É num dia chuvoso de primavera que chegamos a Älmhult: uma pequena cidade localizada no sul da Suécia onde, uma vez por ano, se realiza o Democratic Design Days. À primeira vista, e a julgar pela paisagem envolvente, é difícil de acreditar que, camuflado no meio da floresta, se esconda o berço da multinacional sueca IKEA. Para quem não sabe foi nesta cidade, a quase 500 quilómetros de Estocolmo, que Ingvar Kamprad deu início aquela que viria a tornar-se na missão da sua vida: criar um melhor dia a dia para a maioria das pessoas. Um sonho e uma ambição que se tornaram realidade ao fundar a marca IKEA e que está à vista não só de quem vive em Älmhult, mas como quem está de visita relâmpago aquele que é considerado o evento anual da marca onde são apresentadas as próximas coleções e colaborações.

Nesta pequena cidade com cerca 10 mil habitantes, onde quase toda a gente tem uma ligação com a marca sueca, vive-se e respira-se IKEA. Basta olhar ao nosso redor. Temos o Museu da IKEA (que em tempos albergou a primeira loja da marca inaugurada em 1958), o Hotel IKEA decorado única e exclusivamente com objetos IKEA (e que durante o Democratic Design Days é ocupado por jornalistas de todo o mundo), o IKEA Communication, um complexo onde é fotografado o catálogo da marca sueca (que conta com 203 milhões de cópias impressas, é editado em 35 idiomas e distribuído em 52 países), e o complexo Ikea of Sweden (IoS), onde decorre grande parte da nossa visita.

São nestas instalações de desenvolvimento de produto que são desenhados todos os móveis que anualmente vão parar ao catálogo da marca que, este ano, começará a ser distribuído pelas casas portuguesas a partir de 24 de agosto. Ao todo são 9.500 itens que compõem a gama de produtos da marca sueca. Mas onde é que a equipa de designers vai buscar inspiração para, todos os anos, renovar a gama com o lançamento de 2.500 produtos novos? O processo criativo começa em casa das pessoas.

IKEA, o segredo mais bem guardado de Älmhult
IKEA

“Na IKEA somos demasiado curiosos para esperar pela chegada das tendências. Preferimos perguntar ‘O que podemos fazer para tornar o dia a dia ainda melhor?’”, começa por explicar Riccardo Navone, Responsável de Marketing da IKEA Portugal, em entrevista ao SAPO Lifestyle sobre a maneira como a marca explora a forma como famílias de todo o mundo vivem dentro de quatro de paredes. “Entender a vida em casa revela-se fulcral para a marca. Através de inquéritos que realizamos, cujas conclusões são reveladas no relatório anual Life at Home, e das visitas que fazemos às casas de muitas famílias em todo o mundo, conseguimos obter informações sobre as suas necessidades reais, sonhos e inspirações, para assim pensarmos no desenvolvimento dos nossos produtos.”

É com base naquilo que veem e recolhem nestas visitas ao domicílio que a equipa de product developers e designers fazem um brainstorming de possíveis ideias e conceitos que das duas uma: ou veem a luz do dia ou ficam na gaveta.

Mas quanto tempo se demora a criar uma coleção de raiz? Segundo Riccardo Navone não é possível ter uma noção precisa do tempo uma vez que estão diversas variáveis em jogo. Apesar de referir que tudo é feito “com bastante antecedência”, o “tema da coleção”, “o número de artigos que a compõem” e a eventual existência de “um designer convidado” são fatores que fazem com que determinadas coleções cheguem às 389 lojas da multinacional sueca mais cedo do que outras.

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A importância do design democrático e as coleções que aí vêm

Para quem teve a oportunidade de estar presente no Democratic Design Days e ouvir as palavras de Marcus Engman, Head of Design da marca sueca, há algo que se torna bastante claro: é impossível falar em IKEA sem falar em design democrático. Na prática é o seu modus operandi e que assenta em cinco pilares: forma, função, qualidade, sustentabilidade e preços baixos. É com base nesta premissa – de que os móveis e artigos de decoração de boa qualidade devem estar à disposição de todas as pessoas – que a IKEA chegou onde chegou tendo, no ano passado, registado vendas na ordem dos 35 mil milhões de euros. Outro dos pontos fortes da multinacional sueca é o facto de todos os anos apostar em coleções especiais e de edição limitada desenvolvidas em parceria com designers de renome. E 2018 não é exceção.

Versátil, adaptável e de longa duração. Foi com isto em mente que Tom Dixon desenhou o DELAKTIG: um sofá modular que dá ao cliente a liberdade de produzir a combinação que melhor se adapta às suas necessidades e ao seu estilo de vida. “Começámos por criar algo que se pode transformar noutra coisa à medida que a nossa vida vai evoluindo”, afirmou o designer inglês sobre o sofá criado em parceria com 75 estudantes de design. No fundo funciona como um três em um: tanto pode ser um sofá, como uma cama de solteiro ou uma chaise longue. Apesar de só chegar às lojas portuguesas em 2018, o SAPO Lifestyle teve a oportunidade de experimentar, em primeira mão, um das dezenas de DELAKTIG que se encontravam espalhados pelo auditório onde decorreu a sessão de apresentação das novas coleções e parcerias do Democratic Design Days.

IKEA, o segredo mais bem guardado de Älmhult
IKEA

Chris Stamp, fundador da marca de roupa californiana Stampd, foi desafiado pela IKEA a criar uma coleção que aliasse moda, decoração e o espírito streetwear. “O meu público preocupa-se não só com aquilo que veste mas como pode pegar nos itens que coleciona e integrá-los na decoração da casa. Trata-se de conferir beleza ao ambiente com as peças que compramos quer seja roupa, acessórios ou arte e foi esse o ponto de partida da coleção”, explicou o designer sobre a coleção SPÄNST direcionada para uma audiência jovem e urbana. Com lançamento em Portugal previsto para 2018, é de destacar que Chris Stamp desenhou ainda uma peça muito especial em parceria com a IKEA: um skate.

No caso de coleções de edição limitada criadas por designers escolhidos e convidados pela IKEA, a troca de ideias é constante. Por norma, os designers viajam diversas vezes até Älmhult de forma a acompanhar e supervisionar todas as etapas de desenvolvimento da coleção que, futuramente, chegará às prateleiras IKEA. E o seu input é necessário em tudo. “O processo é sempre desenvolvido em parceria entre a marca e os designers. Por norma, são habitualmente usadas palavras suecas para dar nome aos produtos, tendo alguma ligação a cada uma das coleções”, esclarece Riccardo Navone, responsável de Marketing da IKEA Portugal.

Veja também: Vamos falar sueco: a lógica do glossário de nomes da IKEA

Outra das parcerias anunciadas foi com Bea Åkerlund, uma estilista de moda sueca que já trabalhou com nomes como Madonna, Beyoncé e Lady Gaga. A sua coleção, que chega às lojas portuguesas em 2018, distingue-se por ter objetos decorativos capazes de conferir um toque de glamour, irreverência e diversão à casa das pessoas. “Na minha coleção criei uma cartola que é uma taça onde pode ser colocada uma garrafa de champanhe, maçãs ou laranjas, itens favoritos de maquilhagem ou podemos usar na cabeça. Quis brincar com o facto de gostar de moda e desta poder ser transformada em mobília”, explica a ativista sobre a coleção limitada OMEDELBAR que pretende celebrar a personalidade individual dos moradores. Das diversas coleções apresentadas durante o Democratic Design Days, a YPPERLIG, desenvolvida em parceria com a marca dinamarquesa de design HAY, é a primeira a chegar a Portugal. Ao todo são 70 produtos que integram a coleção que tem lançamento previsto para outubro de 2017. "Em comparação com a HAY, sinto que os acessórios tornam a coleção coesa. Muita da mobília é cinzenta, branca, e verde. Com os acessórios podemos brincar com as cores e podemos trabalhar com novos materiais", referiu Mette Hay sobre a coleção desenvolvida com o marido e fundador da marca.

IKEA, o segredo mais bem guardado de Älmhult
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Através de parcerias como estas, em que a IKEA convida personalidades com uma perspetiva única e diferente, é possível perceber que mais do que uma empresa de mobiliário e decoração low-cost, a IKEA é uma empresa que se distingue pela curiosidade, capacidade de inovação e que não tem medo de desafios. “Para nós é importante explorar diferentes mentes criativas porque somos curiosos e queremos aprender de diferentes maneiras”, referiu Marcus Engman, Head of Design da IKEA, sobre as colaborações que ainda vão demorar a chegar às prateleiras de algumas das lojas que a IKEA tem espalhadas pelos quatro cantos do mundo e que, no ano passado, atingiram os 783 milhões de visitas.

Apesar do processo de criação e desenvolvimento de cada coleção IKEA não ser linear, todos os produtos têm de passar pela Prototype Shop que tivemos a oportunidade de visitar durante a visita a Älmhult. São nestas instalações que a equipa de designers, product developers e engenheiros se reúnem de forma a discutirem ideias, fazerem esboços e testarem novos protótipos.

Quem atravessa este piso depara-se com diversas estações de trabalho: uma zona onde os designers discutem os projetos e analisam as amostras espalhadas em cima mesa, noutra encontramos alguns protótipos e os respetivos mood-boards e no fim a zona das máquinas. É junto a uma dessas mesas que Hanna Dalro, uma das 14 in-house designers, explica o processo de fabrico da nova versão do icónico saco azul da IKEA, o Frakta.

Com lançamento previsto para 2019, a marca decidiu criar um saco de compras sustentável feito à base de pacotes de batatas fritas. “São feitos de batatas fritas, algodão, poliéster, lã e acrílico. Nós tentamos misturar os sacos de batatas fritas com outros tipos de materiais”, frisou a designer sobre o modelo fabricado em parceira com o Reform Studio, uma empresa egípcia que se dedica à reutilização de materiais e luta contra o desperdício.

IKEA, o segredo mais bem guardado de Älmhult
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Uma parceria que não causa surpresa uma vez que a IKEA, para além de querer atingir as necessidades dos clientes e lançar produtos inovadores, alicerça parte do seu negócio nas práticas sustentáveis. Até ao final do ano, a marca sueca compromete-se a utilizar algodão 100% sustentável nos objetos que têm como base esta matéria-prima. “Todos os produtos IKEA são desenvolvidos de forma responsável no que diz respeito aos materiais e à produção, bem como ao uso sustentável por parte do cliente. Esforçamo-nos por garantir que todos os nossos produtos são fabricados utilizando materiais renováveis, recicláveis ou reciclados”, refere o responsável de Marketing da IKEA Portugal.

Mas viajar até Älmhult onde se tem a oportunidade de conhecer de perto os valores, a visão e o método de trabalho da multinacional sueca do mobiliário, vai muito mais além do que compreender a fórmula de sucesso IKEA. Viajar até Älmhult é aceitar que nada é impossível e que, por vezes, até os sonhos mais remotos - sejam os nossos ou os dos outros - se concretizam. O império criado por Ingvar Kamprad é a prova viva disso.

O SAPO Lifestyle viajou até Älmhult a convite da IKEA.