Quanto aos seus pais, como foram os seus pais como avós?

G.M.:­ ​Bom os meus pais adoravam os meus filhos, a minha mãe então roubava-me as crianças que era uma coisa que eu nunca vi nenhuma avó roubar as crianças, eu chegava a casa tinha uma empregada e dizia ​“Onde é que estão as crianças?”,” A sua mãe veio cá e levou-os!” “Levou-os?” , “Mãe, mãe mas tu levaste o Pedro e a Julie?”, “Ó filha pois é eu fui buscá­-los, estava cheia de saudades!”, “Ó mãe mas então eles têm de vir para jantar.” “Ah não eles hoje ficam cá!”​, mas ela fazia isto sem me dizer porque ela sabia que eu depois impunha um bocado de regras, não desculpa eles têm que ir para a cama, eles têm de jantar. Adoravam, adoravam os netos e os meus filhos adoravam-nos e foram uma enorme ajuda, eu não sei o que teria sido de mim e por consequência dos meus filhos se não tivessem sido os meus pais. Porque olhe eu fui mãe com 17 anos, ninguém quer ser mãe com 17 anos, aquilo é uma chatice, agora dá de mamar, agora dá o biberão, agora a criança berra, agora não dorme, olha agora está com cólicas, depois a Julie nasceu eu tinha 20 anos, mas eu tinha uma profissão​ ​e na altura trabalhava­-se À séria, eu ia para o teatro ás duas da tarde e saía ás duas três da manhã e o que é que eu fazia ás crianças? Muitas vezes levei ou um ou outro para o teatro nomeadamente às matinés porque não tinha com quem deixar os miúdos e ás vezes os meus pais também não podiam, mas quer dizer isto era uma vez quando o rei faz anos. Quer dizer, eu sei que tudo se cria como costuma dizer o povo, mas eu ficava muitíssimo mais descansada, para já os miúdos adoravam não é, claro a minha mãe deixava-os fazer tudo como é evidente.

Então aquela máxima: Os pais educam os avós deseducam, no caso da sua mãe aplicava-se…

G.M.:­ ​No caso da minha mãe era a anarquia completa eles só não destruíam a casa à minha mãe e ela a rir­-se e a achar que eles eram uns queridos.

Coisa que não acontecia na sua casa?

G.M.:­ ​ Não! Mas a minha dizia tu “tratas os teus filhos à tropa” e eu dizia “mãe eu não tenho dinheiro para estar a fazer casas de três em três meses porque as crianças querem estar aos saltos em cima”… “Isto não é para estar aos saltos, os meninos têm de sentar nos sofás como as pessoas, os meninos têm que ir para a cama e têm que se deitar como as pessoas e os meninos têm de comer como as pessoas e esse foi sempre o meu lema”. A minha mãe não, a minha mãe achava que tudo que as crianças faziam era uma maravilha extraordinária e portanto estragaram-nos completamente, graças a Deus eu hoje com os filhos deles não sou assim e também já começaram a perceber. Portanto tive o enorme privilégio de os meus pais estarem vivos e adorava que eles continuassem vivos agora para conhecerem as minhas netas.

Foi avó nova também?

G.M.:­ ​Então pois se eu tive um filho com 17 anos pela lei natural das coisas também seria uma avó nova, não é?! Quer dizer eu até pasmo como é que ainda não sou bisavó, bom eu nem quero falar nisso! Não quero falar nisso não é por nada, quero ver se a Catarina faz os mestrados...

Como foi olhada por ser mãe aos 17 anos?

G.M.:­ ​Quando eu fiquei grávida do meu filho as pessoas riam quando eu passava, hoje em dia eu farto-me de ver raparigas jovens, algumas com 17 anos também com crianças, ás vezes estou no café a ouvir conversas das mães a falarem dos netos das filhas pois é muito nova com 17 anos, 18 anos, no meu tempo foi um pecado mortal, portanto está a ver, realmente em 30 anos isto mudou completamente. As mentalidades mudaram não sei se é para melhor, se é para pior nem é isso que me interessa, acho que tudo mudou! Há uma grande liberdade mesmo a forma como os putos falam com os pais, alguma vez eu ou os meus irmãos nos lembrávamos de perguntar por exemplo sobre sexo, perguntar ao meu pai e á minha mãe alguma coisa que pudesse, mãe o que é um espermatozóide por exemplo, alguma vez é que nem pensar! Entretanto a minha neta mais pequenina aprendeu lá o que era os espermatozóides, agora tem 10 anos, mas com 9 um dia chegou a casa e disse­-me “Ó vó já sei o que é um espermatozóide!”​ ai é filha, ​“Ó vó oespermatozóide vai para o óvulo!” ​    ​onde é que tu … ? “Ah foi na aula foi a professora.”​, Eu não sei se é bom se é mau, mas o que não há dúvida nenhuma é que no meu tempo isto era impensável, era impensável!.

​E o que é que sentiu a primeira vez que ouviu a palavra “avó”?

G.M.:­ ​Estava em Macau, … apanhei uma depressão que tive para aí uns 4 dias que eu nem me mexia. Eu tinha 41 anos, aliás tinha 40 quando soube, tinha 41 quando a Catarina nasceu, não foi terrível coitadinha da minha querida neta, mas não é por isso é porque uma pessoa sai de Portugal por 7 meses ou 8 meses e dizem que vais ser avó … Desculpa??? Bom foi uma semana que não foi fácil, não foi fácil porque para nós, talvez na minha cabeça, como as minhas avós já tinham uma idade que para mim mesmo eu com vinte e tal anos, trinta anos a minha avó já tinha sessentas e muitos portanto havia ali uma distância, eu tinha 41 anos e essa notícia não me caiu bem, sou franca não me caiu bem e apanhei uma depressão. Meu Deus do céu! E agora o que é que eu faço à minha vida?

Decidi que iria fazer exatamente a mesma coisa que sempre fiz. Sobre ter namorados­, sim senhora, vou ter namorados. Fazer topless na praia, ­ vou continuar a fazer topless na praia…

No fundo manteve a sua natureza?

G.M.:­ ​Exatamente, exatamente! Mesmo em relação à Catarina que passou muito tempo comigo pequenina e depois com 4, com 5 e com 6 porque os pais estavam em Coimbra a tirar os cursos, bem eu ia para a praia com a Catarina e começava-me a despir e a Catarina olhava para mim e olhava para as outros e olhava para mim e olhava para os outros, nunca lhe dei satisfações porque entendi que não tinha que dar satisfações a uma criança de sete anos se ela me perguntasse alguma coisa eu respondia, nunca perguntou nada eu percebi que aquilo nas primeiras vezes ela não se sentia muito á vontade, percebi mas fiz de conta que não percebi e ainda bem que o fiz porque passado dois ou três anos era toda a gente de mama ao léu, por isso é que eu lhe digo que fui sempre bocadinho mais para a frente.

​Tem que haver sempre alguém a dar os primeiros passos não é?

G.M.:­ ​Exatamente! E ela nunca foi deprimida, não é não sei o quê, portanto muito pelo contrário, ás vezes digo ​“Ah tou tão velha lembro­me de ti pequenina deitada aqui ao meu lado!”, “ Ó vó! Epá ó vó tu não estás velha, tu tens mais idade, tens mas tu vai para a rua e tu vê a maior parte dos avós, tu andas de jeans, tu andas de barriga ao léu, fazes topless, (agora já não faço), tu és uma mulher lindíssima e não sei quê, tens imenso humor!” ​,​ “Pois é Catarina mas não há dúvida nenhuma que os tenho, não é?!”, “ Ó vó está bem mas ainda bem que os tens assim do que tê-­los de maneira pior, tens saúde ó vó…”

Principalmente com a Catarina hoje consegue ter o papel de neta e de amiga, não é?

G.M.:­ ​A Catarina viveu comigo de bebé, eu ia buscá-la a Coimbra quando ela tinha nascido, eu ia buscá­-la ao meu filho, ele telefonava a dizer que estavam em exames e a pedir para a ir buscar e eu ia, aí eu também roubava a Catarina portanto a minha relação com a Catarina é uma relação quase de mãe até uma certa altura porque ela era realmente muito pequenina e a partir de uma certa idade passou a ser uma relação que é um misto, é um bocado como ela diz, a” minha avó é a minha mãe de vez em quando, é a minha irmã mais velha e é a minha avó”. Falamos de tudo, rimos imenso as duas, viajamos as duas, ás vezes eu também discuto com ela por causa dos ipods e dos ipads é uma viciada nessa treta e tenho o maior orgulho na minha neta Catarina, a outra é muito pequenina mas também é ótima, mas quer dizer na Catarina tenho o maior orgulho porque ela fez­-se realmente numa lindíssima mulher, não tem peneiras, não é invejosa, tem um coração de ouro, faz voluntariado com as crianças ...

Vive perto de si?

G.M.:­ ​Não a Catarina não, mas como a Catarina passa o dia em Lisboa, vai para o escritório de advogados em Lisboa, esteve no ISCTE a fazer o curso, ainda à bocado ela me telefonou a dizer ​“ Ó vó amanhã vou dormir a tua casa porque tenho um jantar…”​, telefonamo­-nos todos os dias várias vezes, e ela tem um problema e a primeira pessoa a quem ela telefona é a mim.

​E há coisas que ela tenta esconder do seu filho e da mãe?

G.M.:­ ​Não, não, ela tem uma excelente relação com a mãe, ela adora a mãe e ainda bem que sim, a mãe também tem sido uma mãe extraordinária. Com o Pedro é uma relação um pouco mais distante porque o Pedro não é, digamos assim, o Pedro adora­-a e ela adora o pai, só que eu vejo um pouco aquela relação não ao extremo como eu tinha com o meu pai, à coisas que a Catarina, não é nada de mal mas por exemplo namorados e não sei quê, a Catarina não diz ao pai, no entanto diz­-me a mim logo, diz à mãe… E pronto e é ótimo e adoro as minhas netas, estou à espera que a pequenina tenha mais uns anos para ver como é.

​Então e alguma delas gostaria de seguir o ADN da família e ser ligada às artes?

G.M.:­ A Catarina,sempre gostou imenso de teatro, gosta imenso de música e gosta de ir e gosta de perceber, mas não passa daí graças a Deus.

A pequenina vai ser um caso sério, a pequenina o pai é brasileiro, portanto tem todas as coisas dos brasileiros, há a bunda não é, ouve uma música e aquilo não sei o quê, não sei o quê… A pequenina eu não sei se ela tem muito talento não, mas é muito inteligente, é uma miúda com uma rapidez que eu até fico maluca. Ela hoje está com 10 anos, mas já era assim quando tinha 5, apanha tudo, não sei se tem, mas ela tem, porque o pai também é ator, a mãe também é atriz, a avó é atriz, o bisavô era ator, o outro avô é músico portanto, quer dizer a Maria Rita está um bocado envolvida num ambiente de genes, vamos continuar nos genes, que eventualmente algures lhe terão passado, o que não há dúvida nenhuma que a Maria Rita se o quiser terá toda a facilidade em ser.

​E de personalidade, das duas qual é a que acha que se identifica mais consigo ou que herdaram mais de si?

G.M.:­ ​ A Catarina quando diz que isto é assim é assim mesmo, também é.Também leva a dela avante, agora é de outra forma. Com a Maria Rita é assim, é assim, é assim pronto. A Catarina também é assim, mas ouve, se você disser ó Catarina tu vê­-lá, tu não achas que isto pode dar resultado ela ouve. Sinceramente eu acho que nenhuma delas a esse nível tem muitas parecenças comigo, mas atenção eu também sou o que sou pela vida que tive.

Foi degrau a degrau é que foi criando a sua personalidade, não é?

G.M.:­ ​Exatamente. Quer dizer, eu sou o que sou porque vivi na época em que vivi…

​Lá está não é uma coisa genética foi a vida que fez com que fosse assim.

G.M.:­ ​Exatamente porque eu devo ter “n” coisas dos meus pais é evidente que tenho, mas eu costumava dizer tenho uma família católica que não me ostraciza, mas há aquele peso, os meus amigos têm de ser todos do teatro porque inclusive as mães dos outros não queriam muito que os meninos se dessem comigo, eu tenho que sobreviver nesta selva e atenção eu sobrevivi sem drogas, eu sobrevivi sem me prostituir para subir na vida e eu tinha as portas abertas para tudo.

No fundo criou uma carapaça para se proteger?

G.M.:­ ​Completamente, completamente, carapaça essa que persiste, como estou mais velha tenho mais elasticidade, tenho mais elasticidade…

Era aquilo que falávamos as pessoas acham que não há fragilidades, mas elas estão cá!

G.M.:­ ​Completamente, mas completamente! Mas eu nunca disse que não tinha, mas isso faz parte do ser humano, agora há que tentar enfrentar a vida, eu não digo da melhor maneira porque isso a gente nunca sabe, hoje o que parece bom amanhã não é, eu digo é que com um certo humor e eu felizmente sempre tive, eu sempre consegui fazer das coisas péssimas que me aconteciam fazer o contraponto do “nonsense”, do “nonsense”, mas essa era a minha questão de sobrevivência para mim própria porque eu ás vezes pensava: Meu Deus se um dia eu me sento no sofá a pensar na minha vida a partir de x anos até agora, os homens, as crianças, tudo, o trabalho, os problemas financeiros, tudo quer dizer eu dou em maluca, o que é que eu vou fazer no meio disto tudo com duas crianças, sozinha não estava porque tinha os meus pais, mas eles também não estavam lá para tudo e eu também não queria que eles estivessem para tudo porque há coisas que são minhas e os meus problemas foram todos meus, ninguém disse para eu fazer nada e portanto chega uma certa altura que você pensa eu tenho que sobreviver, recuso-­me a ir para os psiquiatras, recuso-­me a tomar comprimidos, recuso-­me a ter depressões. Os meus amigos mais próximos, os que me conheciam melhor diziam que eu parecia o sempre em pé, pumba levava de um lado tumba, tumba levava do outro tumba, epá para a frente é que é o caminho. O meu pai costumava dizer que eu tinha escolhido a maneira mais difícil de estar na vida, independência, viver com o meu próprio dinheiro,não tentar arranjar casamentos porque o fulano tinha dinheiro e podia pagar, empandeirar os pais das crianças e ficar com duas crianças naquela época, ser atriz, não ficar calada, ter as minhas opiniões muito próprias mesmo que fosse um disparate, o meu pai dizia realmente não te falta nada para teres uma vida complicada. Eu acho que sim, acho que ele teve alguma razão, acho que sim de qualquer maneira muitas vezes me interrogo será que ele me dizia isso para ter uma vida melhor? Então e os outros todos que eu conheço que não são nada disso e que têm uma vida de merda ou pelo menos têm uma vida que eu não queria com certeza, está a ver o sacrifício estar toda a vida ali a fazer, aliás que é como eu digo no espetáculo por causa dos orgasmos não é, há mulheres que durante 30, 20, 10, 15, 30 anos têm que fingir quer dizer é uma neura, está a perceber?!

Continua