Já não é preciso espreitar pelas pelas janelas para ver o que se passa dentro das casas alheias. Primeiro, surgiram os restaurantes underground ou supper clubs que serviam jantares em casas privadas, depois as casas começaram a abrir portas a exposições, ciclos de cinema, concertos e até venda de roupa e peças de design. O movimento open-housing que está a crescer por toda a Europa e nos Estados Unidos da América.

A internet, sobretudo através de redes sociais como o Facebook e os blogues, é o meio de divulgação por excelência destes espaços, onde para entrar tem de tocar à campainha, como se de uma sociedade secreta se tratasse. Descubra os que mais se têm vindo a distinguir:

- De Cuba para Londres

Kerstin Rodgers, mais conhecida por Ms Marmita Lover, abriu o primeiro supper club londrino em 2009, dando o pontapé de saída para uma moda que viria a crescer por toda a cidade. «Na altura, cozinhava num café e sentia-me frustrada, mas não tinha dinheiro suficiente para abrir um restaurante», conta. Numa viagem a Cuba decidiu mudar de vida. «Fui a um paladar e pensei que algo do género podia funcionar em Londres», recorda.

Sem hesitar, anunciou o novo espaço no seu blogue e as pessoas aderiram. Hoje, além do Underground Restaurant, a sua casa alberga ainda o Secret Garden Club, no qual ensina a cultivar legumes e leguminosas. Para Kerstin Rodgers, a grande diferença de comer no seu supper club é «a oportunidade de conhecer outras pessoas e de provar comida criativa caseira, tendo como base os legumes, com os melhores ingredientes e que até se pode repetir», diz.

- Jantares e teatro

Em Milão, Ma' Hidden Kitchen leva a sério o conceito do movimento open-housing. É dirigido por Melissa e Emanuele que, tal como Ms Marmita Lover, resolveram abrir a porta de casa a desconhecidos após uma viagem. «Estávamos de férias em São Francisco [EUA] e, quando procurámos na internet um restaurante onde pudéssemos provar a soul food, fomos parar a uma garagem de uma família crioula», recorda Emanuele, que diz ter pensado que «seria fantástico se houvesse locais assim em Milão».

Em 2012, inauguraram os seus jantares, onde se degusta «comida italiana, com base na comida clássica», mas com influências das suas viagens. No lar de Melissa e Emanuele, há também aperitivos com espectáculos de teatro, que «são feitos em colaboração com a associação Teratroxcasa. Eles trazem os atores e nós organizamos tudo o resto», refere, acrescentando ainda que podem «fazer jantares em casa de outras pessoas, basta pedirem-nos».

- À mesa com desconhecidos

Alfama é, desde 2011, palco do Alfama-te a 10, uma iniciativa de jantares entre desconhecidos promovidos por três amigos que se apaixonaram por este típico bairro alfacinha. Os jantares, que podem acontecer em qualquer casa de Alfama, têm lugar, geralmente, na rua e a refeição é preparada pelo dono da casa. «No início, contactámos pessoas do bairro que pudessem conhecer moradores e dar-nos referências», afirma Joana, uma das organizadoras.

«Entretanto, fizemos jantares com moradores que nos contactaram ou que vieram eles próprios a jantares e aceitaram o desafio de serem eles a receber os desconhecidos», refere. «A recetividade é maior na geração mais jovem de moradores, que aceitam o desafio ao ponto de se sentarem à mesa com os desconhecidos, mas também já fizemos com a geração mais velha do bairro», diz.

«A minha casa pode ser sua por uma noite», lê-se. É com este slogan que a Manuel Pessoa Eventos Gastronómicos convida quem queira ter um jantar diferente. Na sua casa, em Lisboa, o empreendedor dá a provar os verdadeiros sabores da gastronomia portuguesa. Pode escolher entre as salas mais pequenas e a maior, numa casa localizada junto ao Príncipe Real. De todo o movimento open-housing, os restaurantes privados são os que mais depressa se espalharam em Portugal.

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Arte e artistas dentro de casa

Não se pense que o movimento open-housing se cinge às grandes cidades. Guimarães Noc Noc é um exemplo disso. Este evento repete-se no primeiro fim de semana de outubro desde 2011, e, de acordo com Pedro Ferreira, diretor artístico, «é muito acarinhado pela própria cidade e isso nota-se nas cedência de espaços por parte de toda a população. As pessoas que têm espaços no centro histórico da cidade, desde casas a lojas e restaurantes, inscrevem-se e, depois, nós criamos um roteiro e colocamos o que melhor se adequa a cada espaço».

Os artistas dão a conhecer todo o tipo de trabalhos «escultura, pintura, vídeo, artesanato, performances e até cake design», realça Pedro Ferreira, que nos conta que há espaços também dedicados aos mais novos, porque «este é um evento para ir em família». Um espírito semelhante tem o Caldas Late Night, o mais antigo do movimento open-housing em Portugal.

Existe há 18 anos e tem como objetivo mostrar os trabalhos (design, performance multimédia, teatro, artes plásticas e música) dos alunos da Escola Superior de Artes e Design de Caldas da Rainha, que abrem as suas próprias casas a todos os que queiram ver a sua arte. Uma oportunidade única para discutir correntes artísticas, descobrir tendências e, acima de tudo, confraternizar num ambiente informal.

4 casas alheias a visitar urgentemente:

1. Bless

Esta marca de roupa e acessórios vende-se em várias lojas em todo o mundo, mas em Berlim, na Alemanha, é comercializada na casa das proprietárias, num espaço que é também usado para exposições. Mais informações em Bless-service.de.

2. Ferrer

A casa do designer nova-iorquino Charlie Ferrer é também o seu ateliê e loja, pois tudo o que ele tem no seu apartamento está à venda, sejam peças da sua autoria ou de outros designers. Para visitar o espaço, tem de marcar previamente.

3. Openhouse Project

Um inglês, duas espanholas e um japonês, que vivem em Barcelona, em Espanha, abriram o seu apartamento a exposições variadas, concertos e jantares de sushi. Para conhecer a programação, consulte o site do projeto.

4. The Pale Blue Door (na imagem)

Não é uma casa como as demais, já que serve jantares que incluem peças de teatro ou vice-versa, e a decoração da casa é uma autêntica viagem por vários países. Mais informações no site Tonyhornecker.com.

Texto: Rita Caetano