Em setembro de 2010, já lá vai algum tempo, amigos conhecedores das minhas afetividades nipónicas, ofereceram-me um bonsai. Agradeci muito mas, no meu íntimo, lamentei o mais provável destino da árvore, já que as minhas propagandeadas mãos verdes, no caso dos bonsai, são mãos assassinas. Num passado remoto da década de 1990 ofereceram-me, ao longo dos anos, pelo menos três bonsai. Todos eles pereceram mercê dos meus cuidados equívocos.

Um, sem qualquer dúvida, devido a rega excessiva. Outro com falta de água e o terceiro, porque fui de viagem e achei, erradamente, que uma árvore bonsai sobrevivia 10 dias num ambiente de ar reciclado de escritório sem ninguém lhe tocar. Desisti! Os bonsai são um capricho demasiado caro para fazer experimentações, pensei na altura. Nas minhas deambulações dos últimos anos pelo Japão cruzei-me com eles, é claro, múltiplas vezes.

Mas, provavelmente, pelo trauma da mortandade anterior, exerci uma atenção seletiva, na qual eles ficavam de fora. Mas lá que eram bonitinhos, eram. O meu bonsai de setembro estacionou na minha varanda e, ao fim de duas semanas, começou a mostrar umas folhinhas amarelas. Entrei em pânico, fotografei-o e pedi socorro a uma amiga que eu sabia pertencer ao Clube Bonsai de Sintra.

Ela descansou-me e esclareceu que o bonsai era um ulmeiro e que estava pura e simplesmente a perder a folha. Aconselhou-me a mantê-lo sempre húmido, a podá-lo e a transplantá-lo para um contentor maior, mudando-lhe o substrato. O tempo passou, fiz tudo o que ela me disse excepto o transplante, demasiado complicado para a minha ignorância, e, entrado o mês de dezembro, o bonsai estava já com aspeto moribundo.

O que estava a matar o bonsai

Cá em casa toda a gente decretou a morte dele, agora já sem nenhuma folha, e aconselharam-me a deitá-lo fora e a declarar oficialmente a minha incapacidade. Isto tudo com grande sarcasmo, dada a descoberta da minha primeira incompatibilidade com as coisas japonesas. Não me dei por vencida e, num dia 3 de janeiro, pus-me a caminho de Sintra e levei o bonsai ao respetivo museu, onde também funciona um hospital de bonsais.

Fui sem grande esperança, mas não quis deitá-lo fora sem que primeiro me explicassem o que tinha eu feito de errado. O meu ulmeiro foi podado e transplantado em 15 minutos e disseram-me que não estava morto mas, simplesmente, com falta de água, sem substrato suficiente e apertado de mais. Aconselharam-me a regá-lo pelo menos duas ou três vezes por semana e, se possível, deixá-lo apanhar chuva e adubá-lo e podá-lo mensalmente.

Comprei adubo adequado e voltei para casa decidida a, em caso de sobrevivência, comprar mais um. O bonsai começou a apresentar vestígios de reanimação ao fim de duas semanas, com uns pequeníssimos pontinhos verdes a prenunciarem futuras folhinhas e agora, passado mês e meio, está um verdadeiro triunfo.

Veja na página seguinte: O que significa a palavra bonsai

O que significa a palavra bonsai

O nome bonsai significa literalmente planta de tabuleiro e foi inventado pelos japoneses na era Kamakura (1185-1333) muito antes dos jardins secos, mais conhecidos entre nós por jardins zen. A maior parte dos bonsai consistem em plantas miniaturizadas, mas há também um estilo (o bonseki), no qual são usadas pedras, com ou sem plantas. A semelhança destes com os jardins secos é tal que há quem avente que os bonseki foram a fonte de inspiração dos jardins dos templos zen.

O princípio dos bonsai é basicamente o mesmo do dos jardins. Trata-se de uma representação estética muito pessoal expressa através de imagens da natureza. A forma das árvores é condicionada artificialmente pela arte do seu autor, através da poda e da condução dos seus ramos, moldados por um arame grosso plastificado, próprio para o efeito, seguindo os princípios da assimetria e do equilíbrio triangular.

Ao contrário do que erradamente se diz no ocidente, não se trata de distorcer a natureza mas, sim, de criar uma forma de arte inspirada nela. O bonsai é o resultado de dedicação, cuidados constantes e muita paciência e, por isso mesmo, difícil de compreender pelas nossas paragens. Fiz anos na semana passada [a crónica foi originalmente escrita em 2010] e pedi à família uma vaquinha para comprar o meu segundo bonsai, desta vez um pinheiro.

O meu ulmeiro já tem o meu toque pessoal, pois já lhe fiz duas podas segundo os princípios regulamentares. Agora será a vez do pinheiro. O próximo passo é frequentar o curso de Iniciação ao Bonsai promovido pelo Museu Bonsai de Sintra. Um espaço, que também inclui uma loja, que é o local certo para visitar, mesmo que não esteja a pensar render-se a esta arte milenar que, há muito, seduz amantes de árvores, arbustos, plantas e flores de todo o mundo.

Texto: Vera Nobre da Costa