Em Gandarela de Basto, Sofia da Cunha Mourão mantém um jardim do início do séc. XX
que prima pela originalidade e que constitui
também uma lição de vida e de jardinagem.

A alegria de viver e a força anímica da proprietária deste jardim, Sofia da Cunha Mourão, vêm-lhe provavelmente do seu jardim.

Um jardim único, criado no início do século passado por um antepassado cheio de imaginação. Cenário da infância da Sofia, foi fonte de tantos prazeres que o quis preservar para os seus netos e bisnetos. De fora é um pequeno jardim murado, situado junto a uma estrada nacional com grande movimento e de uma das tantas auto-estradas deste país mas, passado o portão, entramos num mundo diferente, sem tempo, num jardim de Alice do país das maravilhas, e esquecemos o exterior.

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Entramos num labirinto feito de esculturas em que os materiais não são a pedra, mas
as plantas. Camélias, magnólias, buxos, azáleas e ciprestes esculpidos ao longo das décadas até tomarem formas extraordinárias. A qualquer momento pode aparecer o coelho apressado, o gato Cheshire ou a rainha de copas...

São colunas, pássaros, pirâmides, guarda-sóis, túneis que despertam os sentidos e a fantasia de crianças e de adultos. A profusão de formas, volumes, texturas, flores e verdes, sol, brilhos e sombras cria a ilusão de um grande jardim, um jardim onde nos podemos perder.

O seu desenho é rebuscado, o traçado dos caminhos não obedece a uma lógica cartesiana, é ao sabor do acaso, criando a sensação de clausura e de conforto. A cada passo uma nova perspectiva espanta-nos e diverte-nos, um novo elemento surge entre a folhagem. Uma fonte, uma escultura, uma flor a nascer ou uma camélia caída.

Apetece ser criança e aí passar as tardes de Verão, entre personagens fantásticas. Apenas o restolhar das folhas e o cantar dos muitos pássaros que ainda nidificam nesta região agrícola. É o cenário ideal para jogar às escondidas... ou para beijos roubados.

Veja na página seguinte: O que existe em comum entre este jardim e... o rato Mickey!

Hino à vida

A perspectiva mais bonita do jardim na sua totalidade tem-se do terreiro frontal à casa, de onde se vê o alinhamento das cobras gigantes terminadas pelas orelhas do rato Mickey.

Mas qualquer amante de fotografia deseja aí passar um dia inteiro para tirar partido das mudanças de luz que se traduzem em mudanças de forma.

Nada há de estático neste jardim.
Verdadeiro hino à vida e à imaginação é também uma lição de vida e de jardinagem. A preservação deste jardim é fruto de décadas de zelo em que, ano após ano, dois jardineiros, sob a direcção e olhar atento da proprietária, podam os arbustos e árvores segundo a velha arte da topiária.

Não há preguiça nem economia de esforço, mas sim perseverança e determinação. Sofia da Cunha Mourão sabe que a falha de um ano de corte pode deitar a perder formas que décadas de zelo trouxeram até aos nossos dias. Considera que em causa não está só o seu prazer mas também um dever muito sério de preservar este jardim que herdou e quer entregar intacto aos seus herdeiros.

Ameaçado pela passagem da auto-estrada, cujo traçado inicial previa passar debaixo das janelas da casa, destruindo a belíssima capela do século XVI, só a perseverança da sua proprietária, que não baixou os braços, conseguiu evitar esse desastre através da sua classificação.

A auto-estrada, já construída, passa assim por baixo de uma ponte exterior ao muro do jardim, que recuou alguns metros e sobre a qual foi construído um jardim moderno e público, onde os habitantes da vila gostam de passear ao fim da tarde.

Localização
e visitas

A Casa da Gandarela situa-se na estrada principal da Vila de Gandarela de Basto, concelho de Celorico de Basto. Chega-se pela N 206, entre Fafe e Vila Pouca de Aguiar, e é impossível não ver o seu jardim pois as esculturas verdes ultrapassam a altura do muro que o cerca.

O jardim não está aberto ao público, mas pode ser visitado mediante contacto prévio com a Associação Portuguesa dos Jardins e Sítios Históricos (apjsh@mail.telepac.pt). A vila de Gandarela de Basto é ainda um concelho marcadamente rural, cujos traços profundos no território e na paisagem se devem à actividade agrícola, dominante até finais do século passado.

A produção de vinho verde ao longo do vale do Tâmega e a pecuária nas freguesias de montanha marcam a actividade agrícola. As casas solarengas que pontuam a paisagem e os seus jardins de camélias, que no Norte são conhecidas por japoneiras, testemunham da riqueza passada desta região que vale bem uma visita demorada.

Texto: Iole Sale
Foto: Francisco Sá da Bandeira