Sem querer transformar as crónicas que escrevo para a revista Jardins num roteiro de viagens, não resisto a referir uma ilha que visitei um destes verões, a de São Miguel, nos Açores. Um lugar maravilhoso em que, para quem não é obcecado por praia, há pano para mangas para se passar uma óptima semana de férias. Permite fazer de tudo um pouco, desde passeios a pé, passeios de carro, praia, golfe ou viagens de barco, é só ir ao encontro da nossa imaginação e escolher.

O clima, esse, embora muito variável ao longo do dia, tem umas pequeníssimas amplitudes térmicas que tornam fácil qualquer estadia. A ilha em si é interessantíssima, além de bonita, para quem goste de plantas e de jardinagem. Hydrangeas, criptomérias e camélias encontram nas condições climatéricas daquelas paragens o ambiente ideal para se desenvolverem. Passear de carro no interior da ilha entre junho e julho é uma experiência única e extraordinária.

Nessa altura, são quilómetros e quilómetros de maciços de hydrangeas ao longo de qualquer trajeto. Se pararmos o carro e olharmos para a paisagem, temos linhas de hydrangeas a dividir zonas de cultura ou propriedades. É uma verdadeira festa das flores, só que inteiramente natural, espontânea, sem precisar de mão humana. Florestas densíssimas de criptomérias, acrescentam um carácter misterioso à flora da ilha.

Estradas floridas com um verde a perder de vista

Estas árvores apicais, muito juntas e muito altas, não deixam ver uma nesga de sol, a quem, em pleno dia, passeie por baixo delas. Muito dada a experiências botânicas, já tentei fazer crescer duas criptomérias no meu jardim, mas elas não gostaram nem das temperaturas demasiado elevados, nem do solo. Uma morreu e a outra lá está, pequena, triste e solitária, com saudades dos Açores. Entre janeiro e março, as hydrangeas dão o palco às camélias na coloração da ilha.

Ainda espero lá fazer, um destes anos, a Rota das Camélias. Em São Miguel, há muitos jardins para passear e admirar. O Jardim José do Canto e o Jardim António Borges, em Ponta Delgada, são dois belíssimos exemplos de perseveração da história da ilha, para encanto dos visitantes. Um pela mão do seu proprietário, Augusto de Athayde, o outro pela da Câmara Municipal de Ponta Delgada, foram arrancados ao abandono e à decadência e estão agora recuperados e abertos ao público.

A descoberta de dois novos jardins

Desta vez, faltei à chamada do Parque Terra Nostra, outro lindíssimo passeio, mas fui visitar dois jardins que não conhecia. Um deles, mesmo à beira do Lago das Furnas, é um verdadeiro esplendor. Trata-se da Mata Jardim José do Canto. Nas mãos de outro descendente, este parque é um ponto de referência incontornável. Foi desenhado e plantado em meados de século XIX por José do Canto.

Este espaço encantou-o de tal maneira que aí construiu uma capelinha neo-gótica, com uns belos vitrais franceses recentemente restaurados, onde há um século repousa ao lado da mulher. Esta mata tem caminhos muito curiosos totalmente revestidos a calhau rolado, concebidos inteligentemente para ajudar o escoamento das águas sem arrastamento de terras. Na altura mais quente do ano, como as camélias não estão em flor, o ponto mais interessante é o Vale dos Fetos.

Estradas floridas com um verde a perder de vista

Um espaço onde coexistem variadíssimas espécies, algumas raras. Todo replantado por Hintze Ribeiro nos anos 50 do século passado, é o complemento ideal da capelinha e do lago onde se encontra. Outro jardim de encantar é o Piquinho, junto às Furnas. Em mãos privadas, não está aberto ao público. Compreende-se, mas é pena. O Piquinho é uma pequena joia no meio da ilha.

Bem desenhado e cuidado, com belas árvores e flores, é cortado por um ribeiro cheio de peixes e é a paixão do proprietário que nele construiu um maravilhoso cabanão em madeira, inveja de qualquer escritor, para nele se refugiar. Visite São Miguel. Faça umas férias diferentes a falar português e aproveite para gozar uma natureza sem cimento e ar mesmo puro como em poucos sítios pode fazer. Refugie-se uns dias por aquelas paragens e vá para fora de si.

Texto: Vera Nobre da Costa