“Não fosse o ponto, o ponto imóvel não haveria dança, e há só a dança”

(Cowan) T. S. Eliot

Comecemos o nosso discurso com base na leitura tradicional de Hermes que promulga a Lei das Correspondências com a seguinte afirmação: "o que está em baixo é análogo ao que está em cima e vice-versa"; podemos então, do mesmo modo dizer que a Astrologia reflecte no domínio terrestre o que se passa no campo celeste. Tal como um Holograma, o Mapa do Céu espelha no microcosmo um determinado momento do ciclo do Todo, o Macrocosmo. Deste modo, passamos a encontrar determinações e leis no ciclo das formas, visto que tanto o Universo como a matéria são invólucros ou corpos, do que é designado por espírito ou Absoluto; ora isso significa que no mundo da forma física, estamos sujeitos às leis da tridimensionalidade, às correlações entre tempo e espaço que formam o continuo virtual da consciência da identidade corpórea que se encontra sob a égide do ego-personalidade.

Aristóteles e São Tomás de Aquino bem se referiam à importância das influências astrais que determinam o mundo sublunar, o mundo das formas físicas abrangendo os reinos mineral, vegetal e animal. A estas influências São Tomás designou como causas segundas, relegando para Deus o domínio das causas primeiras. Quando falamos de Deus, do Absoluto, ou do Ein-Sofh da tradição kabalista estamos a referir-nos a um plano não corpóreo no sentido físico existencial, mas sim a uma dimensão essencial: o Ser, que numa primeira fase está contido em si mesmo e do qual apenas se pode dizer que ele é. Nesta dimensão não há exis-tência apenas se pode falar de essência, como tal, não existem leis nem atributos, o Ser não pode ser determinado por nada que seja colocado exterior a ele.

Quando se dá o movimento ou o sonho do Ser a partir dele próprio, aquilo que é conhecido pela divisão da unidade, esse movimento inicial passa a ser apreendido na sua expressão triangular; o Ser passa a ser designado por aquilo que é, foi e sempre será. Referimo-nos à presença da Unidade na Trindade presentes em qualquer religião tradicional. A unidade presente no ternário tradicional:
espírito, alma e corpo, já deixa antever a forma de relação destes três planos primordiais que se reflectem no mundo fenomenal, o da existência.

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Nos três primeiros números estão representados a vontade, a coesão (o amor) e a mente cósmica dando origem ao Universo ou Alma mundo.

No microcosmo, estes números simbolizam o espírito, equivalente do Ser, o corpo - o Outro, e a alma - o Mesmo, os quais têm correspondência no plano astrológico com três factores essenciais do mapa: o Sol, a Lua e o Ascendente.

Quando falamos da manifestação do Uno, do papel do Demiurgo, das Hierarquias Criadoras ou do trabalho efectuado pelos Sete Espíritos diante o Trono, referimo-nos ao fenómeno da passagem do eterno, o reino do Ser, para o mundo fenomenal, o da existência. Os espíritos ou qualidades que presidem a esta passagem modelam a alma, a grande intermediária entre o espírito e o corpo, entre o Ser e o Outro (o ente), dando origem à matéria que corresponde na terminologia numérica ao número quatro.

Segundo Platão, a Alma é o corpo do espírito (o inteligível) é a forma com que este se reveste para se poder manifestar.

Em diversas tradições a Criação processa-se em sete dias, porquê em sete? Porque o número sete é o número que corresponde à lei da vibração da própria natureza, que se desdobra em ciclos de involução e evolução. Como exemplo, temos as células do corpo que se regeneram de sete em sete anos, as sete cores, as sete notas, os sete dias da semana e as sete portas ou chacras primordiais. Em Astrologia o número sete está representado pelos sete planetas tradicionais que correspondem aos dias da semana e aos sete raios cósmicos primordiais.

O movimento da Alma ou o designado movimento das causas segundas, exprime-se através de leis cíclicas presentes na geometria cósmica. Alguns atributos destas leis são a vibração, a polaridade, a correspondência, o ritmo, o género e a proporção. Neste plano, o das leis cíclicas, encontramos o binómio representado pela regularidade e pela criatividade, aspectos inseparáveis que estão na base dos conceitos de causalidade e sincronicidade.

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Voltemos agora a nossa atenção para o universo físico, para a matéria que em numerologia é simbolizada pelo número quatro e pela figura do quadrado. Se desenharmos um triângulo invertido e o juntarmos com o triângulo primordial temos a figura geométrica do quadrado, isso significa que a matéria, o resultado concreto é o reflexo da energia trina espiritual. O corpo, a base sólida da matéria, é algo de palpável e concreto, mas a sua qualidade, a sua substância, é determinada pelo factor de coesão que liga as partículas de matéria com as da antimatéria.

Vamos agora utilizar o símbolo da cruz no interior do círculo. Os quatro braços representam cada um a substância dos quatro elementos primordiais. Se fizermos a trissecção da cruz obtemos o número doze resultado da interacção do espírito (3) com a matéria (4).

Os três modos de ser representados pelos signos cardinais, fixos e mutáveis, com os quatro elementos: fogo, ar, terra e água.

O número doze simboliza o corpo do universo, insuflado pelo movimento do três em conjugação com o quatro. A Roda Cósmica simbolizada pelo trajecto do movimento de translação da Terra em volta do Sol.

O Zodíaco com as suas doze portas ou raios do círculo, simboliza as doze tarefas que Hércules, símbolo da humanidade, teve de efectuar para transpor o tempo cíclico horizontal repetitivo. Isso permitiu-lhe ascender ao movimento evolutivo em espiral que vai na direcção do Centro. As doze casas astrológicas representam por sua vez o roteiro da personalidade com as suas respectivas determinações. Para a Astrologia Hindu a personalidade sendo o veículo da alma encontra-se encarcerada nas áreas de experiência indicada pelas posições dos planetas nas casas astrológicas. Ainda em relação ao número doze, o biólogo francês Etiene Gilson afirma que este número se encontra presente na estrutura do código genético, ou seja, na molécula do ADN.

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Se o número doze (número correspondente à evolução da personalidade) remete para um tempo horizontal progressivo o da escala aritmética; por outro, a vibração do número sete (o plano activo da alma simbolizado pelo movimento dos planetas) leva-nos para o domínio da progressão geométrica, do tempo vertical ascensional, cuja linguagem se expressa no domínio da revelação filosófica e religiosa. No Ocidente, temos o exemplo da Kabala, da Gnose e as designadas Ciências Herméticas na qual se inclui a Astrologia. Quando a relação com o Sagrado se institui a partir de uma linguagem vertical, dá-se então, o fenómeno da transmutação mental, ou seja, entramos no verdadeiro domínio da Alquimia que tem como lema: a energia segue o pensamento.

Mas antes de nos alongarmos nestes pontos, é importante situar a posição do homem no contexto da Cosmógenese e da Antropologia.

A grande questão da antropologia sempre girou em torno do que é o Homem? Já na antiga civilização egípcia a resposta se encontrava encriptada na figura ancestral da Esfinge, perpetuando-se na Grécia através do mito de Édipo. Platão pretendeu responder a esta questão atribuindo à alma humana duas naturezas: uma de origem divina outra de origem animal; a de origem divina precede directamente do número três, o homem é filho da mente de Deus, sendo por isso eterna e imperecível. Quanto ao corpo, cabe o aspecto corruptível sujeito à transformação e à morte. Na construção dos corpos foram feitas experiências em que participaram e concorreram agentes ou intermediários do eterno, os chamados deuses menores; sendo a alma animal proveniente de uma esfera de poder mistos, (3+4 ou 3x4) na qual o plano da alma se mescla com o plano da matéria (o mundo virtual das imagens) correspondendo assim à parte mortal do homem.

Tradicionalmente associa-se o número cinco ao número do Homem, cinco é a unidade da matéria (4), a quinta essência, o vértice da pirâmide que espelha os mundos superiores. O Homem reflexo da obra do Demiurgo vive a dualidade de ser simultaneamente um três (alma divina) e um quatro (alma animal ou quaternário).

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Daí se poder concluir que só existe evolução para o Homem no mundo da forma, nomeadamente, no plano da alma animal, sede das emoções, desejos e volições. O centro desta consciência é aquilo que se designa por personalidade que por natureza é mutável e sujeita à corrupção. Mas mesmo o conceito de evolução é ambíguo; se bem que haja evolução das formas e se possa determinar o ritmo e o ciclo desses desenvolvimentos no plano horizontal em que a personalidade e os corpos estão sujeitos pela influência astral exercida no mundo sublunar; por outro, no nível da alma divina (relação da alma com a sua essência ou nómada), nada há para evoluir, visto que a alma espiritual é o corpo do próprio Ser. A este nível a identidade situa-se ao nível do Self, que nalgumas tradições designam por Ser superior.

Aquilo que é preconizado pela gnose, pela filosofia hermética ou pela astrologia esotérica é que enquanto humanos somos apenas determinados pela nossa personalidade. Ao nível da alma dispomos de inteira liberdade para sermos aquilo que sempre fomos, isto é, seres de luz nascidos da mente cósmica.

Ora, quando se fala em linguagem vertical, queremos referir à ascensão, ao nível vibratório de uma 4ª ou 5ª dimensão, na qual os dois hemisférios do cérebro se ligam e se harmonizam dando lugar à manifestação da inteligência intuitiva. Esta por sua vez tem a capacidade de interligar os pares de opostos, realizando verdadeiras operações alquímicas no campo intelectual e psicológico. A perenidade da consciência encontra-se somente a partir destes níveis, até lá, tudo aparenta ser e não ser ao mesmo tempo, tal como a lua no mapa astral, vamos representando seres errantes sujeitos a todas as oscilações e perturbações quotidianas.

Que importa estarmos com um forte trânsito de Plutão ou com uma direcção significativa de Urano se não sairmos da esfera sublunar à qual está arreigada a nossa personalidade. As influências podem gerar fortes crises de personalidade mas se não tocarmos a dimensão da alma, todo o trabalho se pode dissipar e perder até que a roda do destino gire de novo. E que dizer das ditas boas influências, aquelas que podem trazer um certo êxito no domínio material ou social, geralmente, servem para vangloriar o domínio do ego criando novos apegos ilusórios. Vivemos hoje um tempo (Plutão oposto a Saturno, 2001-2002) que apela à destruição das capas, das estruturas obsoletas sociais e pessoais, onde as tensões e as pressões da dialéctica dos opostos colocam a nu as intenções dos Césares e de todos os pequenos tiranos que coabitam connosco.

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Sincronicidade

O princípio da correlação estabelece o elo entre o mundo simbólico e as situações decorrentes no dia a dia. O contexto literal e simbólico podem ser correlacionados quando a componente subjectiva e objectiva se encontram, todo o significado é fruto desta simbiose.

A Sincronicidade é neste sentido, o modo próprio da compreensão astrológica, enquanto a Alquimia é o modo operativo pelo qual respondemos a todas as relações bio energéticas.

Quando compreendemos a teoria da Sincronicidade, conseguimos estabelecer relação entre um determinado evento e a energia que lhe está subjacente. Nas palavras de Jean Bolen “A sincronicidade é uma experiência subjectiva na qual a pessoa confere sentido à coincidência. A sincronicidade funciona como um laço entre psique e acontecimento”.

Quando estamos vivendo no plano da sincronicidade, sentimos uma ligação profunda com o mundo à nossa volta. A sincronicidade é como um sonho acordado, no qual dentro e fora não têm contornos definidos, tudo é vivido intensamente num constante receber e processar de informações provenientes tanto do domínio lógico como do simbólico.

O papel da Astrologia como linguagem alquímica e sincrónica

A astrologia como linguagem sincrónica pode-nos proporcionar a consciência no seu aspecto mais qualitativo; através dela damos sentido e significado a um determinado momento, realçamos a experiência e abrimos a possibilidade de se aceder conscientemente à dimensão intemporal do instante (do Aion na linguagem Jungiana).

Tal como as ondas quânticas também as relações geométricas entre os planetas transmitem sinais. Uma das propriedades essenciais da onda quântica ou de um transito planetário é a representação de quando e onde um acontecimento se pode produzir. Eles são uma medida da probabilidade de manifestação de um acontecimento; tal como na física quântica há uma conexão entre o espírito e o mundo físico. Os aspectos planetários traduzem a forma desta relação, por meio deles, atraímos as situações que precisamos viver.

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A consciência do ciclo destes aspectos é bastante importante para sabermos diferenciar, até que ponto é que um padrão ou uma energia planetária, passa do movimento circular, repetitivo, para o movimento em espiral, símbolo de transformação e de entendimento.

A carta natal contêm em si, já uma determinada forma energética em manifestação, no entanto, o acréscimo de consciência alcançado ao longo da vida do indivíduo, possibilita a recriação de novos padrões e de novas formas energéticas. Evoluir do ponto de vista relativo, é sentirmo-nos criativos a todo o momento, para que não fiquemos intimidados pelo tempo consumista, pelo tempo repetitivo que corrói e cristaliza.

O que distingue a alquimia da química é que na primeira há uma transformação consciente na interacção entre dois entes, enquanto na segunda, temos reacções bio energéticas entre dois organismos. As relações de significado são sempre relações alquímicas, são encontros que trazem uma imagem ou um arquétipo com uma carga emocional forte que precisa de ser transformado. Essas imagens arquetípicas ou padrões de energia são reconhecidos na estrutura do mapa natal assim como nos trânsitos e direcções planetárias. Mas o mais importante na alquimia astrológica é não só resolver os paradoxos da mente dual, atribuindo um sentido àquilo que se está a viver, mas principalmente, pela capacidade de nos transformarmos aceitando o mundo tal como ele se nos apresenta. Essa compreensão só pode vir da dimensão da alma, porque enquanto seres identificados com a personalidade, precisamos de experimentar o sofrimento, sentir a divisão e viver o drama da encarnação. Na perspectiva sincrónica o mundo exterior reflecte o nosso mundo interior, como tal, se mudarmos por dentro, iremos criar novas situações à nossa volta.

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Tal como afirma Jean Bolden “A ferida é a situação do ego que perdeu o contacto com o Self, a experiência da sincronicidade alimenta o nosso espírito, cura a sensação de separabilidade isolada e restaura a nossa alma”. Termino com uma citação de Don Juan mestre xamânico de Carlos Castaneda: “Enveredar por um caminho com coração é o que interessa, o destino é irrelevante”.

Notas:

Linguagem vertical – qualquer tipo de linguagem que remete ao centro, à linguagem do Self que se sobrepõe a qualquer determinação.

O exercício da atenção, da concentração e da meditação leva ao apuramento dos níveis mais subtis da realidade e à percepção da sincronicidade nas nossas vidas.

O número quatro é considerado como sendo a porta dos homens (3+1=4)

O número dez é considerado como sendo a porta dos deuses (3+7=10), as dez emanações.

O número 22 representa os 22 elementos ou potências do mundo (3+7+12=22)

Por Luís Resina, 12 de Abril de 2002

Fonte: