Existem pessoas que cortam amarras e largam tudo para embarcar naquela que pretendem ser a viagem a sua vida.

Fazer uma volta ao mundo é, para alguns um objetivo de vida, para outros uma ideia descabida e para muitos um sonho eternamente adiado, mas o certo é que cada vez há mais pessoas a aventurarem-se. Fomos saber porquê e o que é preciso para entrar numa viagem destas.

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Em janeiro de 2012, Filipe Morato Gomes, jornalista, partiu para a sua segunda viagem à volta do mundo, mas desta vez levou companhia, a mulher e a filha de cinco anos. O objetivo era mostrar ao elemento mais jovem da família que «habitamos numa pequena gota de um grande oceano chamado terra, que o globo-almofada pendurado no seu quarto é, afinal, feito de uma enorme
diversidade», justifica. Não consegue comparar as duas viagens.

«O simples facto de viajar sozinho ou acompanhado muda tudo. E depois o facto de nesta viagem levar uma criança tornou-a ainda mais diferente. O ritmo da criança é outro, os seus interesses e horários são outros, o seu humor muda facilmente, a sua resistência
é menor. Diria que esta viagem foi muito mais intensa emocionalmente, enquanto a primeira foi mais exigente
fisicamente», refere.

Oceano Pacífico

Viajaram sobretudo pelos países banhados pelo Oceano Pacífico. «Escolhemos destinos fáceis em termos físicos (evitámos
as grandes altitudes e os trekkings em montanha) e onde os problemas de saúde fossem menos prováveis de acontecer
e/ou mais fáceis de solucionar», realça o jornalista, que passou por 13 países. Quanto ao alojamento, dormiram em hostels, pousadas, em casa de amigos, autocaravanas e até acamparam.

Acabado de regressar, o jornalista faz um balanço muito positivo e não tem dúvidas de que a filha é hoje uma criança diferente. «Seguramente que todas as experiências que vivenciou, convivendo com meninos diferentes e costumes distintos servirá para a tornar numa cidadã mais tolerante. E depois há o inglês. É incrível como em tão pouco tempo, por uma questão de
necessidade, evoluiu de forma espetacular no domínio da língua», sublinha.

Quanto aos melhores momentos aponta «a estadia em Tanna em Vanuatu e a passagem pela beleza estonteante da Nova Zelândia, onde tivemos oportunidade de ver Saturno num Observatório de Astronomia» mas também «os tempos passados em El Nido nas Filipinas, mergulhar com tubarões-baleia na Austrália e com mantas nas Fiji e as caminhadas nos parques naturais Yosemite e Zion», acrescenta ainda.

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Desenhar as cidades

Dar a volta ao mundo a desenhar em pequenos cadernos (os sketchbooks) e cruzar-se com urban sketchers de todo o lado é o
grande objetivo de Luís Simões, que anda desde março de 2012 na estrada, numa viagem que vai durar cinco anos.

«A contagem foi sendo feita por etapas. Planeei várias vezes ada continente com base nos relatos que lia e no tempo que queria desfrutar em cada cidade para a poder desenhar. Chegava sempre a um total de quatro anos e alguns meses e quando comecei
a escrever o projeto surgiu a ideia de fazer cinco continentes em cinco anos e assim ficou», explica o viajante português.

O motion designer optou por viajar por terra ou mar. «O avião será sempre a última opção, porque é um tempo morto
sem grandes acontecimentos», diz. Para dormir, Luís Simões utiliza preferencialmente o sistema de couchsurfing. Partiu porque sentia que estava na altura de fazer algo memorável, numa altura em que o seu trabalho já não lhe dizia grande coisa. Na definição do percurso, olhou para as condições atmosféricas.

«O objetivo é estar nos hemisférios na altura do verão ou períodos secos do ano, para viajar com menos roupa e conseguir desenhar nas ruas». No caso da Europa, por estar num único hemisfério, decidiu passar o verão no norte e o inverno no sul. «Outra escolha foi a de deixar o continente africano para o último ano. Vou estar melhor preparado para enfrentar as dificuldades
e mais experimentado artisticamente para retratar um dos continentes que mais vontade tenho de visitar», acrescenta.

Em boa companhia

Durante este primeiro ano, Luís Simões tem tido, por vezes, a companhia dos pais que estão a fazer um périplo pela Europa
em autocaravana, uma decisão que o surpreendeu. «Inicialmente, receberam muito mal a ideia de eu largar tudo e andar cinco
anos a viajar e desenhar sem um rumo certo. Mais tarde, confrontaram-me com a hipótese de virem comigo», confessa o viajante português.

A sua companhia tem sido um dos momentos altos da viagem. «A nossa relação está mais próxima da de grandes amigos, realça. O outro momento que destaca é a chegada ao topo do Velho Continente, o Cabo Norte. «Foi uma realização pessoal num dia especial,
o do meu 33º aniversário», afirma. O pior foi ter-se apaixonado em Helsinborg na Suécia e depois ter que se «despedir sem saber quando a voltaria a ver», lamenta.

Viajar para comer

«Estar à mesa com famílias de outros países para aprender mais sobre gastronomia e perceber como as pessoas viviam
esse momento» foi o ponto de partida para a viagem à volta do mundo do chef Kiko Martins e da sua mulher. Durante 14 meses, famílias de todo o mundo abriram-lhes a porta de casa não só para mostrar os hábitos gastronómicos, mas também para dormir. No entanto, «ao fim de quatro meses, vimos que também era importante termos o nosso espaço e resolvemos intercalar com algumas estadias em guesthouses económicas».

O itinerário foi escolhido de acordo com o interesse gastronómico de cada país. «Na Europa, interessava-nos, sobretudo, França
e Itália, no Médio Oriente, Turquia, Líbano, Jordânia e Síria, na Ásia, Índia, China e Japão e, no continente americano,
México, Brasil e Peru. Os restantes 14 países foram surgindo, até porque queríamos também que o imprevisto nos fosse guiando
pontualmente», revela Kiko Martins.

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Sabores inesquecíveis

Os países mais surpreendentes a nível gastronómico foram o Vietname e o Peru. «O primeiro consegue misturar a subtileza da cozinha asiática com o conhecimento da francesa, o resultado é uma panóplia de sabores incrível. O Peru pelos produtos autóctones maravilhosos e únicos, como os mais de quatro mil tipos de batata, o milho e o feijão», refere Kiko Martins.

«Lima é uma cidade onde vale a pena ir para comer, é a capital gastronómica da América Latina», sublinha mesmo o chef português. Outro país que Kiko Martins destaca é a China. «Está para a Ásia como a França para a Europa. A comida é ótima e muito diferente da que estamos habituados».

Quando lhe pedimos para escolher o prato de que mais gostou em toda a viagem, Kiko Martins aponta o pho, uma sopa vietnamita. «Experimentei-a no dia que cheguei a Ho Chi Min, num café de rua, e assim que meti a primeira colher à boca, viajei literalmente», desabafa.

Partilha à mesa

Kiko Martins, depois de tudo o que viu, realça a sorte que temos por viver em Portugal. «Apesar de todas as dificuldades,
somos um dos países mais ricos do mundo e nem nos apercebemos disso», constata. A nível profissional, a viagem trouxe-lhe excesso de informação. «Mas neste momento já estou mais elucidado e vou abrir um negócio em breve; em termos familiares, ensinou-me que temos de ter mais tempo para construir relações com os outros e a mesa é um excelente local para que isto aconteça. O verdadeiro sabor da comida não reside só nos alimentos mas também na partilha», remata.

A bagagem ideal

De acordo com estes viajantes, a regra é levar só o essencial, para evitar sobrecargas desnecessárias:

- Roupa prática e calçado confortável

- Um computador portátil e câmara fotográfica

- Medicamentos

- Brinquedos (se viajar com crianças)

- Cadernos e canetas (aos quais pode acrescentar aguarelas, canetas, lápis de cor, pincéis e um banco tripé, se quiser desenhar a viagem, como faz Luís Simões)

- Vistos e autorizações de entrada mais complicados de obter (os restantes pode ir fazendo à medida que vai avançando na viagem)

Bilhete de avião Round-The-World

A maneira mais económica de fazer uma volta ao mundo é comprar um bilhete aéreo Round-The-World (RTW), tal como fizeram Kiko Martins e Felipe Morato Gomes. Os grupos de companhias áreas como a Star Alliance, a One World e a Skyteam vendem este
tipo de bilhete, tal como agências de viagens especializadas neste tipo de viagem, como a Round The World Flights, a Travel Nation e a STS Travel.

O bilhete tem a duração de um ano e o país de partida e de chegada tem de ser o mesmo. O número de paragens pode variar de cinco a 16 e as datas são flexíveis. Cada pessoa faz o seu percurso, mas a viagem tem de ser feita sempre na mesma
direção, de este para oeste ou vice-versa. O preço situa-se a partir de 1.100 €.

Texto: Rita Caetano