com as pessoas que amamos e somos invadidos por um sentimento de paz.

Já teve a sua “lagosta”?

Luís Filipe Borges: Já [risos], várias vezes. Acho que a felicidade está sobrevalorizada. As pessoas falam demasiado da felicidade. É uma palavra gasta, falamos muito nela, mas fazemos pouco para a atingir. A felicidade é uma coisa rara e deve-se apreciar enquanto dura. Ninguém fica feliz aos 25 anos e depois que dure o resto da vida, é algo que tem de se conquistar, lutar para manter. É um daqueles casos em que falar é fácil e conseguir é mais complicado.

Saiu um estudo que refere que os portugueses estão a sorrir cada vez menos

Luís Filipe Borges: Não conhecia o estudo, mas é normal

Portugal também bateu o record de consumo de antidepressivos no país, o que falta aos portugueses?

Luís Filipe Borges: Estabilidade e a estabilidade para mim é poder viver o conforto do presente sabendo que estamos à espera de um futuro. O que os portugueses sentem é tudo menos essa estabilidade. As pessoas não sabem o dia de amanhã. Embora nunca tenha ouvido na abertura do telejornal uma notícia sobre a boa situação económica do país, a verdade é que piora ano após ano e as pessoas sentem-se angustiadas. As pessoas não sabem se conseguem manter um emprego. As pessoas que estão a começar a actividade profissional não a conseguem começar. Hoje em dia tem-se medo do amanhã. Por isso é normal que precisem de ajuda clínica.

Que conselho tem para os portugueses que perderam o sorriso?

Luís Filipe Borges: Não quero dar conselhos, o que acho como profissional na área em que estou é que sinto uma responsabilidade acrescida no meu papel, na minha profissão. O comediante tem uma missão muito nobre que é: permitir uma alienação saudável às pessoas que nos veem. Oferecer sorrisos, oferecer um escape, um intervalo na angústia que sentem. E não nos devíamos limitar a distrair e entreter, acho que devíamos tocar na ferida ao mesmo tempo que oferecemos sorrisos.

Mas já o fazem.

Luís Filipe Borges: Sim, sim, um dos grandes papéis da comédia é tirar os “poderosos” do pedestal imaginário. Colocar esses poderosos ao nosso nível ou abaixo de nós faz as pessoas sorrir. É o mesmo mecanismo cerebral de quem sorri ao ver uma pessoa a “cair numa casca de banana”. Nós sorrimos porque estamos de pé.

Na sua profissão, acha que o sorriso funciona como uma terapia para o público?

Luís Filipe Borges: O feedback mais comovente da minha vida e que vou contar, nunca vou esquecer. Ainda no tempo de “A Revolta dos Pastéis de Nata”, há um dia em que estou num jantar com amigos no Bairro Alto, vou ao balcão pedir uma bebida e um rapaz explica-me que é o proprietário do espaço e conta-me que o companheiro tinha morrido há três meses e achava que ele iria gostar de saber que teve a oportunidade de me dizer que nos últimos tempos a única coisa que ele via na televisão e que lhe arrancava um sorriso era o meu programa. E eu passei de gargalhadas com amigos para lágrimas pesadas, porque não estava a acreditar no que esta pessoa me estava a dizer. Foi avassalador, não sabia o que lhe havia de dizer, estava profundamente comovido e não lhe conseguia dar nada em troca. Às vezes quando estou mais desanimado, lembro-me deste momento. Nós podemos fazer muito mais pelas pessoas do que aquilo que imaginamos.

Qual é que foi o momento da sua carreira em que acha que fez sorrir mais os portugueses?

Luís Filipe Borges: Belíssima pergunta, não faço ideia, nunca tinha pensado nisso. Acho que tenho um percurso, gostei que tivesses utilizado a palavra “carreira”, senti-me lisonjeado, mas sou demasiado novo. Talvez tenha sido no meu primeiro programa “A Revolta dos Pastéis de Nata”. Embora ache que hoje sou melhor profissional, quando tinha 27 anos e me estreei em televisão tinha uma pureza e ingenuidade que hoje não tenho. A memória que tenho desse tempo é que muitas vezes fazíamos asneira, mas existia muita ternura do público, havia a desculpa de estarmos a começar.

Já passou por alguma adversidade?

Luís Filipe Borges: Males de amor, mortes, doenças.

Que ferramentas utilizou para as ultrapassar?

Luís Filipe Borges: O trabalho é uma grande defesa. Sempre foi a minha melhor arma. Mas tenho uma grande vantagem: adorar aquilo que faço! Quando acordo nunca pensei “ tenho de ir para o emprego”. Não vejo como um sacrifício, gosto mesmo do que faço. Outra ajuda são as pessoas em quem confiamos. Não faz bem nenhum guardar dramas, devemos procurar ajuda de quem nos ama. O dia em que conseguimos ironizar ou fazer humor com uma adversidade é sinal que saímos da fossa. E para isso é necessário um interlocutor, um público.

Já utilizou essas adversidades enquanto tema para algum trabalho?

Luís Filipe Borges: Sim, para guiões por exemplo e isso acaba por ser um exorcismo saudável.

Quero que pense numa história que achs que vai inspirar os seus netos daqui a algumas décadas.

Luís Filipe Borges: Tenho uma história real e inspiradora até para os tempos que atravessamos. É sobre um amigo que se formou em Belas Artes, o sonho dele era ser pintor. Teve dificuldade para entrar no mercado de trabalho e acabou por se dedicar ao design, fez uma empresa com um sócio, e percebeu tarde de mais que estava a ser roubado pelo mesmo e acaba por sair da empresa sem nada  e nessa altura estava prestes a casar. Existiu uma explosão de blogues, ele começa a escrever num blogue com vários amigos e deu muito nas vistas por escrever tão bem, tornou-se guionista até que a produtora onde trabalhava tem de dispensar pessoas e ele volta a ficar com “uma mão à frente e outra atrás”, entretanto já casado e com uma filha. Para se entreter e não ficar deprimido volta às aulas de pintura e pinta o retrato de um familiar, outras pessoas veem esse quadro e perguntam pelo autor. Com tantas encomendas, chega a uma altura em que começa a viver disso. Fez uma exposição com 12 quadros, vendeu 11, o que é extraordinário para uma primeira exposição. Este meu amigo, sem nunca se deixar abater, já viveu três vidas e agora é como se o ciclo tivesse fechado com a primeira paixão que tinha pela pintura. Ele foi designer, foi argumentista, ele é pintor. Eu não quero dizer o nome dele porque ele é mesmo muito modesto e depois vai ficar chateado comigo [risos].

O que lhe falta fazer?

Luís Filipe Borges: Ser pai. Escrever e realizar uma longa-metragem e escrever romances.

Entrevista: Mafalda Agante

Mafalda Agante

Associação Sorrir